Atolado em dívidas e com ingresso diário de novas ações de cobrança, o Grupo Bigolin ganhou sobrevida com o cancelamento da falência pela 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. Apesar do crescimento de 60% na dívida durante a recuperação judicial, de R$ 54,7 milhões para R$ 88 milhões, os desembargadores consideraram que o juiz não seguiu a lei ao decretar o encerramento das atividades da empresa, uma das mais tradicionais do Estado.
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Para o relator, desembargador Vilson Bertelli, a medida legal no caso seria a convolação da recuperação em falência – uma espécie de última chance. A falência só poderia ser decretada em novo processo, com o direito constitucional da ampla defesa e aval da assembleia de credores.
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A recuperação judicial do grupo começou em fevereiro de 2016. Os sócios alegaram que apostaram alto na recuperação da economia, mas se frustraram devido ao aumento da concorrência, majoração da carga tributária e queda brusca nos investimentos federais.
Em três anos, a empresa não conseguiu reduzir a dívida, não emplacou o plano de recuperação judicial junto aos credores e os donos teriam abusado ao ficar com R$ 365,2 mil em pró-labore, enquanto funcionários ficaram sem salários e 13º.
O juiz José Henrique Neiva de Carvalho e Silva, da Vara de Falências, Insolvências e Recuperações Judiciais de Campo Grande, decretou a falência em março deste ano. Ele mandou fechar e lacrar as lojas Bigolin, Ângulo, Casa Plena, D & D e Nara Rosa. Uma semana depois, o TJ concedeu liminar que garantiu a reabertura dos estabelecimentos.
Conforme acórdão publicado hoje (22), no julgamento realizado na terça-feira (20), os desembargadores acataram o pedido do grupo e cancelaram a falência. “Somente seria cabível a decretação de falência, com fundamento no art. 94, III, “a”, da Lei nº 11.101/05 se houvesse pedido nesse sentido, formulado pelas pessoas elencadas no art. 97 da mesma Lei. Portanto, houve violação ao devido processo legal”, destacou Bertelli.
“Logo, a decisão impugnada extrapolou de forma grave os limites da jurisdição. Aproveitou-se de um singelo requerimento cujo objeto era a convolação da recuperação em falência, feito com respaldo no art. 73, para, exponte sua, inserir fundamentos que exigem demanda formulada pelos legitimados. Atitude essa absolutamente ilegal, fruto de total desconhecimento das regras da Lei de Recuperação de Empresas, e em total descompasso como os limites da atuação jurisdicional”, afirmou o desembargador, dando um puxão de orelhas no magistrado.
Sobre o suposto abuso dos sócios no caso dos R$ 365 mil, Bertelli esclareceu que o valor foi pago por dois anos e cada dono recebeu R$ 15,2 mil por mês. “Não é valor exorbitante”, concluiu. “Ainda, a Lei não obsta o pagamento de remuneração aos sócios. Na recuperação judicial, a empresa continua exercendo normalmente suas atividades e, portanto, cabe aos sócios e aos funcionários receberem a remuneração respectiva”, pontuou.
“Essa situação última, destaque-se isso, convolação da recuperação judicial em falência por rejeição do plano art. 73 da Lei, é diversa do decreto de falência com lastro no art. 93, da mesma Lei. Vale dizer, sob qualquer ângulo, a decisão é nula. Essa nulidade é insuperável nesta fase recursal, por ferir o princípio da inércia da jurisdição (CPC, art. 2º), por ofensa ao devido processo legal, ao contraditório (CPC,art. 10) e à ampla defesa, bem como porque a análise do preenchimento dos requisitos previstos para a aplicação do cram down significaria supressão de instância”, frisou.
Em entrevista ao Correio do Estado, o advogado Lucas Mochi, explicou que a dívida cairá de R$ 59,6 milhões para R$ 29,6 milhões. Este valor poderá ser pago em 15 anos.
A expectativa é arrecadar R$ 15,5 milhões com a venda do centro de distribuição em Campo Grande, que fica no macro anel rodoviário. No entanto, o leilão não teve interessados.
Nos últimos meses, várias empresas e pessoas continuaram se habilitando para receber dívidas da empresa. A maior parte é formada por ações da Justiça do Trabalho, que determinou o pagamento das rescisões trabalhistas. O número de empregados do grupo passou de 600 para 350.
A Bigolin ganhou um fôlego com a decisão do TJ, mas ainda não se livrou totalmente da falência.