“Aí no dia, pra esse povo aqui vai ser cinquentão entendeu? Por cabeça! Tranquilo?”. A frase faz parte de áudio que resultou na Operação Mercês, realizada pela Polícia Federal em outubro, e que esquadrinha o submundo das eleições 2020 em Corumbá.
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A compra de votos segue a linha de troca de favores, as mercês (recompensas). A investigação mostra que em terras corumbaenses, voto pode ser trocado por dinheiro, marmitex, caixa de cerveja, cesta básica e não poupa nem o gratuito SUS (Sistema Único de Saúde), onde exames viram moeda de troca.
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Os “cinquentão por cabeça” foi encontrado em áudio encaminhado por Marconi de Souza Junior a Yussef Mohamad El Salla (PDT) em 30 de outubro do ano passado. Por causa da pandemia, as eleições municipais foram realizadas em 15 de novembro.
Marconi é assessor do prefeito Marcelo Iunes (Podemos), que foi reeleito. Já Yussef era candidato a vereador, sendo eleito para uma cadeira na Câmara Municipal de Corumbá.
Primeiro, Marconi encaminhou a fotografia de uma mulher segurando “santinhos” de Yussef Salla. Depois, vem o áudio.
“Yussef, meu nobre, boa noite! Acabei de sair aqui da casa de dona Tuta, tá?!
Uma pessoa forte nossa aqui que, acabei de falar com ela quantas pessoas que vem da fazenda dela né?! Ela falou que vem em torno de vinte e duas, vinte e seis pessoas pro dia da eleição, mais a vizinhança dela! Aí já expliquei pra ela, falei que, passei uma relação pra ela, ela vai numerar todo esse pessoal aí, cadastrar tudo certinho! Aí no dia, pra esse povo aqui vai ser cinquentão entendeu? Por cabeça! Tranquilo?”
De acordo com a PF, Marconi intermediava a compra de votos para o então candidato. Noutra passagem, em 25 de setembro de 2020, Marconi informa a Yussef que com R$ 200 era possível entregar cesta básicas para cinco famílias.
“Nobre! Bom dia ou boa tarde, se você já almoçou, né?! Eu tô na estrada, indo pra caça! Meu líder,deixa eu te falar, eu tenho uns pedidos aqui de Cosme. O Chefe maior já deu pra me atender 25 famílias tá, eu já resolvi. Aí pintou cinco demandas, cinco famílias, tá?! E… vê com você, se você não me ajeita, é coisa mínima, é quarenta conto pra cada um! Que eu vou fazer uma cesta igual eu fiz pros outros, de… pra distribuir pra Cosme. Entendeu, fica um negocinho bem legal! Aí são cinco famílias, R$40,00, duzentos conto a gente mata isso aí, tá bom?!”.
Outro diálogo revela que para o então candidato a vereador Allex Prado Della (Republicanos) o preço do voto beirou o irrisório: duas marmitex. O Republicanos é ligado a Igreja Universal do Reino de Deus. A conversa foi entre Marconi e Estácio Muniz da Silva Santos, conhecido como Batatinha e chefe da campanha de Allex. O candidato se elegeu e Batatinha foi nomeado assessor na prefeitura, com remuneração de R$ 9.540.
Marconi conta que está no conjunto habitacional Padre Ernesto Sassida. “Eu já arrumei até um eleitor aqui para Allex Della aqui viu, por dois marmitex! Barato hein?”.
Outra conversa entre Marconi e Batatinha, essa travada em primeiro de novembro do ano passado, se mostra premonitória. Segundo o relatório da investigação, Batatinha envia uma fotografia do que parece ser sua planilha de pagamentos eleitorais. Na sequência, Marconi manda um áudio dizendo que se a “federal” for à residência de Batatinha e achar a planilha a “casita cai”. A PF acabou indo à casa de Estácio, ao cumprir mandados da operação Mercês.
Os exames
Diálogo entre Marconi e Luiz Antônio da Silva, o Pardal, mostra como exames médicos são uteis para comprar eleitores numa disputa eleitoral. Luiz era chefe da Casa Civil e, atualmente, é secretário municipal de Governo, com proventos de R$ 16.250.
Pardal encaminha a Marconi requisição de exame médico em nome de terceiros. Que responde que basta “bater o carimbo” para o procedimento ser realizado. Dia depois, menciona que o carimbo é do Citolab. O laboratório que presta serviços para a prefeitura de Corumbá é do irmão do prefeito.
“Dá análise das conversas entre MARCONI e “PARDAL”, fica claro que ambos operavam fora de suas atribuições legais, pois, enquanto deveriam atender às demandas da prefeitura, por ocuparem cargos públicos, estavam articulando durante o expediente entregas de dinheiro a eleitores, bem como “favores”, como agendamento e antecipação da realização de exames médicos, em troca de apoio político a candidatos que apoiavam nas eleições municipais de 2020”.
Marconi teve o celular apreendido pela PF em 4 de novembro. Ele levava R$ 7.500 divididos em bolos de R$ 250, lista com nomes e telefone, além de planilha com número de titulo de eleitor.