A Justiça Federal suspendeu a punição imposta ao ex-prefeito Alcides Bernal (PP), que estava proibido de advogar por 30 dias ou até prestar contas sobre o dinheiro da cliente. Além de acatar pedido da defesa, o juiz Renato Toniasso, da 1ª Vara Federal de Campo Grande, deu puxão de orelhas na OAB/MS (Ordem dos Advogados do Brasil, seccional de Mato Grosso do Sul) por aplicar a penalidade sem provas da suposta infração disciplinar.
[adrotate group=”3″]
Bernal teve a carteira de advogado suspensa porque não teria prestado contas à ex-catadora de recicláveis Dilá Dirce de Souza. Ela ganhou na Justiça direito a indenização de 106 salários mínimos por ter sido atropelada por caminhão da Vega Engenharia Ambiental. O progressista é acusado de ter ficado com parte do dinheiro.
Veja mais:
Bernal tem o 3º revés na Justiça, mas ainda pode ser candidato em 2018
Juiz suspende direitos políticos de Bernal, Nelsinho e Olarte por não cumprir TAC
A polêmica começou em 2013, logo após o radialista e advogado assumir o cargo de prefeito de Campo Grande. A história teve ampla repercussão nacional.
O desfecho ocorreu no mês passado, quando a turma do Tribunal de Ética e Disciplina da entidade, optou pela punição ao ex-prefeito. A relatora foi a advogada Jisele Porto Nogueira Braga.
Para suspender a punição, o advogado Wilton Edgar Acosta alegou que não houve notificação. Apesar de Bernal ser político notório e ter ocupado a prefeitura até dezembro de 2016, a entidade não o localizou e enviou o comunicado da abertura de processo disciplinar em endereço diverso do seu.
No mérito, Bernal afirma que não se apropriou de valores indevidos da ex-catadora e nunca se negou a prestar contas da causa.
O ex-prefeito convenceu o magistrado de que não cometeu nenhuma irregularidade e obteve a liminar para suspender a punição imposta pela entidade.
Renato Toniasso analisou o voto da relatora e encontrou falhas na conclusão.
“É que, apesar de a relatora do Feito desenvolver vários raciocínios nesse sentido e ter chegado à conclusão de que não restou ‘provado o locupletamento’ do representado (fl. 6 dessa decisão), a mesma apresentou voto reconhecendo que o representado não cumpriu o dever de prestar contas à sua cliente, mas mesmo assim enquadrou-o no artigo 34 XX ‘do Estatuto da Advocacia’, no que foi seguida pelos seus pares”, analisou.
“Se foi reconhecido que o representado cometeu infração ético-disciplinar por deixar de prestar contas à sua cliente, mas não havia restado provado o locupletamento do mesmo, o enquadramento deveria ter sido no inciso XXI do artigo 34 de lei de regência, e não no inciso XX, conforme foi feito”, segue o juiz.
“E, inclusive, para o enquadramento no inciso XXI, deveria ter sido provado que a representante teria solicitado ao advogado representado, que lhe prestasse contas, e ele se recusou injustificadamente a isso, o que, ao que parece, não foi feito”, avalia.
Neste caso, Toniasso admite rever a decisão caso a OAB/MS prove que Dilá solicitou a prestação de contas e não teve o direito atendido por Bernal.
“Quanto ao enquadramento no inciso XX, parece-me ser necessário que o julgador, primeiro reconheça que houve locupletamento (o verbo da lei é imperativo: “locupletar-se”), para depois aplicar a sanção”, ressalta.
“Afinal, não faz sentido aplicar-se a penalidade (suspensão por 30 dias, perduráveis até a prestação de contas), com todos os efeitos deletérios daí advindos (inclusive em termos de imagem profissional, com publicação na imprensa, etc.), diante da possibilidade de não ter havido locupletamento (conforme, aliás, já se considerou no voto da relatora)”, anota, dando o puxão de orelha na entidade.
Toniasso diz que é comum o cliente receber o dinheiro e nunca pedir prestação de contas aos advogados. “Aqui, nesta 1ª. Vara, é bastante comum alvarás de levantamento de importâncias permanecerem inativos e até serem devolvidos porque os advogados não conseguem encontrar os seus clientes”, frisa.
“Então, como se pode penalizar o advogado sem a prova de que o seu cliente solicitou que ele lhe prestasse contas e ele se negou injustificadamente a tanto?”, questiona.
“O periculum in mora é evidente, uma vez que o impetrante está impedido de exercer a sua profissão, o que pode comprometer o seu sustento e o dos seus familiares. Além disso, está sofrendo inegável abalo de imagem, uma vez ser público é notório o seu envolvimento com atividades político-partidárias, e, bem assim, que o fato da sua penalização pela OAB/MS vem sendo amplamente difundido pela imprensa”, justifica, para conceder a liminar.
A polêmica de Bernal com a OAB/MS é antiga. Em 2013, ele causou escândalo ao contratar o então presidente da ordem, Júlio César de Souza, para elevar o índice da prefeitura da Capital no rateio do ICMS. Ele era adversário do atual presidente, Mansour Elias Karmouche.
A entidade também cassou a carteira do advogado de Bernal, que conseguiu recuperá-lo na Justiça. Wilton também alegou que não foi notificado para se defender.
A história envolvendo Dilá ainda rendeu a condenação de Bernal na área criminal. O ex-prefeito foi condenado a um ano de detenção em regime aberto por difamar o advogado da ex-catadora, Rubens Clayton Pereira de Deus.
Ele o acusou de tentar extorquir R$ 600 mil na época em que a imprensa divulgou a suposta apropriação do dinheiro. Rubens entrou com ação na Justiça, que condenou o progressista a pena de detenção de um ano. Bernal recorreu contra a sentença.
Em meio a toda a polêmica, Bernal ficou de suplente de deputado federal nas eleições do ano passado. Ele recorreu ao Supremo Tribunal Federa para recuperar os direitos políticos e assumir o mandato no lugar de Bia Cavassa (PSDB), que ficou com a vaga de Tereza Cristina.