Sentença da 3ª Vara Federal de Campo Grande inocentou o médico Wilson de Barros Cantero, ex-diretor técnico do Hospital Universitário, e mais três pessoas de denúncia na Operação Sangue Frio. Eles foram acusados pelo Ministério Público Federal de simular licitação para legalizar contrato de R$ 10,057 milhões com a H. Strattner e de atestar o pagamento de R$ 429,8 mil por serviços não realizados.
[adrotate group=”3″]
Conforme sentença da juíza substituta Júlia Cavalcante Silva Barbosa, publicada nesta sexta-feira (11), não houve provas de dolo nem de que os envolvidos desviaram recursos públicos ou receberam propina. Ela inocentou Cantero, o ex-chefe da Seção de Assistência Clínica, Neimar Gardenal, o gerente de contas da H. Strattner, Ricardo Villela Silveira Almeida, e a assistente de licitação, Michelle Panassolo.
Veja mais:
Médico nega acusação e diz que empresa devolveu R$ 429 mil pelos serviços não prestados
Ex-diretor do HU vira réu por suposta licitação fictícia para legalizar contrato de R$ 10 milhões
Eles foram absolvidos das acusações de direcionamento e fraude na licitação e ficam livres do pagamento de R$ 4,124 milhões. O MPF poderá recorrer da sentença, já que tinha opinado pela condenação dos quatro nas alegações finais.
“O certo é que não há provas seguras de que o resultado típico, consistente na frustração da competitividade do certame, tenha sido causado por conduta imputável aos réus, tampouco há elementos que demonstrem que eles estivessem imbuídos de dolo genérico sobre esse resultado. No que toca ao dolo específico, a acusação é ainda mais incipiente, pois nem mesmo chega a descrevê-lo, isto é, nem mesmo há fatos hipotéticos a serem provados sobre esse elemento”, pontuou a magistrada.
“Diante dessa situação, chega a ser desnecessário lembrar que uma condenação criminal não pode ser sustentada pela simples verificação do resultado previsto pelo tipo penal, à míngua de provas sobre o nexo de causalidade e sobre o elemento subjetivo do tipo, sob pena de inaceitável responsabilização criminal objetiva”, explicou Júlia Barbosa.
“Diga-se, por fim, que a responsabilização civil e disciplinar dos réus pode ser perseguida, pelos meios pertinentes, com fulcro em conduta meramente culposa. Todavia, na seara criminal, face à ausência de provas, tanto acerca da autoria como sobre o elemento subjetivo do tipo, impõe-se a absolvição dos réus quanto à imputação do art. 90 da Lei n. 8.666/93”, frisou.
“Com efeito, de acordo com o preceito primário do tipo em referência, pune-se a conduta daquele que se apropria de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem posse em razão do cargo, ou o desvia, em proveito próprio ou alheio. Contudo não se vislumbra nos autos atos de execução que se adequem aos verbos-núcleo do tipo – consistente exatamente em apropriar-se ou desviar. Tampouco há provas de que os réus tenham atuado, de qualquer maneira, imbuídos de dolo para o alcance esse resultado”, anotou.
“Sobre os pagamentos realizados em favor da empresa H. STRATTNER, constatou-se que a maior parte deles refere-se (?) a serviços efetivamente prestados, conforme verificado por uma série de auditorias e revisão de contas. Neste caso, os valores pagos detêm legítima natureza de contraprestação, que não se coaduna com o escopo de desviar dinheiro público em proveito próprio ou alheio. Quanto a estas parcelas, portanto, os fatos são notoriamente atípicos, não havendo o que controverter”, concluiu.
Em outro trecho da sentença, a magistrada destacou que a compensação do valor pago a maior pelo Hospital Universitário à empresa. “WILSON alega, contudo, quem em vez de proceder à soma das notas conferidas por ele, que se referiam apenas aos equipamentos solicitados e entregues pela H.STRATTNER, a divisão de pagamentos emitia a nota de empenho sempre no valor máximo mensal de gastos com o contrato. Isso teria dado causa aos pagamentos a maior, gerando um saldo do Hospital Universitário com a H. STATTNER de R$ 45.476,00, que posteriormente, conforme documentação anexa, foi compensado nos meses seguintes pela própria empresa, na continuação da prestação dos serviços”, observou.
“A versão do réu é dotada de razoável verossimilhança, à vista dos documentos constantes de fls. 147 e 150 dos autos físicos. Pelo documento de fls. 150, verifica-se que os valores corretos (R$ 198.160 por mês) não são muito díspares dos montantes atestados erroneamente (R$ 209.529,00 por mês). Caso se tratasse de valor muito superior, seria difícil crer que o gestor, mesmo sem colocar a soma ‘na ponta do lápis’ não percebesse uma abissal divergência. Todavia, em se tratando de uma diferença de cerca de 5%, a tese de que a incorreção decorreu de mera negligência, sem a intenção de obter proveito indevido para si ou para outrem, mostra-se plausível, em especial quando se leva em consideração que o réu é médico e não tem formação em contabilidade nem em gestão pública”, pontuou Júlia Barbosa.
“Mesmo em relação a WILSON, é fundamental ressaltar que o peculato-desvio constitui crime punido unicamente a título doloso. Não obstante, constato que a acusação não se desincumbiu de provar que o réu tenha atuado com consciência e intenção de desviar recursos públicos em proveito da empresa H. STRATTNER”, afirmou, deixando claro a absolvição do médico.