Eloisa Castro Berro e Raíssa Teixeira Almeida de Souza – O Brasil carrega marcas profundas de desigualdade de gênero. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, as mulheres brasileiras ganhavam, em média, 78% do salário dos homens. Para as mulheres negras, essa realidade é ainda pior: recebem apenas 44% do rendimento médio dos homens brancos.
São as mulheres também as mais vulneráveis ao desemprego, à informalidade e à pobreza extrema. Para muitas é preciso lutar para existir. Os dados mostram também que, nesses últimos anos, a violência contra as mulheres registrou forte aumento, escancarando o machismo e a força do patriarcado na sociedade.
Veja mais:
Tema Livre: Onde falhamos no caso da Vanessa Ricarte? Algumas reflexões
Tema Livre – Saúde Mental no Trabalho
Tema Livre – As inovações tecnológicas podem substituir a interação presencial em sala de aula?
Em Mato Grosso do Sul, só em 2024, foram concedidas 39 medidas protetivas por dia e registradas mais de 22 mil denúncias de violência, além de 35 feminicídios. Nos parece que ser mulher é estar permanentemente em risco! Todos os dias vemos casos de morte violenta de mulheres, perpetradas principalmente por maridos e ex-maridos, uma história que se repete ao longo dos anos.
O Brasil tem um dos melhores normativos penais e processuais do mundo em defesa das mulheres. Atualmente foi sancionada a Lei 14.994/2024, chamada Pacote Antifeminicídio, em que as penas aumentaram para até 40 anos de prisão para o crime de feminicídio, maior previsto na legislação penal, equiparando o feminicídio aos crimes hediondos. Essa lei veio para mostrar a gravidade do crime para a população.
A Lei do Feminicídio e a Lei Maria da Penha são importantes para o enfrentamento da violência, no entanto, os dados mostram o aumento expressivo dos casos de violência e morte. Será que só as leis mais duras, que aumentam a punição do agressor estão resolvendo o problema da violência contra as mulheres? Precisamos sim responsabilizar o agressor, mas também é preciso enfrentar o machismo estrutural na sociedade. A cultura não se reverte só com o processo penal, é preciso investir na educação no sentido de acelerar a mudança do comportamento cultural.
As leis 14.164/2021 e 14.986/2024 são, nesse sentido, a esperança de mudar essa realidade. A primeira altera a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) para incluir conteúdos de prevenção à violência no ensino básico brasileiro, enquanto a segunda inclui nos currículos escolares de ensino fundamental e médio, a obrigatoriedade do ensino das experiências e contribuições de mulheres em diversas áreas do conhecimento. Debater esses temas é fundamental para o avanço dos direitos das mulheres no Brasil.
Essas medidas visam garantir que a educação seja mais equitativa e representativa, valorizando a prevenção à violência e o papel das mulheres na história, ciência, política, artes e cultura. Com esse intuito, as leis também instituem a Semana Escolar de Combate à Violência contra a Mulher e a Semana de Valorização de Mulheres que Fizeram História, a serem celebradas anualmente em março, com o objetivo de promover atividades que impulsionem a reflexão sobre a violência e destaquem as conquistas das mulheres nas diversas áreas de conhecimento.
Entre direitos políticos, civis e de combate à violência vemos, desde o século XX, um avanço considerável nos direitos das mulheres, como a possibilidade do voto, do trabalho, do divórcio, assim como leis que buscam prevenir e punir os crimes de violência doméstica e feminicídio.
Falar sobre violência contra as mulheres é fundamental num país como o Brasil que, em diversas estatísticas, é um dos que mais mata mulheres no mundo.
Acreditamos que o caminho para essa mudança necessária se faz através da Educação. As leis acima citadas entraram em vigor e sua implementação representa um passo significativo para a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e livre de violência.
A educação é o espaço de maior possibilidade de transformação que temos, é na escola que as novas gerações são educadas, como também ensinam as gerações anteriores sobre as mudanças que estão ocorrendo no mundo. Neste sentido, as meninas não têm se identificado com os/as personagens da história contada nas escolas, pois são majoritariamente homens. Já é chegada a hora de sabermos quem foram as mulheres que mudaram nossa história: de Hipátia à Fernanda Torres, de Dandara à Célia Xakriabá.
A invisibilidade das mulheres através da história contribuiu para a sua não valorização, culminando em diversas formas de violência. Portanto, precisamos agir para que essas leis não sejam letra morta. A luta por igualdade de gênero é um processo contínuo, que exige o engajamento de toda a sociedade para garantir que os direitos das mulheres sejam respeitados e que todas as pessoas possam viver em igualdade e liberdade. A Educação é ferramenta fundamental para essa transformação necessária.
A capacitação das(os) profissionais para que essas leis sejam de fato implementadas na prática deve começar pelas gestoras, diretoras e coordenadoras pedagógicas, levando em consideração a obrigatoriedade da alteração dos currículos para que os conteúdos sobre a contribuição/participação das mulheres sejam inseridos.
É importante ressaltar que não há a necessidade de novas disciplinas, o conteúdo deve ser ministrado a partir das disciplinas já existentes, pontuando a contribuição das mulheres quando essas forem protagonistas das descobertas, acontecimentos, questões históricas e políticas que são relevantes de serem abordadas.
A partir disso, deve-se construir uma formação continuada buscando compreender as dificuldades e complexidades do dia a dia da sala de aula. Um trabalho de formação que capacite e contribua com a mudança de uma cultura machista na sociedade.
Nesse sentido, mobilizar a comunidade escolar, os sindicatos e Federação dos trabalhadores em educação é imprescindível para que possamos transformar a educação pública em um ensino emancipador, voltado aos direitos humanos, igualdade de gênero e contra qualquer tipo de discriminação e preconceito.