O empresário Jaime Valler, dono do curtume Qually Peles e do jornal O Estado de Mato Grosso do Sul, foi condenado à pena de dois anos de detenção no regime aberto, que foi convertida em prestação de serviços à comunidade e multa de R$ 76 mil. A sentença é do juiz Eduardo Eugênio Siravegna Junior, da 2ª Vara Criminal de Campo Grande, publicada no último dia 22 de janeiro.
O Ministério Público Estadual denunciou Valler, seu filho Jaime Valler Filho e Fabio Rogério de Rocco pelos crimes de poluição que pode resultar em danos à saúde humana ou à natureza, descarte irregular de resíduos e obstruir fiscalização. Os dois outros réus, no entanto, foram absolvidos de todas as acusações.
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Narra a denúncia que no dia 1º de junho de 2017, na Fazenda Palmeira, zona rural da Capital, e no dia 16 de março de 2018, na Fazenda Baunilha (Grama Pontal), também fora da zona urbana, os réus causaram poluição em níveis que poderiam resultar em danos à saúde humana, por terem lançado resíduos líquidos da indústria nas áreas de pastagens dessas propriedades, sem autorização do órgão ambiental e contrariando a lei.
O curtume Qually Peles está localizado no Núcleo Industrial e está autorizado a fazer o descarte de lodo proveniente de seu processo industrial apenas na Fazenda Ceroula. Segundo o MPE, o material descartado poderia conter cromo e outras substâncias perigosas de alto poder contaminante que são prejudiciais à saúde.
A Prefeitura de Campo Grande havia multado o curtume pelo lançamento de lodo biológico sem a devida autorização. Os agentes ambientais, entretanto, não levantaram a possibilidade de que o resíduo pudesse estar contaminado com substância em níveis prejudiciais à saúde (cromo), pois a empresa acusada estava autorizada a realizar fertirrigação em área distinta.
Como a Qually Peles era autorizada a fazer o descarte na natureza, e foi multada apenas pelo despejo em local não autorizado, a conclusão é de que de que o lodo biológico proveniente de sua atividade, em tese, era desprovido de contaminante em nível capaz de prejudicar a saúde humana ou o meio ambiente. O Ministério Público Estadual não conseguiu comprovar o contrário.
“Neste cenário, constata-se a existência de fundada dúvida acerca de elemento essencial do tipo penal, qual seja, que a poluição atribuída aos acusados tenha alcançado nível capaz de resultar ou que pudesse resultar em danos à saúde humana, mortandade de animais ou destruição significativa da flora, inviabilizando o acolhimento da pretensão condenatória em apreço”, concluiu o juiz juiz Eduardo Eugênio Siravegna Junior.
Desta maneira, Jaime Valler, seu filho, e outro réu foram absolvidos do crime de poluição. O dono do curtume, no entanto, foi considerado culpado pelo descarte do Iodo em local não autorizado e a Qually Peles ficou responsável pelo pagamento de multa por obstruir a fiscalização.
“No ponto, à luz dos elementos de prova trazidos aos autos, não há dúvida acerca do fato de a empresa acusada ter realizado o lançamento do referido material nas datas e imóveis indicados, restando esclarecer a efetiva participação e/ou ciência dos demais acusados sobre a decisão que determinou tal destinação; e se a empresa acusada estava autorizada pelo órgão ambiental a efetivar a fertirrigação nos referidos imóveis”, relatou o magistrado.
Apesar de ficar constatada a culpa da empresa, apenas Jaime Valler foi responsabilizado, pois não ficou comprovada a participação dos outros dois réus e apenas o patriarca detinha o poder de comando para a decisão.
“Assim sendo, conclui-se que a autoria delitiva atribuída aos acusados Jaime Valler e Qually Peles LTDA restou demonstrada nos autos, razão pela qual sobre esses devem recair as sanções decorrentes da prática do crime previsto no art. 68 da Lei dos Crimes Ambientais. Por outro lado, os acusados Jaime Valler Filho e Fábio Rogério de Rocco, ante a fundada dúvida acerca da autoria que lhes é atribuída, devem ser absolvidos em homenagem ao princípio constitucional da presunção de não culpabilidade (in dubio pro reo)”, concluiu o juiz.
O Ministério Público Estadual ainda apontou a Qually Peles teria obstruído a ação fiscalizadora do órgão ambiental ao impedir o acesso dos fiscais ambientais, no dia 09 de agosto de 2017, ao interior de seu estabelecimento. As agentes fiscais ouvidas em juízo confirmaram o caso.
O juiz da 2ª Vara Criminal de Campo Grande considerou que não foi comprovado o envolvimento de um dos réus na obstrução, por isso, somente a empresa terá de arcar com a responsabilização pelo crime.
A sentença de Jaime Valler foi fixada em dois anos de detenção, no regime aberto, e 20 dias-multa, substituída pela prestação de serviços à comunidade pelo mesmo período da pena e pagamento de 50 salários mínimos, o que resulta em R$ 76 mil.
A Qually Peles, por sua vez, terá de pagar 10 dias-multa, cada unidade representa 10 vezes o salário mínimo vigente à época dos crimes.
A sentença foi publicada no Diário Oficial do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul de 22 de janeiro. Os condenados podem recorrer da sentença.