O ex-supervisor do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transporte) em Dourados, Carlos Roberto Milhorim, foi condenado a 36 anos, dois meses e 20 dias de prisão pelo desvio de R$ 14 milhões entre 2002 e 2006 – valor atualizado seria de R$ 34,7 milhões. Três empresários foram condenados a penas de 6 a 11 anos pelo pagamento de propina. Superintendente do órgão na época dos desvios, o ex-governador Marcelo Miranda Soares, 83 anos, foi denunciado, mas acabou se salvando porque os crimes prescreveram.
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Conforme sentença do juiz substituto Fábio Fischer, da 2ª Vara Federal de Dourados, publicada no dia 27 de maio deste ano, o ex-servidor foi condenado por corrupção passiva e peculato. Além da cadeia, ele ainda foi condenado à perda de eventual cargo público e do apartamento no Edifício Ilhas Gregas, em Dourados, que supostamente teria sido adquirido com dinheiro proveniente do crime.
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Donos das empresas Base Engenharia, Remape e Compedras também foram condenados. Francisco Roberto Berno pegou a pena de 11 anos, dois meses e 12 dias de reclusão. Renato Machado Pedreiro e José Carlos Rozin foram punidos com a pena de seis anos, quatro meses e 24 dias. Solange Regina de Souza pegou quatro anos, cinco meses e 10 dias.
A sentença foi publicada 16 anos após os desvios. As empresas Rodocon e TV Técnica Viária ganharam contratos de manutenção e construção das BRs 163 e 267. O DNIT repassou R$ 33,240 milhões, dos quais 40% (R$ 14 milhões) foram desviados, conforme a denúncia do Ministério Público Federal.
A Polícia Federal encontrou anotações na sede da Rodocon, onde a empresa anotava o serviço efetivamente feito e o valor pago pelo órgão federal. Em alguns casos, o responsável pela fiscalização da obra em Dourados era o datilógrafo. Em depoimento à PF, ele contou que verificava que havia diferença entre o valor medido por ele e o anotado por Milhorim.
A PF deflagrou a operação para combater a organização criminosa comandada por Milhorim em 2006. Apesar da suspeita, ele foi mantido no cargo por Marcelo Miranda. A demissão só acabou ocorrendo em 2011 após a conclusão do processo disciplinar em 2009.
De acordo com a denúncia, o então supervisor era o dono de fato da Base Engenharia, empresa que fornecia a lama asfáltica para as empresas que prestavam serviços ao DNIT. Oficialmente, um dos sócios da empresa era Gustavo Rios Milhorim, filho de Carlos, que cursava engenharia na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul) em Campo Grande. Ele contou que ainda fez estágio por três anos na Capital, no qual recebia R$ 300 por mês.
Após ser formado, Gustavo foi contratado pela ECR, empresa do Rio de Janeiro, como responsável pela fiscalização das obras executadas na região de Dourados. Alguns documentos assinados por ele foram preenchidos pelo pai, conforme perícia feita pela PF. Ele confirmou que em um dos casos deixou os documentos assinados durante as férias.
“De acordo com a narrativa contida na exordial MARCELO MIRANDA SOARES teria concorrido para os crimes de formação de quadrilha, falsificação de documento particular, falsidade ideológica e corrupção passiva, previstos, respectivamente, nos artigos 288, 298, 299 e 317 do Código Penal, na medida em que sua conduta omissiva teria contribuído decisivamente para o cometimento dessas infrações penais”, alegou o MPF.
Conforme Fischer, a denúncia foi recebida em 2 de abril de 2013. Na ocasião, Marcelo Miranda acabou se livrando da prescrição de alguns crimes de associação criminosa, falsidade ideológica e omissão. “A denúncia foi parcialmente recebida em 02/04/2013 (ID 20722937 – Pág. 8). Em parte, pois foi declarada a extinção de punibilidade dos crimes do art. 288, 298 e 299 do Código Penal, em relação ao denunciado MARCELO MIRANDA SOARES (maior de 70 anos), prosseguindo a ação penal apenas no que se refere ao delito de corrupção passiva para o acusado em questão (art. 117 do CP)”, relatou.
“Segundo dispõe a denúncia do MPF, MARCELO MIRANDA SOARES, na condição de Superintendente do DNIT no Mato Grosso do Sul, concorreu de forma omissa para o crime (art. 13, §2º), pois, em tese, devia e podia evitar o resultado danoso, entretanto assim não agiu”, pontuou.
A procuradoria insistiu na condenação do ex-superintendente. “Em alegações finais, o MPF traz os motivos pelos quais entende que houve omissão dolosa e penalmente relevante, tais como: a) não ter afastado CARLOS ROBERTO MILHORIM após deflagração da operação policial; b) omitir-se quanto à presença de SOLANGE no DNIT, mesmo sabendo que ela não era vinculada à autarquia; c) omitir-se com relação a atuação de CARLOS ROBERTO MILHORIM e o filho GUSTAVO RIOS MILHORIM fiscalizando os mesmos trechos de obras; d) permitir que a RODOCON mesmo após a operação, continuasse prestando serviços ao DNIT”, anotou o juiz.
“Nessa esteira, o MPF pediu a condenação de MARCELO MIRANDA SOARES nas penas do delito de peculato, art. 312, caput e §1º, do Código Penal, na forma do art. 13, §2º, o Código Penal, por 48 vezes, um para cada pagamento a maior autorizado para a RODOCOM, eis que todos esses pagamentos passaram pelo acusado em referência”, pontuou.
“Como dito acima, já houve o reconhecimento parcial da prescrição pretensão punitiva em relação às imputações relacionadas aos artigos 288, 298 e 299 do Código Penal. Doravante, deve-se reconhecer a prescrição da persecução também em relação a imputação, na forma, omissiva, de peculato, originariamente capitulada na denúncia como corrupção passiva”, explicou.
“Isso porque, por equívoco legislativo, a autarquia não foi expressamente prevista no § 2º do art. 327 do Código Penal, de modo que a majorante não pode ser aplicada a funcionário de autarquia, sob pena de ferir o princípio que veda a aplicação de analogia em desfavor do réu”, justificou-se.
“Por sua vez, de acordo com o que dispõe o art. 119 do Código Penal, no caso de concurso de crimes (material, formal ou crime continuado) a prescrição incide sobre cada um, isoladamente. Assim, embora as causas de aumento, em regra, gerem efeitos sobre a prescrição, no caso de concurso de crimes, o aumento não é contabilizado. Em reforço, vide a Súmula 497 do STF”, esclareceu.
“Nessa esteira, a persecução relativa ao crime de peculato também se encontra prescrita. O réu possui mais de 70 anos (nascido em 01/12/1938). Nos termos do art. 109, II, do CP, o delito em exame prescreve em 16 anos e, considerando o redutor do art. 115 do CP, em 8 anos”, afirmou Fábio Fischer.
“Assim sendo, tendo em vista que a denúncia foi recebida em 02/04/2013 e, desde então, não houve qualquer causa interruptiva ou suspensiva, operou-se a prescrição pela pena em abstrato”, concluiu, livrando o ex-governador da punição.
Marcelo Miranda é avô do deputado estadual João Henrique Catan (PL), que combate o PT por considera-lo integrante do “comunismo”. Durante embate com o parlamentar, o deputado Pedro Kemp (PT) citou que o avô do deputado bolsonarista não teve problema nenhum em fazer parte da gestão.