O recebimento de uma denúncia pela 5ª Vara Federal de Campo Grande se transforma em um exemplo clássico da morosidade da justiça brasileira. A ex-prefeita de Nioaque, Ilca Coral Domingos (MDB), virou réu pelo suposto superfaturamento em obra somente 11 anos após a pavimentação das ruas e um ano após a sua morte. A ação penal foi protocolada pelo Ministério Público Federal há quase cinco anos, em 4 de agosto de 2017.
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Conforme despacho do juiz Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini, da 5ª Vara Federal, de 19 de maio deste ano, mas publicado nesta sexta-feira (3) no Diário da Justiça, dois crimes, de superfaturamento e de fraude em licitações, prescreveram devido à demora entre a execução da obra e recebimento da denúncia.
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O MPF apontou superfaturamento, fraudes, direcionamento na licitação e desvios de recursos no projeto, que teve repasse de R$ 1,375 milhão do Ministério das Cidades para obras de drenagem pluviais e pavimentação de vias públicas em Nioaque. Ilca foi prefeita da cidade entre 2005 e 2012. Ela tentou retornar, mas perdeu a eleição em 2020.
Ilca acabou morrendo em decorrência da covid-19 em 6 de abril do ano passado. Ela faleceu nove dias após o marido, Anísio Mendes Domingos, conforme notícias dos jornais da época. A doença já matou mais de 660 mil brasileiros.
Os acusados pediram a rejeição da denúncia por falta de provas. “REJEITO as preliminares de inépcia da denúncia, uma vez que a peça acusatória traz a individualização das condutas tidas por delituosas praticadas por cada denunciado, de forma adequada e suficiente para permitir o regular exercício de defesa”, pontuou Fiorentini.
“Defende, o Parquet (MPF), que nos editais dos processos licitatórios aludidos houve a inserção de cláusulas que restringiram o caráter competitivo das licitações, ‘com direcionamento dos certames para empresa pré-definida pela Prefeitura’”, destacou o magistrado, sobre a contratação da Maracaju Engenharia.
A procuradoria anexou laudos da Polícia Federal para justificar a acusação de superfaturamento e sobrepreço na obra. “Os denunciados causaram danos ao Erário com o pagamento à MARACAJU ENGENHARIA por serviços superfaturados individualmente ou executados em quantidade menor do que foi efetivamente pago”, frisou o juiz.
Como no caso do direcionamento, a punição prevista é de dois a quatro anos de reclusão, o juiz considerou que os crimes prescreveram, porque já se passaram 11 anos da execução do serviço e 10 anos que prefeita deixou o cargo. Também prescreveu o crime de superfaturamento, com pena de um a cinco anos.
“Pelo exposto, com fundamento no artigo 383 do Código de Processo Penal, DESCLASSIFICO as imputações de crime de responsabilidade quanto às condutas que resultaram em suposto direcionamento das licitações e supostos pagamentos indevidos decorrentes de sobrepreço para o artigo 90 da Lei nº 8.666/1993, então vigente, e, na sequência, com fundamento nos artigos 109, inc. III, e 107, IV, ambos do Código Penal, reconheço a PRESCRIÇÃO da pretensão punitiva estatal e declaro EXTINTA a punibilidade dos denunciados em relação a tais delitos”, determinou Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini.
“De outro lado, DESCLASSIFICO a imputação de crime de responsabilidade quanto às condutas que resultaram em alegado superfaturamento decorrente do pagamento integral por serviços executados em quantidade menor para o delito de estelionato (artigo 171, § 2º, IV, e §3º, do Código Penal) e, nisto, RECEBO A DENÚNCIA contra ILCA CORRAL MENDES DOMINGOS, SADI DE QUADROS, NELSO ANTONIO SONDA, EVÓDIO TEODORO DA SILVA, GERSON GARCIA SERPA e GUSTAVO ENEAS ZIOLKOWSKI por estarem presentes, a princípio, a prova da materialidade e indícios de autoria do delito, assim como os requisitos do artigo 41 do Código de Processo Penal e inocorrentes qualquer das hipóteses previstas no artigo 395 do mesmo diploma legal”, concluiu.
Agora, o processo segue com a manifestação dos réus vivos que estão distribuídos entre Nioaque, Maracaju e Curitiba.