Há dez anos, o advogado Daniel Ribas da Cunha, 36 anos, transformou-se em pesadelo dos políticos obcecados em sugar o dinheiro do contribuinte, seja por meio de aumentos nos próprios salários, vantagens indevidas ou até praticando improbidade administrativa. Ao protocolar 30 ações populares contra aproximadamente 500 ocupantes de cargos eletivos, ele estima ter causado economia de R$ 17 milhões aos cofres públicos.
[adrotate group=”3″]
Com patrimônio declarado à Justiça Eleitoral de R$ 3,8 milhões, Cunha tinha o sonho de ser engenheiro agrônomo. Ele cursou quatro anos da faculdade de Agronomia na UFMS (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul), atual UFGD. Para desalento da classe política, ele acabou optando por Direito e concluiu o curso em 2011 na Unigran.
Veja mais:
Advogado vai à Justiça para suspender reajuste de 54% no salário do prefeito de Amambai
Ação popular tenta anular o pagamento de 13º a prefeito, vice e vereadores de Antônio João
Dourados: TJ nega volta da verba indenizatória e vereadores podem devolver R$ 5 milhões
Acabou a crise? Salário sobe 54% e Amambai vai pagar salário maior que prefeito da Capital
A indignação de Daniel com a classe política começou no movimento estudantil, quando passou a integrar a JDEM (movimento jovem do Partido Democratas). “Na época, eu me revoltei com a política”, relembra o advogado. Com o tempo, mais maduro, ele percebeu que o problema era parte dos políticos. “A política quando é benfeita, beneficia a população”, prega.
Desde então, o lema dito pelo avô se transformou em um mantra para Cunha: “a política não pode atrapalhar o rico e deve ajudar o pobre”. Nos últimos dias, ele ingressou com novas ações na Justiça contra o reajuste de 54% no salário do prefeito de Amambai, Edinaldo Bandeira, o Dr. Bandeira (PSDB), que passou de R$ 17.143 para R$ 26,5 mil, do pagamento de 13º salário para os vereadores e prefeito de Antônio João e um terço de férias aos 19 vereadores de Dourados.
“A população passando fome e os políticos preocupados em repor reajuste salarial desde 2014”, indigna-se o advogado. “Eles podem tudo, enquanto o povo sofre com as limitações, já que nunca tem dinheiro para nada”, lamenta.
O maior exemplo desta atuação é do prefeito de Dourados, Alan Guedes (Progressistas), que deu reajuste de 5% aos servidores municipais, mas o próprio salário terá aumento de 58,64%, de R$ 13.804 para R$ 21,9 mil. Em um ano, o progressista vai ficar R$ 97,1 mil mais rico, considerando-se apenas o acréscimo no subsídio.
Daniel Ribas da Cunha começou a atuar no combate em Dourados em 2011, quando a Operação Uragano levou para a cadeia nove vereadores e até o prefeito, Ari Artuzi. Ao analisar a documentação da Polícia Federal, ele encontrou indícios contra mais dois vereadores, Gino Ferreira (DEM) e Dirceu Longhi (PT), os únicos que tinham escapado ao escândalo.
Na época, uma autoridade do município procurou o estudante de Direito oferecendo “vantagens” em troca do recuo em relação aos dois vereadores. Ele prometeu gravar o próximo encontro, mas acabou tendo a infelicidade de revelar o plano a um jornalista. O repórter teria alertado o interlocutor e o encontro acabou não ocorrendo.
A atuação ativa na ocasião acabou rendendo a Ribas o título de “doutor”. Ele acabou sendo denunciado na OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) por estar atuando irregularmente como advogado. A denúncia acabou não evoluindo nem para indiciamento nem para ação judicial. No entanto, quase custou a carteirinha de advogado de Ribas, que só a obteve após a primeira batalha judicial em dezembro de 2012.
O advogado ingressou com ação popular contra o pagamento de verba indenizatória de R$ 4 mil por mês para cada vereador de Dourados. O juiz chegou a extinguir a ação. No entanto, o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul não só determinou a retomada do processo, como deu razão ao jovem.
Além de vetar o pagamento, a Justiça determinou a devolução do dinheiro pago entre 2012 e 2017. Daniel estima que os vereadores, inclusive Guedes, deverão devolver em torno de R$ 5 milhões aos cofres públicos.
Ribas acompanhou com atenção a política de Antônio João, onde a família tem propriedades rurais. A primeira foi cancelar um reajuste expressivo no IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano). Outra conseguiu anular a contratação de escritório de advocacia de Dourados mesmo a prefeitura contando com três procuradores. Também conseguiu anular a compra de uma van.
Outra ação conseguiu anular o pagamento de verba indenizatória aos vereadores de Ponta Porã. A única derrota na luta contra o pagamento da verba indenizatória ocorreu em Campo Grande. Cunha ingressou com ação popular contra o pagamento de R$ 8,4 mil para cada um dos 29 vereadores da Capital. Ele chegou a apontar indícios de má utilização dos recursos ao reunir mais de 10 mil páginas no processo.
Graças à atuação do Ministério Público Estadual, que ingressou depois e teve o pedido indeferido pela Justiça, a ação popular de Daniel Ribas da Cunha foi rejeitada por se tratar de coisa julgada. O desfecho, o cidadão já sabe. A partir deste ano, o presidente da Câmara Municipal de Campo Grande, Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), elevou o valor em 48,8%, de R$ 8,4 mil para R$ 12,5 mil. O decreto foi publicado no dia 30 de dezembro, em meio as festas de fim de ano.
As ações do advogado douradense não ficam restritas a Mato Grosso do Sul. Ele ingressou com ações contra o aumento nos salários do prefeito de Bento Gonçalves (RS), de São Paulo e Mâncio Lima, no Acre.
A atuação não só causou a fúria dos políticos, que locupletam com o dinheiro púbico, mas se reverteu em ameaças. Uma vez, um amigo ouviu um vereador da fronteira falar em “resolver o problema” ao se referir ao advogado. Avisado, com a ajuda do pai, ele acabou evitando o pior na “terra sem lei”, onde as desavenças são resolvidas a bala.
Quando começou a ingressar com as ações populares, Cunha recebeu alerta e conselho de amigos, de que “as portas seriam fechadas”. No entanto, uma década depois, ele conseguiu uma boa carteira de clientes.
Em 2020, Daniel tentou a sorte na política ao disputar uma vaga de vereador pelo Novo em Dourados. A derrota foi retumbante, já que obteve 539 votos, quase metade do último eleito, Cemar Arnal (SD), com 926. Ele arrecadou R$ 17 mil na campanha, sendo R$ 6,7 mil de doações voluntárias.
A derrota não o desanimou. Para este ano, ele ainda analisa se vai tentar novamente as urnas. De acordo com Cunha, o casamento recente e a construção de um novo escritório são as prioridades do momento.
1 comentário
Pingback: TJ nega liminar e prefeito de Amambai vai ganhar salário superior ao da Capital - O Jacaré