Na esperança de obrigar o governador Reinaldo Azambuja (PSDB) a prestar contas da arrecadação milionária do Fundersul (Fundo de Desenvolvimento do Fundersul), que teve aumento de 105% em três anos, os produtores rurais recorreram ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. A primeira tentativa de abrir a “caixa preta” do fundo fracassou ao ter o pedido extinto pelo juiz Ricardo Galbiati, da 2ª Vara de Fazenda Pública.
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O recurso contra sentença do magistrado, que não considerou o grupo legítimo para exigir prestação de contas, apesar de serem obrigados a contribuir com o Fundersul. A ação foi extinta em março do ano passado. Os advogados Bruno Taveira e Mariana Teixeira Eugênio consideraram a pandemia da covid-19 para ingressar com o recurso de apelação apenas no início deste mês.
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O processo é um caso exemplar da relação do Estado brasileiro com o contribuinte. O cidadão é obrigado a pagar o valor estabelecido pelo governante, mas não pode exigir prestação de contas. Reinaldo elevou a alíquota cobrada sobre o agronegócio em até 71%. O reajuste foi fundamental para elevar a arrecadação do fundo em 105% de janeiro a julho deste ano em relação ao mesmo período de 2018, que saltou de R$ 333,7 milhões para R$ 687,3 milhões.
“Ao restringir o acesso às informações solicitadas pelos apelantes, o juízo a quo feriu gravemente os preceitos constitucionais e legais que garantem aos cidadãos total legitimidade para solicitá-las quando julgarem pertinentes”, argumentaram os advogados, que representam o grupo de 80 pecuaristas e agricultores.
“A propositura da demanda encontra guarida na verificação de repasses irregulares identificados e devidamente expostos na exordial, sendo fundamental a prestação de contas para viabilizar a averiguação de eventuais lesões ao erário/perda patrimonial, a ser apurado em ação própria, através da liberação de verba pública sem a observância das disposições orçametárias e outras normas pertinentes”, pontuaram Taveira e Mariana Eugênio.
“A Lei n.º 12.527/11 é clara ao prever que qualquer interessado possui o direito de solicitar informações, vedando, ainda, exigências relativas aos motivos determinantes da mesma. No presente caso, estamos diante de produtores rurais que contribuem diretamente para o FUNDERSUL, o que, por si só, é capaz de demonstrar a legitimidade ativa dos mesmos, que possuem interesse inquestionável no acesso às informações pertinentes à aplicação do Fundo Público ao qual são vinculados”, suplicaram.
“Outro ponto a ser esclarecido, é que os apelantes não pretendem realizar o julgamento das contas apresentadas, sendo claro sua incompetência para tanto, o que se busca é a exibição pormenorizada da prestação de contas, de forma a especificar cada aplicação de recurso/investimento, através da apresentação dos processos licitatórios ou convênios realizados com os municípios referentes aos repasses oriundos do FUNDERSUL, no período do ano de 2019 e ao plano de aplicação dos recursos de 2020”, frisaram, deixando claro que apenas tentam exercer um direito normal em qualquer lugar do mundo civilizado, menos no Brasil.
A esperança de reverter está nas mãos do desembargador Amaury da Silva Kuklinski, relator do pedido na 3ª Câmara Cível do TJMS. O principal ponto é se os produtores, que pagam o fundo, possuem direito a cobrar prestações de contas do Governo.
Conforme a petição, o governador Reinaldo Azambuja publica informações, mas fica devendo detalhes pormenorizados. Um dos pontos é onde foram investidos os R$ 160 milhões repassados aos municípios no ano passado.
O juiz Ricardo Galbiati, da 2ª Vara de Fazenda Pública, afirmou que os produtores rurais não possuem legitimidade para ativa para exigir prestação de contas da Agesul e da Secretaria Estadual de Infraestrutura.
“Verifica-se, portanto, que a prestação de contas das receitas do Fundersul deve ser realizada mediante controle externo, ou seja, perante o Tribunal de Contas do Estado, conforme expressamente estipulado não apenas na legislação de regência, mas também na própria Constituição Estadual. Resta nítido, portanto, a ausência de interesse de agir dos autores, porquanto a via eleita não é adequada e, tampouco, útil, já que não há que se falar em averiguação de crédito ou débito entre as partes”, justificou-se o magistrado.
O problema é que o Tribunal de Contas conta com seis dos sete conselheiros denunciados ou investigados por improbidade administrativa. Márcio Monteiro, ex-secretário estadual de Fazenda na gestão de Reinaldo, é réu por dar isenção ilegal de ICMS e do Fundersul para um empresário de Dourados.
Monteiro ainda foi denunciado por corrupção no Superior Tribunal de Justiça por integrar o grupo, junto com o governador, que teria recebido R$ 67,791 milhões em propinas pagas pela JBS. Ele teria emitido nota fiscal fria para esquentar a vantagem indevida.
Outros três conselheiros – Waldir Neves, Osmar Jeronymo e Ronaldo Chadid – são investigados pela Polícias Federal por venda de sentença, corrupção e desvio de dinheiro público na Operação Mineração de Ouro. Eles foram alvos de mandados de busca e apreensão autorizados pelo ministro Francisco Falcão.
E é justamente o TCE citado como parâmetro de fiscalização do dinheiro público pelo juiz Ricardo Galbiati.