Prisões, investigações da Polícia Federal e do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado), sequestro de bens e o prejuízo de R$ 660 milhões aos cofres públicos, em valores atualizados pela inflação. Dezesseis anos após a abertura do inquérito, o escândalo Campina Verde patinou na burocracia da Justiça e terminou impune.
[adrotate group=”3″]
Acusados de seis crimes – documento falso, falsidade ideológica, crime contra a ordem tributária, falsificação de documento público, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha (organização criminosa) – o empresário Nilton Rocha Filho e os filhos Nilton Fernando Rocha e Aurélio Rocha foram salvos pela prescrição.
Veja mais:
Juiz, PF e MPF se esforçam, mas não conseguem destravar Lama Asfáltica, parada há 14 meses
Recursos infinitos atrasam Lama Asfáltica e causam frustração social, admite juiz
Irmã de Amorim, deputada usa Lama Asfáltica para atrasar inquérito sobre corrupção no lixo
Vara com ações da Lama Asfáltica ficam com o substituto do substituto
Giroto é réu em mais duas ações
Ex-deputado e esposa se tornam réus por ocultar fortuna ao construir mansão
A história da tramitação deste escândalo na Justiça Federal de Mato Grosso do Sul deixa estarrecido até o mais calmo dos contribuintes, acostumado com a impunidade brasileira. A denúncia foi feita pelo Ministério Público Federal e recebida pela Justiça em 13 de janeiro de 2006.
No meio do caminho, a defesa dos acusados foi salva pela dúvida do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, o mesmo de outros escândalos de corrupção em Mato Grosso do Sul, de quem seria a competência para julgar a ação penal: a 3ª Vara Federal de Campo Grande, especializada nos crimes de lavagem de dinheiro, ou a 2ª Vara Criminal de Dourados. Esse impasse cruel só terminou em março deste ano, quando a corte constatou que se tratava dos crimes de lavagem de dinheiro e ocultação de patrimônio.
O processo retomou para a 3ª Vara Federal de Campo Grande. Empossado como titular da unidade em 26 de março deste ano, o juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira se debruçou sobre o escândalo e constatou a prescrição de todos os crimes.
Na semana passada, o magistrado julgou extinto o processo e “absolveu” todos os acusados devido à prescrição das penas. Em 2006, conforme a denúncia, a suposta organização criminosa sonegou impostos federais e estaduais, causando prejuízo de R$ 330 milhões ao erário.
Este valor atualizado pela inflação oficial seria de R$ 660 milhões, três vezes o valor do prejuízo apurado na Operação Vostok, que envolve o governador Reinaldo Azambuja (PSDB), e o triplo do gasto no Aquário do Pantanal. O dinheiro seria suficiente para quitar um mês de salário dos 75 mil servidores públicos estaduais e ainda sobravam R$ 200 milhões para garantir a manutenção do Hospital do Trauma por 20 meses.
A conclusão do escândalo Campina Verde sem culpados também ocorreu na 2ª Vara Criminal de Dourados, onde tramitava a ação penal que apontava prejuízo de R$ 123,9 milhões. A denúncia chegou a ser aceita em 25 de junho de 2008, mas ninguém foi punido em sentença publicada em meados do ano passado.
O sentimento da sociedade foi expressado pelo MPF em nota a respeito deste escândalo: “frustração”. “Afinal, esta ação penal tramitou por 12 longos anos sem que chegasse a uma decisão final de exame das questões de fato. A sensação é de que todo o esforço do Ministério Público Federal e da Polícia Federal nesse caso foi em vão, já que tudo desaguou e acabará em prescrição”, diz o órgão, em nota que resume a indignação de quem honra a manutenção da máquina pública com o pagamento em dia e correto dos impostos.
O problema é que outros escândalos serão julgados pela Justiça Federal e vão passar, de uma forma ou de outra, pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região.
Poderosos e influentes na política regional nas duas últimas décadas, o ex-deputado federal Edson Giroto e o empreiteiro João Amorim só estão presos graças a intervenção do Supremo Tribunal Federal e a rapidez da procuradora-geral da República, Raquel Dodge.
Eles tiveram a prisão preventiva decretada pela 1ª Turma do STF em 6 de março deste ano, mas foram soltos pela 5ª Turma do TRF3 poucos dias depois. Em 8 de maio deste ano, ao atender reclamação da procuradora-geral, o ministro Alexandre de Moraes viu afronta da corte regional e decretou a prisão preventiva dos integrantes da suposta organização criminosa.
A Operação Lama Asfáltica já revelou o desvio de mais de R$ 500 milhões dos cofres públicos e conseguiu o bloqueio de R$ 303 milhões. O ex-governador André Puccinelli (MDB) é um dos notáveis encarcerado neste escândalo há mais de três meses.
Outro caso emblemático é o escândalo da licitação bilionária do lixo, que envolve a deputada estadual Antonieta Amorim (MDB),e tramita há seis no TRF3. O mais grave, a ação penal por peculato tramita em sigilo, longe dos olhos da sociedade.
Só para se ter ideia da gravidade, o caso Campina Verde acabou sem punição, apesar de nunca ter tramitado em sigilo. Até hoje, a sociedade sul-mato-grossense não tem conhecimento das denúncias nem das provas contra a emedebista, irmã de João Amorim, e ex-mulher do senador eleito Nelsinho Trad (PTB).