O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul proibiu o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, de analisar a hipótese de nepotismo cruzado e acabou salvando o emprego de parentes no Tribunal de Contas do Estado. Graças à limitação imposta pela Justiça, irmãos, mulheres e filhos de desembargadores do TJMS, de secretários e de parlamentares não poderão ser exonerados nem obrigados a devolver os salários pagos pelo erário.
Em sentença publicada nesta sexta-feira (28), o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa julgou a ação popular impetrada por Daytron Cristiano Barbosa de Souza improcedente porque só pode analisar o nepotismo direto. “Como não restou configurado na hipótese o nepotismo direto, não há que se falar em ressarcimento dos valores pagos ao requeridos nomeados a título de remuneração”, pontuou o magistrado.
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“Por fim, importante destacar que nada impede que o requerente ou o Ministério Público Estadual solicitem informações junto às autoridades competentes para apurar sobre a existência de nepotismo cruzado, o que não foi objeto de exame nesta sentença”, destacou, deixando claro que houve limitação na análise.
A 5ª Cãmara Cível do TJMS impediu o cruzamento de informações de funcionários comissionados com autoridades do TCE, Assembleia Legislativa, Tribunal de Justiça, Câmara dos Deputados e Governo do Estado. Além de suspender a devassa nos órgãos públicos, o TJMS deixou claro que o juiz não poderia analisar o nepotismo cruzado.
Contratação de parentes é fato incontroverso
“É incontroverso que os requeridos ocupam ou ocuparam cargos comissionados ou funções de confiança no Tribunal de Contas do estado de Mato Grosso do Sul e que possuem algum grau de parentesco com outras autoridades do referido órgão ou de outros órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário estadual ou federal”, afirmou Corrêa.
“Ocorre que em acórdão proferido pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça deste estado em agravo de instrumento interposto de decisão proferida relativa à produção de determinadas provas foi estabelecido como limite objetivo da lide a configuração (ou não) apenas do nepotismo direto, como se vê às fls. 1.334-63, não cabendo mais, portanto, o exame da ocorrência de nepotismo cruzado na hipótese”, lamentou o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa.
“Ademais, é frustrante e desestimulante para qualquer cidadão, especialmente aqueles que têm mais dificuldades que outros, que o acesso a cargo público se dê por mera indicação política ou por meio de apadrinhamento, bem como para aquele que ocupa cargo público mediante concurso e vê cargos mais relevantes na administração pública serem ocupados por pessoas que pouco ou nada conhecem de determinada pasta ou matéria, algo que infelizmente ainda ocorre, apesar dos avanços obtidos com a Constituição Federal de 1988”, afirmou.
“É lamentável que algumas nomeações ou designações ainda atendam tão somente a critérios políticos, troca de favores ou nepotismo, hipóteses que traduzem desvio de finalidade, situações que ocorrem nas diversas esferas e níveis de poder”, alfinetou o magistrado.
“No que se refere especificamente ao nepotismo, ocorre quando um agente público usa de sua posição de poder para nomear, contratar ou favorecer um ou mais parentes até certo grau, sendo vedado pela Constituição Federal por contrariar os princípios da impessoalidade, da moralidade e da igualdade”, observou.
Esposas de desembargadores
Esposas de dois ex-presidentes do TJMS poderiam ser condenadas por nepotismo cruzado. Isabel Cristiane Loureiro de Almeida é casada com o desembargador João Maria Lós, enquanto Luzia Helena Bernardes AL Contar é cônjuge do desembargador Carlos Eduardo Contar. Viviane Amendôla da Motta é filha da então secretária estadual de Educação, Maria Cecília Amendôla da Motta.
Filho do então secretário de Fazenda e atual conselheiro do TCE, Fábio Alves Monteiro foi chefe de gabinete da conselheira Marisa Serrano, que também é parente, mas não é citada na ação. Nivaldo Cruz Barbosa é primo do conselheiro Waldir Neves Barbosa, mas alegou que era de 4º grau e a legislação proíbe até o 3º grau.
Diogo Midzuno Mishima é irmão de Thiago Haruo Mishima, que foi diretor da área de comunicação do Governo na gestão de Reinaldo Azambuja (PSDB). Rafael Coelho de Oliveira é filho de Jorge Martins de Oliveira, atual presidente da Ageprev.
Duas ex-mulheres de conselheiros foram citadas na denúncia. Alessandra Larreia Ximenes foi casada com Waldir Neves até dezembro de 2005 e foi promovida duas vezes pelo ex-marido em 2015. Judith Maria Grossl foi nomeada quando era casada com Ronaldo Chadid e ele era apenas procurador do Ministério Público de Contas. Quando ele virou conselheiro do TCE, o casal já estava separado.
Vivaldo Chagas da Cruz é cunhado do deputado federal Vander Loubet. Cristina Dias Dutra e Astolfo Dias Ferreira Dutra eram filhos do conselheiro Osmar Ferreira Dutra, que se aposentou em novembro de 2010.
As considerações do juiz
Alessandra Larreia Ximen
“Em relação à requerida Alessandra Larreia Ximenes, não se observa nepotismo direto em suas nomeações para os cargos comissionados que ocupou, pois, quando ela foi nomeada para o cargo em comissão de chefe da secretaria das sessões em março de 2015 e depois para o cargo de chefe II em maio de 2015, ela e o requerido Waldir Neves Barbosa não eram mais casadoshá quase 10 anos, conforme se vê no documento de fl. 420, e, como sabido, à luz do direito civil brasileiro (art. 1.519 do CC e seguintes), ex-cônjuges não são considerados parentes em linha reta, colateral ou afins, mas partes de um negócio jurídico bilateral de natureza especial cuja relação se extingue com o divórcio, sendo tal relação incapaz de configurar nepotismo direito no caso de nomeação de um deles para cargo comissionado ou função de confiança pelo outro”.
Diogo Midzuno Mishima
“Nesse contexto, observa-se que o fato do irmão do requerido Diogo Midzuno Mishima (Thiago Haruo Mishima) ocupar cargo em comissão de direção superior e assessoramento na secretaria de estado da Casa Civil de Mato Grosso do Sul não caracteriza nepotismo direto, uma vez que a autoridade responsável pela nomeação dele foi o requerido Waldir Neves Barbosa com o qual sequer se alegou na inicial haver qualquer grau de parentesco, não restando também demostrada a existência de tal vínculo durante o trâmite processual.”
Fábio Alves Monteiro
“Ocorre que o fato de ocupar o pai do requerido Fábio Alves Monteiro, Márcio Campo Monteiro, o cargo de secretário de estado de Fazenda de Mato Grosso do Sul não caracteriza, por si só, nepotismo direto, levando em conta, mais uma vez, o limite objetivo da lide fixado pelo Tribunal de Justiça deste Estado, na medida em que a autoridade responsável pela nomeação do requerido Fábio Alves Monteiro foi o conselheiro Cícero Antônio de Souza e também não foi alegado ou demonstrado qualquer grau de parentesco entre eles.”
Luiza Helena Bernades Al Contar
“Embora a requerida Luiza Helena Bernardes Al Contar seja casada com desembargador do Tribunal de Justiça deste estado e tenha sido nomeada para um cargo em comissão no Tribunal de Contas do Estado, tal situação não configura isoladamente nepotismo direto, na medida em que, além de se tratarem de órgãos distintos, a nomeação foi realizada pelo conselheiro Cícero Antônio de Souza com quem não foi alegada e demonstrada qualquer relação de parentesco.”
Nivaldo Cruz Barbosa
“De outro lado, os requeridos Nivaldo Cruz Barbosa e Waldir Neves Barbosa sustentaram em suas respectivas defesas que possuem relação de parentesco colateral de 4º grau, sendo primos, o que não foi impugnado pelo requerente, sendo que tal vínculo (parentesco colateral de 4ºgrau) não impede a nomeação, pois, como sabido, a restrição se aplica até o 3ºgrau.”
Viviane Amendola da Motta
“A simples existência de um vínculo de parentesco entre a nomeada e uma autoridade pública de outro órgão, contudo, não é suficiente para caracterizar o nepotismo direto, levando em conta, mais uma vez, o limite objetivo da lide fixado pelo Tribunal de Justiça deste Estado, especialmente porque não foi alegada nem comprovada a relação de parentesco da nomeada com a autoridade nomeante. Com efeito, o fato de a requerida Viviane Amendola da Motta ser filha de Maria Cecília Amendola da Motta, secretária estadual de Educação de Mato Grosso do Sul, não caracteriza nepotismo direto, na medida que a autoridade responsável pela nomeação foi o requerido Waldir Neves Barbosa com quem, repita-se, não foi alegada e demonstrada qualquer relação de parentesco.”
Isabel Cristiane Loureiro
“A requerida Isabel Cristiane Loureiro foi nomeada pelo conselheiro Cícero Antonio de Souza por meio da Portaria “P” TC/MS n.°102/2012 publicada no diário oficial TC n.° 492, de 21.06.2012, para exercer o cargo em comissão de assessor técnico em informática, símbolo TCAS-2034, da 4ª inspetoria de controle externo (fl. 57). Embora a requerida seja casada com o desembargador do Tribunal de Justiça e tenha sido nomeada para um cargo em comissão no Tribunal de Contas do Estado, tal situação, reitere-se, não configura nepotismo direto, na medida em que, além de se tratarem de órgãos distintos, a nomeação foi realizada pelo conselheiro Cícero Antônio de Souza com quem não foi alegada e demonstrada qualquer relação de parentesco.”
Vivaldo Chagas da Cruz
“Examinando-se autos, verifica-se que o requerido Vivaldo Chagas da Cruz foi nomeado pelo conselheiro Cícero Antônio de Souza por meio da Portaria “P” TC/MS n.° 134/2010 publicada no diário oficial TC n.°0098, de 02.06.2010, para exercer o cargo em comissão de assessor de conselheiro, símbolo TCAS-203 (fl. 69), mas, embora o requerido Vivaldo Chagas da Cruz seja cunhado de deputado federal, tal circunstância, repita-se, não configura, por si só, nepotismo direto, pois, além de se tratarem de órgãos distintos de vinculação, a nomeação foi realizada pelo conselheiro Cícero Antônio de Souza com quem não foi alegada nem demonstrada qualquer relação de parentesco.”
Judite Maria Grossl
“Ainda que a requerida Judite Maria Grossl tenha sido casada com o conselheiro Ronaldo Chadid, no período em que foi nomeada seu ex-cônjuge não exercia a função de conselheiro do Tribunal de Contas, mas a de procurador do Ministério Público de Contas (fls. 1.188), órgão distinto daquele em que a nomeação ocorreu, de modo que não se configura na hipótese o nepotismo direto, uma vez que a nomeação foi realizada pelo conselheiro Horácio Cerzosimo de Souza com relação a quem não foi aventada nem demonstrada qualquer vínculo de parentesco.”
Rafael Coelho Oliveira
“O requerido Rafael Coelho Oliveira foi nomeado pelo conselheiro Cícero Antônio de Souza por meio da Portaria n.° 189/2009publicada no diário oficial n.° 7.517, de 07.08.2009, para exercer o cargo de assessor técnico de informática (fl. 46), mas o fato de seu pai, Jorge Oliveira Martins, ocupar na época o cargo de diretor presidente da AGEPREV/MS não caracteriza nepotismo direto, tendo em vista que a autoridade responsável pela nomeação do requerido foi o conselheiro Cícero Antônio de Souza e não foi alegado e demonstrado qualquer grau de parentesco entre eles.”