Após ser enrolado durante a gestão Reinaldo Azambuja (PSDB), o Ministério Público Estadual voltou a cobrar que o governo encerre contrato com a Health Brasil Inteligência em Saúde. A empresa fornece ao Estado, desde 2015, equipamentos e software médico, em acordo que, inicialmente, deveria durar 48 meses e chegou a custar R$ 3,2 milhões mensais, mas foi prorrogado mesmo com parecer contrário do Tribunal de Contas do Estado.
O MPE aponta que, no procedimento licitatório, houve fraude e sobrepreço, ocasionados por exigências que encareceram o serviço, direcionaram a licitação e restringiram a competitividade. Antes de entrar com ações na Justiça, o órgão ministerial tentou chegar a um acordo com o governo por meio de uma recomendação, mas acabou sendo embromado por mais de um ano e o caso virou uma novela.
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A história tem algumas reviravoltas, a empresa chegou até a mudar de nome, e conta como um dos personagens principais o ex-secretário estadual de Saúde Geraldo Resende (PSDB), que hoje é deputado federal. Todo imbróglio está relatado em nova recomendação publicada no Diário Oficial do Ministério Público Estadual desta quarta-feira (13).
Após denúncia de irregularidades no aluguel de equipamentos e utilização de programas de informática, o MPE abriu dois inquéritos que evidenciaram “inúmeras irregularidades” no contrato 069/2015, da Secretaria Estadual de Saúde (SES). Mesmo assim, o contrato foi alterado para durar 60 meses. Naquela época, a empresa se chamava HBR Medical Equipamentos Hospitalares, sendo responsável por implantar a Rede Digital de Imagens Estadual (Redime), que entenderia municípios do interior.
Ao justificar a prorrogação do prazo, a SES fez consulta ao TCE-MS (Tribunal de Contas do Estado), que estabeleceu o prazo máximo de 60 meses para dilatação do acordo, o que constou no 7º termo aditivo ao contrato, assinado em novembro de 2019.
No entanto, apesar da deliberação do TCE-MS, o então secretário estadual de Saúde, Geraldo Resende (PSDB), autorizou, em outubro de 2020, a prorrogação do contrato por mais 12 meses com a Health Brasil Inteligência em Saúde, que havia adotado este nome a partir daquele ano.
Isso fez com que o MPE, por intermédio das 29ª, 30ª e 31ª Promotorias de Justiça do Patrimônio Público de Campo Grande, fizessem uma recomendação conjunta ao Governo do Estado para a adoção de providências e a realização de licitação, que já estaria em andamento, segundo o secretário de Saúde.
Em janeiro de 2021, Geraldo Resende informou ao Ministério Público que providenciou rapidez no novo processo de contratação. Passados mais de 120 dias da informação anterior, em maio, o secretário disse que o procedimento estava em “fase final de elaboração”.
Em novembro, 180 dias depois, o titular da SES encaminhou à Health Brasil uma solicitação de “continuidade da prestação dos serviços objeto do Contrato nº 69/2015, mediante um abatimento proporcional (desconto) de seu valor, pelo prazo de 120 (cento e vinte dias)”.
“Portanto, o ‘eterno’ contrato que teria vencido em 05 de novembro de 2021 (6 anos), foi ilicitamente prorrogado até 05.03.2022”, relatam os três promotores de Justiça do Patrimônio Público em nova recomendação ao Governo do Estado.
Diante das irregularidades no contrato 069/2015, o MPE protocolou denúncia na 1ª Vara Criminal de Campo Grande, em dezembro de 2021, pedindo sequestro de bens e imóveis dos acusados. Em janeiro de 2022, o órgão ministerial entrou com mais duas ações na 2ª Vara de Direitos Difusos, Homogêneos e Individuais da Capital. O desvio supera R$ 46 milhões.
O imbróglio, porém, estava longe do fim.
Em fevereiro de 2022, Geraldo Resende, em resposta a ofício do MPE, informou que o Processo Licitatório nº 27/002372/2020, instaurado há 485 dias para contratação de empresa em substituição ao “Contrato fraudulento nº 69/2015” havia sido arquivado.
“Bem como informando que, após 418 (QUATROCENTOS E DEZOITO DIAS) da emissão da aludida Recomendação Conjunta expedida pelo Ministério Público mostrando a inércia da Secretaria Estadual de Saúde, outro Processo Administrativo teria sido instaurado (nº 27/008132/2021) – fls. 1067/1068 do presente Inquérito Civil”, revelam os promotores de Justiça.
A Secretaria de Saúde, em novas tratativas, avisou que não havia qualquer ato decisório ou documento formalizando o arquivamento da licitação antiga e não havia nenhuma comprovação da nova, sendo apresentados apenas documentos com autorização da demanda.
Em novembro de 2022, a Health Brasil informou aos promotores que “segundo o Estado, através de seus dirigentes, as confissões de dívida devem terminar até o início de Dezembro de 2022, pois depende da finalização do processo de licitação e da instalação do novo parque de máquinas, quando então as atuais máquinas poderão ser desligadas e retiradas, cessando o serviço hoje prestado pela empresa”.
Depois disso, houve uma nova reviravolta. O Ministério Público Estadual se deparou com o Contrato nº 443/2022, que, em tese, mantém os serviços prestados com a contratação de empresa especializada na locação de equipamentos e softwares, “COM OS MESMOS VÍCIOS previstos na contratação anterior e que ensejou Ação Penal e Ação Civil por Ato de Improbidade Administrativa, ambas em trâmite”.
Os “vícios” são exigências que encareceram o serviço, direcionaram a licitação e restringiram a competitividade.
Diante de um “longo caminho de investigações” desde 2016 e para evitar mais uma batalha demorada na Justiça, as 29ª, 30ª e 31ª Promotorias de Justiça do Patrimônio Público de Campo Grande fizeram uma nova recomendação conjunta ao Governo do Estado.
No documento, o MPE pede que o contrato 443/2022, com término em 22 de novembro de 2023, não seja prorrogado e que o governo inicie as providências para novas contratações através de procedimento licitatório, levando em consideração diversos pontos para garantir a lisura do processo.
A recomendação é assinada pelos promotores Adriano Lobo Viana de Resende, Fabio Ianni Goldfinger e Humberto Lapa Ferri.