Uma das maiores ofensivas contra o tráfico de drogas e lavagem de dinheiro da Polícia Federal de Mato Grosso do Sul, a operação Status, que mirou o Clã Morinigo, coloca Ministério Público Federal e Justiça em rota de colisão.
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A procuradoria briga há quase dois anos para que seja retirado o sigilo do processo, mas no último dia 18 de abril o desembargador Fausto De Sanctis, do TRF 3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), decidiu que os autos ficarão em segredo de Justiça. Para a defesa, a acusação quer apenas escancarar na imprensa a intimidade dos investigados.
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Três meses após a operação, deflagrada em setembro de 2020, o MPF divulgou ter acionado o TRF3 contra decisão da 5ª Vara Federal de Campo Grande, que havia mantido a ação penal em sigilo. Segundo a Constituição Federal, a publicidade dos atos processuais só poderá ser restringida quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem.
Conforme a procuradoria, o juízo subverteu a lógica do sistema e tratou a exceção como regra. No mandado de segurança, o órgão ministerial pontua que é perfeitamente plausível limitar a publicidade de determinados documentos sem restringir o acesso ao feito como um todo.
“Esse ambiente de mistério e censura é incompatível com o espírito da ordem jurídica brasileira, que reconhece o povo como centro de emanação de todo poder e destinatário final dos atos do Poder Público. Não por acaso que há mais de um século, o célebre Juiz da Suprema Corte dos Estados Unidos da América Louis Brandeis já ensinava: ‘A Luz do Sol é o melhor desinfetante’”.
Nas palavras do Ministério Público, basicamente, a denúncia contém exatamente aquilo que dela se espera: narrativa de fatos criminosos, individualização de condutas, apresentação de provas de materialidade e autoria, classificação penal dos fatos e pedidos, na linha de outras tantas que versam sobre criminalidade organizada.
“O Ministério Público Federal considera que, impedindo e imprensa e o povo de conhecer o teor das acusações, as provas que as amparam, a argumentação defensiva e o julgamento pelo Poder Judiciário, qualquer espécie de erro ou arbítrio estatal estará fora da possibilidade de escrutínio público. Noutras palavras, a população não saberá o desfecho de um caso criminal. Em suma, um caso dessa envergadura caminhará à margem de qualquer acompanhamento do povo, em inegável transgressão ao dever de transparência”.
Em 26 de novembro de 2020, o juiz Dalton Igor Kita Conrado recebeu a denúncia contra 12 pessoas, mas manteve os autos em sigilos. Os réus são Jefferson Garcia Morinigo, Kleber Garcia Morinigo, Emidio Morinigo Ximenez, Taironde Conde Costa, Gilza Augusta de Assis e Silva, Alexandre Lima Vilhanueva, Slane Chagas, Joselito Pinheiro de Abreu, Gustavo de Souza Garcia, Yuri Rodrigo Vinco de Oliveira, Elcio Tulio Jorge e Alexandre Martines.
Para as defesas, a decisão do juiz, embora sucinta, está devidamente fundamentada e que se trata mesmo de uma situação de exceção. “Afinal, há naqueles autos numerosos e diversificados documentos absolutamente sensíveis que deverão permanecer sob sigilo, sob pena de graves e irreversíveis danos aos Denunciados e às tantas outras pessoas que foram alvos daquelas investigações”.
Ainda conforme os advogados, o pedido da acusação é leviano e busca escancarar na mídia a intimidade de todos os réus da operação Status. “Data maxima venia, para se ter uma vaga ideia da leviandade do pleito ministerial de retirada do sigilo daqueles autos, a publicização da r. denúncia ali apresentada, por si só, já é capaz de destroçar a a vida privada de uma penca de pessoas”.
A Status concentra investigações sobre existência de grupo criminoso organizado dedicado ao tráfico transnacional de drogas e lavagem de ativos. O patrimônio chega a R$ 230 milhões, incluindo 75 veículos, 42 imóveis, duas fazendas, resort particular, aeronaves e embarcações. Imagens da investigação mostram show da dupla sertaneja Bruno e Marrone em festa particular da família Morinigo.
Em Campo Grande, a operação Status fez uma ação “limpa pátio” na JV Motors, garagem de veículos localizada na Avenida Salgado Filho. Os Morinigos foram presos em Pedro Juan Caballero (Paraguai) e extraditados para o Brasil.