A primeiro operação de combate à corrupção no Detran (Departamento Estadual de Trânsito), que teve toda a cúpula presa por determinação da Justiça, será marco na história de Mato Grosso do Sul. A investigação do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) atinge uma lenda na política regional, amigo do governador do Estado e ex-sócio de desembargador e dono de contratos milionários com o poder público.
O juiz da 2ª Vara de Execução Penal de Campo Grande, Mário José Esbalqueiro Júnior, determinou a prisão de 12 pessoas, sendo nove preventivas e três temporárias. Destacam-se entre os presos, o presidente do Detran, Gerson Claro Dino, o ex-presidente da Assembleia Legislativa, Ary Rigo, e o dono da Digix, Jonas Schimidt das Neves.
No entanto, o poder dos investigados se revela na rapidez do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul em conceder habeas corpus. Perto da meia-noite de ontem, o desembargador João Maria Lós determinou a soltura de sete dos 12 indiciados por corrupção ativa e passiva, lavagem de dinheiro, fraude em licitações, organização criminosa e peculato.
A operação atingiu o advogado e professor Gerson Claro Dino que foi indicado para o cargo de presidente do Detran por ser amigo pessoal do governador Reinaldo Azambuja (PSDB). A ligação foi destacada pelo tucano na posse no dia 1º de janeiro de 2015. Na ocasião, além da amizade, Azambuja destacou a sua idoneidade e competência.
Natural de Itaporã (MS), Claro foi candidato pelo PDT em 2010, quando ficou de suplente e até assumiu o mandato de deputado estadual graças a Felipe Orro, que pediu licença por mais de 120 dias em 2011.
Em 2014, já no PSB, ele apoio a campanha da deputada federal Tereza Cristina Corrêa da Costa (PSB).
Outra relação importante é mantida com o desembargador Alexandre Bastos, último a ser nomeado por Reinaldo para o Tribunal de Justiça. Além de amigos, eles foram sócios no escritório de advocacia no Bairro Chácara Cachoeira, em Campo Grande.
Atualmente, o escritório continua como Bastos, Claro & Duailibi Advogados Associados. Apesar da ausência do desembargador e do presidente do Detran, o escritório “ganhou” contrato, sem licitação, com a Câmara Municipal de Campo Grande, que já empenhou R$ 80 mil para pagar só neste ano.
Com a prisão temporária, o ex-deputado Ary Rigo, que já tinha fama de intocável, volta a cena política estadual. Ele foi deputado estadual por seis mandatos. Em seis ocasiões, ele foi primeiro secretário do legislativo, responsável pelas finanças e estratégico.
Quando Mato Grosso do Sul foi criado em 1977, Rigo foi eleito deputado estadual e passou a fazer oposição a Pedro Pedrossian, que morreu na semana passada, junto com Londres Machado.
Ele voltou a ser aliado de Pedrossian, de quem foi vice-governador de 1991 a 1994. Rigo retornou à política em 1998, quando Zeca do PT foi eleito governador e ele deputado estadual. Em 2001, foi presidente da Assembleia Legislativa.
Em 2006, Rigo foi acusado de receber R$ 40 mil Hyran Garcete, ao ser interceptado na Operação Bola de Fogo, da Policia Federal. Ele acabou corrigindo a prestação de contas e foi absolvido por unanimidade pelo Tribunal Regional Eleitoral.
Rigo caiu em desgraça ao ser gravado na Operação Uragano, da Polícia Federal, quando admitia o pagamento de mensalão de R$ 2 milhões ao ex-governador André Puccinelli (PMDB), R$ 6 milhões aos deputados estaduais, R$ 900 mil aos desembargadores do Tribunal de Justiça e R$ 300 mil ao chefe do MPE, procurador Miguel Vieira da Silva.
Até hoje ninguém foi punido no caso, mas Rigo não conseguiu a reeleição e deixou a política. Ele não disputou cargo em 2014. O advogado Carlos Marques estranhou sua prisão, porque ele não teria ligação com as empresas investigadas.
No entanto, para o Gaeco, ele tem ligações estreitas com a DigithoBrasil. A empresa funciona no prédio onde foi por muitos anos escritório político do ex-presidente da Assembleia Legislativa.
Longe do poder político, por enquanto, ele perdeu a fama de intocável, porque passou a noite em uma delegacia e não foi beneficiado pela agilidade do Tribunal de Justiça.
O outro notável preso é o empresário Jonas Schimidt das Neves, dono da Digix, nome comercial da empresa DigithoBrasil. Discreto, ele só tem outra empresa, de estacionamento na Avenida Afonso Pena.
A Digix mantém contratos antigos com o Governo estadual, desde a gestão de Zeca do PT, que foram mantidos ou ampliados pelos sucessores, Puccinelli e Azambuja.
Conforme o Portal da Transparência, a empresa recebeu R$ 338,2 milhões do Governo estadual entre 2012 e este mês. O maior montante, R$ 190,8 milhões, foi pago pela atual administração, de Reinaldo Azambuja. André Puccinelli (PMDB) repassou R$ 147,3 milhões entre 2012 e 2014.
A Digix, nome comercial adotado pela DigithoBrasil após 15 anos, já foi alvo da Operação Máquinas de Lama, da Polícia Federal, que investiga corrupção e fraudes e licitações.
A outra empresa investigada, a Pirâmide Central Informática, só começou a firmar contrato com o Detran no ano passado, já sob o comando de Gerson Claro. Contratada em regime emergencial e sem licitação, a empresa ficou com contrato de R$ 7,4 milhões por 12 meses. Só ano passado, o órgão pagou R$ 3,8 milhões e, neste ano, mais R$ 1,926 milhão.
A empresa era favorita para vencer a licitação milionária sobre o controle de documentos de veículos financiados, que custariam R$ 17 milhões aos cofres públicos. O Detran desabilitou uma empresa que cobraria R$ 6 milhões.
No entanto, após O Jacaré e o Midimax publicarem a denúncia, o suposto esquema falhou e a Pirâmide perdeu a concorrência.
E agora, o Gaeco suspeita que a Pirâmide seja “laranja” da Digitho para ampliar a área de atuação com o poder público.
Desembargador solta, mas proíbe cúpula de frequentar o Detran. E agora?
O desembargador João Maria Lós, do Tribunal de Justiça, concedeu habeas corpus no final da noite desta terça-feira. No entanto, a decisão não deve ser motivo de euforia, porque ele proibiu a cúpula de frequentar o Departamento Estadual de Trânsito.
Conforme o Jornal de Domingo, foram soltos o diretor-presidente do Detran/MS, Gerson Claro, do diretor de tecnologia da informação, Gerson Tomi, o diretor adjunto, Donizete Aparecido Silva, e o chefe de orçamento e finanças, Érico Mendonça, o analista e assessor da Secretaria Estadual de Governo, Luiz Alberto de Oliveira Azevedo, o dono da Digix, Jonas Schmidt, e o funcionário da empresa, Claudinei Martins Rômulo.
No entanto, a decisão pode levar à demissão dos diretores do Detran. Eles foram afastados das suas funções e estão proibidos até de comandar o órgão a distância, porque não poderão manter contatos com funcionários.
Lós não recorreu ao recurso utilizado recentemente para liberar os amigos do presidente Michel Temer (PMDB): a tornozeleira.
Em entrevista ao Jornal de Domingo,o advogado Marcio Sandim disse que nenhum dos acusados atrapalha as investigações.