Delação premiada feita no Paraná revela fraude e diversas irregualaridades na licitação do transporte coletivo de Campo Grande, realizada com dois anos de antecedência e firmada no apagar das luzes da gestão de Nelsinho Trad (PSD) em 2012. Para manter o contrato de R$ 3,4 bilhões, a família Constantino teve acesso e fez mudanças no edital antes da publicação e ainda simulou concorrência.
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As denúncias gravíssimas foram feitas pelo advogado Sacha Brenkfield Reck, 38 anos, que firmou acordo de colaboração premiada com o Gaeco (Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado) do Paraná em 2016. O teor da delação se tornaram públicos em 2017, mas só foram revelados nesta quarta-feira (31) pelo jornal Midiamax.
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As novas revelações devem causar mais indignação nos passageiros, que pagam caro, mas usufruem serviço precário e ônibus velhos. Influente e poderoso, o Consórcio Guaicurus teve isenção de mais de R$ 40 milhões em ISS (Imposto Sobre Serviços), benefício aprovado com o aval da maioria dos 29 vereadores da Capital.
O contrato da prefeitura com as cinco empresas do transporte coletivo venceria em 2014. Nelsinho cogitou antecipar a prorrogação, assim como fez com a Águas Guariroba, que teve o contrato estendido por mais 30 anos em 2012, apesar do vencimento só estar previsto para 2030.
Reck revelou, em depoimento feito por horas aos promotores Victor Hugo Nicastro Hoessko e Leandra Flores, que foi o responsável pela proposta encampada pelo então prefeito. Nelsinho rescindiu os contratos e lançou nova licitação.
Antes do edital ser publicado, o empresário João Resende, presidente da Assetur (Associação das Empresas do Transporte Coletivo) na época, obteve a minuta do edital e entregou para a assessoria jurídica da família Constantino.
Reck contou que ele e o advogado Adalbert Villa passaram quase um mês analisando o edital. Além da correção dos erros de digitação e de português, eles mudaram o tempo de transição para a implantação de um sistema moderno, de 12 para 24 meses. O delator diz que houve ajuda na parte técnica, mas não houve favorecimento.
O consórcio foi formado com as quatro empresas da família Constantino: Cidade Morena, Jaguar, São Francisco e Campo Grande. A Viação Serrana era a única que não pertencia à poderosa família. A empresa foi incluída no consórcio, através da Floresta, de um grupo do Acre, mas que acabou sendo excluída nos primeiros meses do novo contrato.
Com o consórcio formado para participar do certame, a prefeitura queria dois participantes na licitação, ou seja, para não deixar na cara o favorecimento ao grupo. Então, a Assetur pediu para a Auto Viação Redentor, de Curitiba (PR), para simular participação no certame.
De acordo com Reck, os sócios da empresa paranaense não cobraram nada para apresentar proposta, mas deixara como uma espécie de favor para os Constantinos. “É difícil alguém concorrer com a (família) Constantino, independente de onde, como, seja a licitação ou se… se o edital é assim, ou assado”, explica o consultor.
O delator é alvo de vários processos no Paraná, onde o combate à corrupção tem sido efetivo por parte do Ministério Público e da Justiça.Naquele estado, nem o eleitor tem sido conivente com a roubalheira, veja o caso do ex-governador Beto Richa (PSDB), que perdeu a eleição “ganha” após ser alvo de denúncias pela Polícia Federal e pelo Gaeco.
Sacha Reck já foi condenado pela Justiça do Distrito Federal por fraude em licitação para o transporte público da capital federal. Ele deverá devolver R$ 744 mil aos cofres públicos, além de ter os direitos políticos suspensos por cinco anos.
A dúvida é saber se os vereadores, sempre acomodados diante de fatos graves, vão tomar a iniciativa e aprovar a CPI para investigar as denúncias no transporte coletivo?
E a influência da família Constantino será forte o suficiente para inibir até o protagonismo dos promotores?
Consórcio e Nelsinho destacam que processo foi legítimo e legal
O advogado André Borges afirmou, em nota enviada ao Midiamax, que o Consórcio Guaicurus teve acesso antecipado ao edital “visando aprimoramentos”.
“Nada de errado houve na licitação, chancelada quanto à validade por importantes órgãos de controle. Edital foi divulgado com antecedência, visando aprimoramentos. Delação é algo que merece ser compreendida com enormes temperamentos, ainda mais quando pode ter partido de advogado à época com enorme conceito no setor”, afirmou.
“Consórcio está e sempre esteve à disposição dos órgãos públicos, para esclarecer o que for necessário. Investigação de Guarapuava vem sendo acompanhada tecnicamente, sequer havendo especificamente apuração quanto à licitação de Campo Grande”, ressaltou.
O senador Nelsinho Trad também negou qualquer irregularidade na licitação do ônibus. “O processo, ele seguiu seu curso normal obedecendo a legislação. Com certeza absoluta não (ocorreu irregularidade), até porque nunca foi questionado isso aí. Já se passaram quanto tempo? “, afirmou, referindo-se aos sete anos.
“Se está judicializado lá, eles que tem a prerrogativa de investigar isso aí. Em relação a Campo Grande, eu posso te dizer que foi tudo dentro da legislação”, garantiu o ex-prefeito, sobre a investigação no Paraná, que apura a existência de organização criminosa no setor.
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