Nos últimos sete anos, o valor da tarifa do transporte coletivo subiu 146,30% em Campo Grande, apesar da piora no sistema, como a substituição de ônibus articulados por médios e a manutenção de veículos velhos em circulação. Além do preço abusivo, o conselheiro Waldir Neves apontou 14 irregularidades para determinar a suspensão imediata do reajuste de 3,8%, que elevou o valor pago pelos passageiros de R$ 3,95 para R$ 4,10 no dia 28 de dezembro deste ano.
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Esta é a segunda vez que a corte fiscal intervém no reajuste do transporte coletivo na Capital. Em dezembro de 2016, o vice-presidente do TCE, conselheiro Ronaldo Chadid, suspendeu o reajuste autorizado por Alcides Bernal (PP). No entanto, na ocasião, a intervenção acabou sendo pior para o usuário, já que a corte determinou tarifa de R$ 3,55, dois centavos mais caro que o determinado pelo progressista (veja aqui).
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Agora, a liminar do TCE suspende o reajuste autorizado logo após o Natal pelo prefeito Marquinhos Trad (PSD). Apesar da decisão ter sido publicada em edição extra do Diário Oficial de ontem (7), o Consórcio Guaicurus informou que ainda não foi notificado para reduzir o preço para R$ 3,95.
Neves considerou que a população pode ter danos irreparáveis com a manutenção do reajuste de 3,8%. “Caso seja confirmada a inviabilidade do aumento ou mesmo determinada a redução da tarifa, a reparação de possível dano à economia popular pode ser extremamente árdua e custosa, por ensejar lesão a uma infinidade de usuários, em razão da natureza difusa e coletiva do serviço prestado”, ponderou o conselheiro.
“Dessa forma, o que se pretende por ora é impedir que a população campo-grandense seja onerada com tarifa que, posteriormente e após a análise técnica das variáveis da metodologia de cálculo empregadas, se mostre desarrazoada e incompatível com os parâmetros estabelecidos contratualmente”, explicou. Ou seja, caso seja confirmado valor inferior, o consórcio não terá condições de ressarcir quem pagou mais caro pelo ônibus urbano.
“Por mais que a suspensão do reajuste tarifário possa acarretar prejuízo financeiro ao consórcio durante o tempo em que for mantida, não há risco de dano irreparável, em razão de a empresa possuir meios legais de obter ressarcimento caso fique comprovado o prejuízo”, explicou.
Waldir Neves ressalta que não está negando o direito de o Consórcio Guaicurus reajustar a tarifa, mas determinando o cumprimento do contrato. Auditoria do TCE constatou irregularidades gravíssimas no cumprimento do contrato firmado em outubro de 2012, quando as empresas da família Constantino ganharam a licitação.
Confira as 14 irregularidades
1. Agereg – ausência de autonomia administrativa, financeira e decisória;
2. Omissão na fiscalização do contrato de concessão;
3. Ausência de medição e avaliação dos marcos contratuais;
4. Desequilíbrio tarifário;
5. Ausência de seguro (obrigação prevista no contrato de concessão);
6. Sistema m3m frota deficiente – vídeo em tempo real para informar ao usuário sobre a estimativa de chegada dos ônibus;
7. Frota de ônibus – ausência de processos individualizados para apuração da idade média dos veículos;
8. Terminais de transbordo – reforma e recomendação à concessionária que zele pela integridade das instalações;
9. Suspensão das juntas de recursos (Jarit e Jajur), constituídas em desconformidade com a lei municipal nº 3.577/98.
10. Insuficiência de fiscais do transporte coletivo e falta de descrição legal de suas funções;
11. Vistoria dos ônibus – adequação da estrutura, inclusive de pessoal e informatização;
12. Emissão dos autos de infração e de aplicação de multas por sistema informatizado;
13. Acessibilidade – exigência que o concessionário implemente plano de manutenção preventiva/corretiva do sistema de elevadores da frota;
14. Pontos de parada de ônibus – programa de implantação de abrigos e sua manutenção.
“In casu, tratam-se de aspectos relevantes na determinação dos custos para fixação da tarifa de transporte coletivo, a qual, inclusive, poderia ser reduzida ao se levar em conta o período em que a frota de ônibus operou com idade média superior ao fixado no Edital; a redução de investimentos na frota efeitos da variação do IPKe; e a ausência de comprovação de despesas com seguros, dentre outros. Ao invés de iniciar revisão tarifária, como pugnado pela Divisão Especializada, a Municipalidade optou por promover direta e unicamente o reajuste tarifário, sem considerar todos esses aspectos prejudiciais”, ponderou.
Conforme auditoria do Tribunal de Contas, o transporte coletivo de Campo Grande virou uma mina de ouro ou investimento da China. Nos últimos sete anos, a tarifa teve aumento de 146%, três maior que o rendimento da poupança (55,3%) e a inflação oficial no período (49,06%).
“Por outro lado, o reajuste tarifário que entrou em vigor em 1º de janeiro de 2019, com índice de 3,8% no preço da passagem de ônibus, somado aos demais praticados nos últimos sete anos desnuda uma variação muito superior à inflação. De 2012 a 2019, a variação da tarifa foi de 146,30%, enquanto o IGP-M acumulado do período foi de apenas 49,26%, o IPCA de 49,06% e a Poupança de 55,31%”, frisou o conselheiro.
“Muito embora existam outras variáveis que componham a fórmula matemática de reajuste da tarifa, saltam aos olhos a discrepância entre a variação praticada no contrato de concessão frente aos outros índices oficiais apurados no período”, alertou.
O conselheiro deixa claro que não há fiscalização no transporte coletivo da Capital, alvo de eternas reclamações dos usuários. A Agereg (de regulação) e Agetran (de trânsito) não incluíram no cálculo da tarifa a redução dos investimentos do consórcio na quantidade e na qualidade dos veículos, a substituição dos ônibus articulados por médios, o longo período que a frota operou acima da idade média prevista no contrato, a falta de investimentos em novos terminais e na criação de corredores exclusivos.
O processo no TCE pode demorar, mas o conselheiro Waldir Neves sinaliza com Termo de Ajustamento de Gestão. O relatório indica que o desfecho pode ser favorável aos cerca de 200 mil passageiros transportados diariamente. No entanto, a primeira intervenção da corte foi pior para o usuário.
Prefeitura diz que não vai recorrer e aguarda notificação do TCE
Em nota, a Prefeitura de Campo Grande anunciou que não irá recorrer contra a decisão do Tribunal de Contas. No entanto, a redução da tarifa só deverá ocorre quando o consórcio for notificado. Por outro lado, alerta que não será responsável por eventual reajuste acima dos R$ 4,10.
Confira a nota na íntegra:
“A Prefeitura não vai recorrer da decisão liminar do TCE. Todavia, se isenta de qualquer responsabilidade de retroatividade de custos e aumento maior da tarifa, caso a Justiça derrube a liminar e mantenha o reajuste técnico, dado conforme determinação contratual.
A Prefeitura aguarda notificação, que também será feita pelo TCE ao consórcio, para cumprir a decisão e determinar o valor da tarifa em R$ 3,95, que repita-se (sic), somente sofreu reajuste técnico por força contratual de uma licitação corroborada, analisada e ratificada pelo próprio TCE-MS.
Vale ressaltar que a Prefeitura está cobrando melhorias do consórcio e investindo no que compete à administração municipal. Como exemplo, a reforma dos terminais de ônibus, que começam a receber melhorias nesta quarta-feira e o investimento em corredores de ônibus, que garantirão um transporte com melhor qualidade aos usuários.”