O desmatamento no Parque dos Poderes planejado pelo governador Reinaldo Azambuja (PSDB), com o apoio de 18 deputados estaduais, vai agravar os alagamentos em Campo Grande. As cenas registradas na quinta-feira (20) não só vão se tornar mais frequentes, como vão oferecer mais riscos à população, e poderão causar tragédias.
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O alerta é de especialistas e ambientalistas. Ontem, o temporal causou alagamentos em 13 locais. O caso mais emblemático ocorreu na Avenida Ernesto Geisel, onde o Córrego Segredo transbordou e cobriu carros. O Corpo de Bombeiros foi obrigado a usar uma retroescavadeira para socorrer mãe e filha, que ficaram ilhadas ao serem surpreendidas pela inundação. Veículos foram arrastados e até encobertos pela enxurrada.
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Coordenador da Ecoa – Ecologia e Ação, André Luiz Siqueira alerta que a Capital já sofre os efeitos da ocupação desordenada dos fundos de vale e problema de drenagem das águas pluviais. Com a retirada da mata em 30 hectares, como planeja o tucano, a situação vai ficar ainda mais complicada.
André Luiz explica que a área de preservação ambiental do Parque dos Poderes funciona como regulação do microclima e ajuda na absorção da água da chuva. “Obviamente o desmatamento diminui absurdamente a absorção da água e contribui para os alagamentos”, alerta o ecologista.
A mesma opinião tem o professor de Biologia da Uniderp, José Sabino. “A vegetação das cidades e as áreas permeáveis para a água têm papel muito importante para reter a velocidade das águas em áreas urbanizadas. A vegetação atua de duas maneiras: 1. Amortece a velocidade das águas e não deixa que ela “corra” rapidamente para os riachos urbanos. 2. A vegetação retém o sedimento e reduz o efeito do assoreamento nos lagos e riachos urbanos. Desse modo, a retirada de parte da vegetação do Parque dos Poderes deve agravar os problemas das inundações em Campo Grande”, explica.
Outro problema, conforme o pesquisador, é que as chuvas são intensas e estão cada vez mais concentradas e volumosas. “Manter os ambientes com vegetação é solução encontrada em muitas cidades mundo afora. A vegetação presta aquilo que chamamos de Serviços Ecossistêmicos (como amortecer a velocidade das águas, aumentar a infiltração no solo e não deixar que a água ‘corra’ para os riachos urbanos). A vegetação no entrono dos riachos também faz a função de reter o sedimento e reduzir o efeito do assoreamento”, ressalta.
O professor de Ecologia da Uniderp, Ademir Kleber Morbeck de Oliveira, aponta que qualquer desmatamento vai causar o agravamento das inundações e causar uma série de transtornos para a população. Ao invés de desmatar, as autoridades deveriam estar mais preocupadas em preservar as atuais e criar novas áreas verdes para minimizar, mas não agravar o problema.
Essas argumentações já constam da ação civil pública protocolada pelo promotor Luiz Antônio Freitas de Almeida. Pesquisadores e especialistas alertaram o Governo do Estado de que o desmatamento do Parque vai tornar mais frequentes os alagamentos na Via Parque. Na região, a prefeitura conseguiu minimizar o problema com a construção de barreiras para reduzir a velocidade da água.
O poder público já vem tendo gastos em decorrência da falta de planejamentos dos gestores, como é o caso do dinheiro investido para desassorear o lago do Parque das Nações Indígenas. Caso Reinaldo siga com o desmatamento, especialistas alertam que Campo Grande poderá perder o lago, considerado um dos mais belos cartões postais da Capital.
O desmatamento poderá causar transtornos como os registrados nesta quinta-feira na obra de revitalização da Avenida Ernesto Geisel, que custará R$ 52 milhões aos cofres públicos. Em andamento, a obra de combate a enchente no Rio Anhandui sofreu com a chuva de 73 mm de ontem.
A parte revitalizada em frente ao Shopping Norte Sul desmoronou com a força da água, levando para dentro do rio inclusive parte da nova calçada e gramado. De acordo com o secretário municipal de Infraestrutura, Rudi Fiorese, em entrevista ao Campo Grande, a recuperação do trecho vai ser a parte mais cara da recuperação do temporal de ontem.
Felizmente, as chuvas ainda não causam as mortes, como as registradas nos outros estados brasileiros, mas pelo andar da carruagem, se a sociedade não acordar, as tragédias serão questão de tempo.
Nesta sexta-feira, a partir das 18h, o movimento S.O.S. Parque promove o evento “Diálogos e Marchinhas”, a partir das 18h, no Velfarre. Caio Áspet vai falar sobre “Impacto do desmatamento ao meio físico do Parque dos Poderes”, enquanto Maristela Benites falará sobre “A importância da vifauna do Parque dos Poderes”, entre outros.
Além da mobilização da sociedade, o movimento contra o desmatamento teve vitória importante na terça-feira, quando a 2ª Câmara Cível manteve suspensa a retirada de árvores para construção do novo prédio da Secretaria de Fazenda.