A Câmara Municipal de Campo Grande tomou para si a responsabilidade de conseguir o tombamento e preservar o Parque dos Poderes, em projeto que também engloba o Parque das Nações Indígenas e o Parque Estadual do Prosa. A proposta foi apresentada pela vereadora Luiza Ribeiro (PT) e conta com apoio de ambientalistas, pesquisadores, juristas e representantes de movimentos de preservação da área.
A medida contrasta com o que fizeram os deputados da Assembleia Legislativa de Mato Grosso do Sul, que na penúltima sessão de 2019, sem qualquer debate com a sociedade, revogaram o Decreto Legislativo 606, que iniciava o processo de tombamento do Complexo dos Poderes na Capital.
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O decreto era uma arma do Ministério Público Estadual para impedir o desmatamento da área, que ficou sem respaldo legal. Na justificativa para a revogação, os deputados alegaram que o tombamento extrapolou os limites legais ao usar a via inadequada e inapropriada. A competência seria da Fundação de Cultura.
No fim de abril, a vereadora Luiza Ribeiro encampou o debate no legislativo de Campo Grande ao apresentar o Projeto de Lei n. 10.970/2023 com o propósito de preservar o complexo de imóveis composto pelo Parque dos Poderes, Parque Estadual do Prosa e Parque das Nações Indígenas.
Em sua justificativa, a parlamentar diz que os parques “formam uma universalidade de bens imóveis cuja conservação é de interesse público, por se tratar de monumentos naturais e paisagens de notável beleza cênica e relevância ambiental”.
“Trata-se de proposição que tem como finalidade proteger todo aquele complexo e seus recursos ambientais, preservando sua atmosfera, suas águas superficiais e subterrâneas, seu solo e subsolo e suas espécies da fauna e flora, cuidando da manutenção da qualidade de vida e do patrimônio cultural e paisagístico de Campo Grande”, justifica a vereadora.
Luiza Ribeiro diz que o projeto foi montado após debate com ambientalistas, pesquisadores, juristas e representantes de movimentos como o S.O.S. Parque e Amigos do Parque.
“O tombamento será relevante para garantir a proteção de todos aqueles bens imóveis, além de proibir a supressão da vegetação nas áreas que compõem os imóveis tombados, a retirada de qualquer espécie de vegetação, especialmente a mata nativa, a realização de obras de terraplanagem, aberturas de canais de outras, de iniciativa do poder público ou da iniciativa privada”, explica a vereadora.
“Além disso proíbe atividades capazes de provocar erosão das terras e assoreamento, atividades que ameacem extinguir espécies da fauna e da flora existentes no complexo de parques, proíbe a exploração de recursos naturais, exceto para pesquisa, também proíbe o uso de instrumentos de caça, pesca e de corte de árvores, permitido aqueles destinados para as podas, cuidados e melhoramentos das plantas e dos jardins existentes no local”, completa.
O projeto de lei também estabelece que as edificações já existentes nos serão protegidas pelo tombamento, mas poderão ser reformadas, revitalizadas ou restauradas desde que mantenham a originalidade arquitetônica. Os órgãos ambiental e cultural de Campo Grande poderão estabelecer limites e diretrizes para a intervenções nas áreas de entorno dos bens tombados pela lei proposta.
Dos campo-grandenses
O economista e defensor do Parque dos Poderes, Alfredo Sulzer, comemora a iniciativa dos vereadores. “Sempre comentamos que a Prefeitura de Campo Grande tem responsabilidade naquela área. A administração municipal sempre se omitiu. Aquela é uma área dentro da cidade e tem que estar contida no Plano Diretor da cidade, que deve estabelecer o que pode e como se deve construir naquela região”, defende.
“Aquilo é de Campo Grande, e ali tem que acatar a lei municipal de ocupação daquele solo, mas a administração pública municipal nunca se envolveu com isso. O argumento sempre foi de que aquilo é do Estado e o Estado tem que tomar conta. Mas a gente entende que aquele espaço público é da Capital e de seus moradores, que aproveitam aquele espaço para diversas atividades”, argumenta.
Alfredo Sulzer lembra o caso do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul que pretendia construir o novo Palácio do Justiça, que teria 60 mil metros quadrados, e planejava desmatar a área de seis hectares. O plano, porém, foi suspenso em março deste ano.
“O Tribunal de Justiça cercou seis hectares de terra, cercou e não deu a mínima para ninguém. Cercou como se fosse dele. Aquela área, pela lei que regula a ocupação daquele espaço, impede que se construa qualquer coisa ali. Queriam passar por cima”, reclama Alfredo.
O TJMS pode retomar o projeto, mas após a realização de novos estudos, que considerem, inclusive, a questão de preservação ambiental, mas pode ter um novo obstáculo caso o tombamento prospere.
Tramitação na Câmara
O projeto foi discutido entre representantes de entidades e institutos ligados ao meio ambiente, pesquisadores, ambientalistas e advogados com o presidente da Casa, vereador Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), e outros parlamentares.
“Essa área que nós estamos lutando é considerada uma ilha de frescor de Campo Grande. É uma área muito importante não só do ponto de vista climático, mas também do ponto de vista cultural. E do ponto de vista climático, nós temos uma diferença entre o Centro para essa área [Parque dos Poderes] de 5ºC. É muita coisa”, relatou Maristela Benites, do SOS Parque dos Poderes.
“Nestes momentos em que estamos falando de mudanças climáticas, que a gente está vendo perda de água, perda de solo, perda de biodiversidade, então essa área é estratégica do ponto de vista, cultural, climático, e agora também do ponto de vista hidrológico”, concluiu.
Carlão informou que o projeto recebeu parecer favorável da Procuradoria Jurídica da Câmara, mas ainda deve passar pelas comissões pertinentes antes de ir a votação em plenário, programada para 5 de junho, data que celebra o Dia Mundial do Meio Ambiente.