A definição de marco temporal pelo Supremo Tribunal Federal pode atingir, no mínimo, 15 áreas indígenas em Mato Grosso do Sul. “O impacto da tese inconstitucionalíssima do marco temporal resultará na perpetuação da guerra genocida contra os povos indígenas”, alerta o historiador e professor da Universidade Federal de Pelotas, Jorge Eremites de Oliveira. O julgamento, aguardado com expectativa por indígenas e produtores rurais, pode ser retomado nesta quarta-feira (1º) pelo STF.
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A ação analisada pelos ministros envolve o povo Xokleng, em Santa Catarina, e terá repercussão geral em todo o País. O julgamento começou no dia 11 de junho deste ano no plenário virtual, mas o ministro Alexandre de Moraes suspendeu ao pedir vistas. O presidente da corte, ministro Luiz Fux, marcou o julgamento para o dia 30 de junho, mas o processo não foi julgado.
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O tema é polêmico porque ruralistas querem que os indígenas só tenham direito à demarcação da área que estiverem em sua posse até o dia 5 de outubro de 1988, quando foi promulgada a Constituição Federal.
Para Jorge Eremites, a tese é inadmissível e inconstitucional. Para o professor, a situação dos Guarani Caiová é comparada com a genocídio dos judeus na Alemanha nazista. Ele lembrou que o assunto repercute na imprensa internacional e muitos moradores de Mato Grosso do Sul não consideram os indígenas como humanos. “Boa parte da população naturalizou a violência”, lamentou.
Entre os povos afetados pelo marco temporal estão os Guatós, que chegaram a ser considerados extintos nos anos em Corumbá. A etnia foi fundamental para o Brasil derrotar o Paraguai na Guerra da Tríplice Aliança em 1870, quando transportaram os soldados do império para dar o bote nos militares paraguaios na região corumbaense.
Se for considerado legal o marco temporal, conforme o historiador, os guatós podem perder as terras no Pantanal, que inclui a Barra do São Lourenço e a reserva. Várias áreas dos guaranis estariam ameaçada com a decisão do Supremo. Só ficariam as oito áreas definidas no início de 1920.
Os terenas teriam todos os projetos de ampliação comprometidos com a nova regra. Eremitas lembrou que os índios da Reserva Buriti, em Sidrolândia e Dois Irmãos do Buriti, produzem tanto ou até mais que os fazendeiros da região.
Eventual derrota para os índios trará consequências gravíssimas para o agronegócio brasileiro. Conforme o professor, há movimento internacional para boicotar a compra de carne e grãos de áreas onde houver violação dos direitos indígenas. Vários países estão trabalhando para reduzir a dependência dos produtos brasileiros para atender a mobilização da população mundial em defesa dos índios.
Para o historiador, o movimento terá sucesso quando houver ampliação da produção de carne e grãos na África. Na sua avaliação, Mato Grosso do Sul é um estado de grandes dimensões, tem condições de contemplar áreas para os índios e para o agronegócio.
Jorge Eremites de Oliveira critica a gestão do presidente Jair Bolsonaro (sem partido). “Nunca tivemos na história, desde 1500, um governo pautado na perversidade com as comunidades quilombolas e os povos indígenas como esse”, criticou.
Apesar da importância histórica do julgamento, ministros do STF estariam articulando para adiar a decisão até a definição do marco temporal pelo Congresso Nacional. A decisão faz parte da estratégia de aliviar a tensão no momento em que a corte é alvo de protestos dos seguidores de Bolsonaro, principalmente, de produtores rurais, que organizam uma das maiores manifestações contra a instituição no dia 7 de setembro deste ano.
Aflitos com o julgamento, índios vêm realizado série de protestos em Mato Grosso do Sul contra o marco temporal. Na quarta-feira passada (25), eles promoveram bloqueios de rodovias. O movimento voltou a ser repetido ontem (31).