O consórcio CG Solurb venceu a licitação para gerir os serviços de limpeza urbana e manejo do lixo de Campo Grande há 12 anos. Um dos pré-requisitos para a vitória foi a apresentação de uma área destinada a ser endereço do novo aterro sanitário da Capital, que recebeu o nome de Ereguaçu. A localização foi um mistério por uma década, até que foi definido um terreno próximo ao atual aterro, o Dom Antônio Barbosa II, mas surgiu um novo imbróglio.
A área de 99 hectares, que está em processo de licenciamento ambiental, não pertence à CG Solurb e a verdadeira proprietária, a Brasil Empreendimentos Ltda, afirma que jamais autorizou que seus imóveis fossem utilizados para a instalação do novo aterro sanitário e foi à Justiça para barrar o empreendimento.
Veja mais:
Mistério do Erêguaçu: localização de aterro que “desequilibrou” licitação segue incerta
Atropelado pelo TJ, ministro do STJ reconhece julgamento que salvou Nelsinho e contrato da Solurb
Para salvar contrato bilionário da Solurb, desembargadores atropelaram decisão do STJ
A Brasil Empreendimentos alega que nunca foi abordada por representantes da CG Solurb manifestando a intenção de compra dos terrenos. A empresa aponta ainda riscos ambientais que o novo aterro traria ao local, a Fazenda Gameleira, devido à proximidade com o lençol freático, o que poderia afetar os córregos Formiga e Gameleira, e suas respectivas áreas de proteção ambiental.
O juiz Marcelo Andrade Campos Silva, da 4ª Vara de Fazenda Pública e de Registros Públicos, concedeu liminar, em novembro do ano passado, para suspender o processo de licença prévia para instalação do aterro sanitário Ereguaçu.
A Prefeitura de Campo Grande afirma que existe a possibilidade de desapropriação dos imóveis, e que isso consta em processo administrativo, além disso a concessão de licença prévia (LP) não autoriza a implantação do aterro sanitário, motivo pelo qual não prejudica “de nenhuma forma” o exercício da posse pelo proprietário da área, que está arrendada até março de 2028 para a plantação de soja.
“Dessa forma, a emissão da LP não implica em impactos no meio ambiente, no terreno ou nas cercanias, uma vez que seu propósito é, primariamente, avaliativo e regulatório, assegurando que os aspectos ambientais sejam considerados de maneira adequada antes do avanço para as próximas fases do licenciamento”, relata o município.
A prefeitura afirma que o aterro sanitário não trará riscos aos corpos hídricos locais, devido aos “rigorosos sistemas de impermeabilização de base e cobertura, destinados a drenar os lixiviados a uma estação de tratamento e, dessa forma, prevenir a infiltração de lixiviados contaminados no solo e, por conseguinte, no lençol freático”.
O Ministério Público Estadual, em sua manifestação, informa que a Brasil Empreendimentos celebrou termo de autorização para utilização da área para o novo aterro com a Financial Construtora Industrial, uma das empresas que formam o consórcio CG Solurb, antes da licitação de 2012. À época do acordo, a empresa se chamava Brasil Engenharia Ambiental Ltda.
Em abril deste ano, saiu a sentença do Marcelo Andrade Campos Silva, em que revogou a liminar que suspendia o processo de licença prévia para instalação do aterro sanitário Ereguaçu e negou pedido de mandado de segurança da Brasil Empreendimentos.
O magistrado afirma que a licença prévia é “uma fase preliminar de planejamento”, ou seja, “ainda se discute se aquela área é, no caso concreto, servível ou não para o objeto do licenciamento”.
Marcelo Andrade Silva aponta ainda que o município tem a prerrogativa de, por interesse público, necessidade ou utilidade, impor a perda de um bem ao proprietário mediante justa indenização por dinheiro. Com isso, “emerge a desnecessidade de concordância dos respectivos proprietários com o ato, sob pena de esvaziamento do instituto”.
“Nesse sentido, no Estado Democrático de Direito, o poder expropriatório possui natureza jurídica de prerrogativa, sendo um poder-dever, eis que se trata de um poder exercido em vantagem da coletividade, já que o Poder Público deve fornecer equipamentos, infraestrutura e serviços públicos, surgindo aqui a finalidade econômico-social da desapropriação”, fundamenta o juiz.
“Deste modo, não há razões para acatar eventual pedido de vedação de ato expropriatório por parte do Município ante a compulsoriedade deste ato administrativo, sendo que eventual falha na motivação (como a alegação da área ser inservível), depende de dilação probatória (pericial, inclusive e sob o crivo do contraditório) que é incompatível com a análise em sede mandamental, onde se exige a evidência do direito ante a prova pré-produzida”, diz a sentença de 8 de abril de 2024.
O magistrado afirma ainda que não há razões para vedar a expedição da licença prévia pelos argumentos apresentados pela Brasil Empreendimentos, uma vez que ficou comprovado que fora concedida autorização para que a CG Solurb, junção da Financial Construtora Ltda e Ld Construções Ltda, utilize a área para a implantação do aterro sanitário Ereguaçu.
O que houve foi apenas a alteração na razão social da Brasil Empreendimentos, que manteve o mesmo CNPJ e acionista controlador, David Haddad Neto. Diante da decisão desfavorável, a empresa apelou à 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
Na terça-feira, 27 de agosto, foi publicado que o processo foi incluído automaticamente na pauta de julgamento virtual da corte e as partes foram intimadas a se manifestarem a respeito. A Brasil Empreendimentos apresentou oposição ao julgamento virtual, em manifestação na quinta-feira (29).
Dom Antônio Barbosa II no limite
O aterro sanitário Dom Antônio Barbosa II opera no limite de sua capacidade e seu tempo de vida útil é considerado “alarmante”. Segundo dados da Prefeitura de Campo Grande e do licenciamento ambiental, o local deveria funcionar somente até julho de 2023, enquanto a CG Solurb afirma ter condições de operar até outubro de 2024.
Diante disso, a Solurb foi autorizada a ampliar em 3,5 hectares o aterro sanitário da Capital, após audiência pública na Câmara de Vereadores.
Na ocasião, o gerente operacional da CG Solurb, Bruno Velloso Vilela, defendeu a ampliação do aterro. “Falamos de uma área de cinco hectares. É a solução que temos hoje. O aterro está dentro da capacidade operacional dele projetada. Pelo que projetamos, vai até outubro. Talvez novembro ou dezembro, mas não vai passar disso”, declarou no debate realizado em abril deste ano.