Ex-diretor da Ceasa (Centrais de Abastecimento de Mato Grosso do Sul), Eder Ney Rodrigues Caxias e um funcionário prestador de serviços foram condenados em ação de improbidade administrativa por enriquecimento ilícito graças a cobrança de propina e outras ilegalidades. A sentença apontou danos aos cofres públicos no total de R$ 451.823,89, além de ganhos ilegais de R$ 294 mil, que terão de ser reembolsados pelos sentenciados.
A denúncia do Ministério Público Estadual apresentou provas de que Eder Ney Caxias e Ricardo Fagundes Malta cobravam propina de comerciantes o pagamento de taxa para permitir o uso clandestino de energia elétrica custeada pela Ceasa, o popular “gato”, e na liberação de áreas comerciais dentro da central de abastecimento. O ex-diretor também foi acusado de abastecer seu veículo e de familiares com dinheiro da central de abastecimento, além de receber valores desproporcionais à sua renda enquanto servidor.
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Os crimes aconteceram entre 2016 e 2018. Os réus, atuando em conluio, cobravam dos permissionários o pagamento de uma “taxa” para utilizarem de forma clandestina energia elétrica custeada pela Ceasa por um período pré-determinado, sendo que os respectivos valores eram embolsados por eles (vantagem indevida) e não repassados ao órgão, o que causou um prejuízo ao erário pelo desvio da energia elétrica estimado em R$ 449.023,89 em um período de 24 meses.
Em juízo, uma testemunha afirmou que efetuou pagamento de R$ 3.900,00 para Ricardo a fim de ter acesso ao “gato” de energia elétrica, e apresentou como prova a nota fiscal da transação financeira. Outra testemunha pagou R$ 10 mil, sendo parte do valor destinado ao custeio da mão de obra e materiais e parte para adimplemento da chamada “provisória”, que era a ligação direta à rede da Ceasa para utilização da energia custeada pela entidade.
As Centrais de Abastecimento de MS são uma sociedade de economia mista, vinculada administrativamente à Agraer (Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural do Estado). Uma diretora do órgão confirmou as fraudes denunciadas pelos permissionários e confirmou a situação em juízo. Até a Energisa atestou a ocorrência de “gatos” no local, num total de nove ligações irregulares.
Eder Ney Caxias e Ricardo Fagundes Malta negaram todas as acusações. O prestador de serviços alegou em sua defesa que os valores lhe foram repassados a título de pagamento pelos serviços que realizou na condição de eletricista, mas a justificativa não convenceu o juiz. “A versão por ele apresentada não convence, pois as quantias adimplidas (R$ 3.990,00 e R$ 10.072,00) são flagrantemente desproporcionais a tantos outros serviços realizados por outros eletricistas no local”, diz a sentença.
Para o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, ficou comprovado o dolo, ou seja, a intenção de cometer o crime por parte dos acusados.
“Como se vê, portanto, o conjunto probatório formado nos autos converge no sentido da existência da referida cobrança indevida feita pelos requeridos para uso da energia custeada pela CEASA (pelos permissionários) e, como consequência, do dolo deles na prática do respectivo ato de improbidade administrativa, haja vista que dirigiam suas ações no intuito de atingir o objetivo de se enriquecerem ilicitamente recebendo valores pelo uso da energia que seria paga pela referida pessoa jurídica (art. 9º da Lei nº 8.429/1992), agindo o particular (requerido Ricardo Fagundes Malta) em concorrência com o servidor público (requerido Éder Ney Rodrigues Caxias)”, definiu.
“É importante ainda acrescentar sobre este tema que os valores pagos pelos permissionários a título de “provisória” para utilização da energia custeada pela CEASA nunca entraram nas contas da referida pessoa jurídica, conforme atestado pela entidade”, salientou.
Propina para usar espaços na Ceasa
A denúncia apontou que um permissionário teria solicitado o uso de um boxe da Ceasa que estava vazio, o qual lhe foi concedido mediante o pagamento de uma taxa inicial de R$ 16 mil. Para tanto, foi emitido um boleto contendo somente o valor parcial de R$ 9 mil e o restante de R$ 7 mil requisitado por Éder Ney Caxias seria em cheque, que acabou sendo embolsado pelo então diretor.
“De igual modo, restou demonstrada nos autos a propalada apropriação de valores pertencentes à CEASA pelo requerido Éder Ney Rodrigues Caxias”, afirmou o magistrado.
Quebra do sigilo bancário de Éder Ney mostrou que ele realizou, na mesma data do pagamento, depósitos de variados valores no montante total de R$ 6 mil em três contas diferentes de sua titularidade. Em outro caso, houve a cobrança de R$ 500.
“Sobre o dolo específico dos requeridos para cometimento do ato de improbidade administrativa alhures apontado, revela-se na própria atuação deles de pressionarem os permissionários a efetuaram pagamentos indevidos em benefício deles, valendo-se para tanto da influência decorrente do cargo que um deles (requerido Éder Ney Rodrigues) ocupava”, fundamenta o juiz.
Também houve desvio através de compra de materiais por parte do ex-direto Éder Ney Caxias. A entrega de produtos, no valor de R$ 2.800,00, em município fora de Campo Grande entregou o delito.
Abastecimento de carro particular e enriquecimento ilícito
Éder Ney Rodrigues Caxias também foi denunciado por ato de improbidade que importa em enriquecimento ilícito ao efetuar o abastecimento e a manutenção de veículo particular às custas da Ceasa. Documentos comprovaram gastos de R$ 147,66 em gastos com combustíveis para ele e sua filha.
“Descabida sua defesa no sentido de que efetuou os abastecimentos nos apontados veículos porque precisava prestar serviços externos em benefício da CEASA, haja vista que referida entidade possuía veículos que poderiam ser utilizados para essa finalidade, como se vê às fls. 472-3. Ademais, não há qualquer indício nos autos da impossibilidade de utilização dos veículos oficiais, o que reforça a conclusão alhures apontada”, rebateu o juiz à alegação da defesa do ex-diretor.
A última parte da denúncia diz respeito ao enriquecimento ilícito de Éder Ney Rodrigues revelado na quebra de seu sigilo bancário. Foi verificado que ele recebeu dinheiro, via crédito bancário, cujo valor é desproporcional à sua renda de agente público regularmente declarada ao fisco.
“A derradeira acusação contra o requerido Éder Ney Rodrigues Caxias merece acolhimento, uma vez que a prova produzida nos autos é mais que suficiente para se chegar à conclusão de que ele praticou o ato de improbidade que lhe é apontado pelo requerente”, diz o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa.
Um funcionário da Ceasa foi “enfático” ao relatar que no período de dois anos o ex-diretor demonstrou uma vertiginosa evolução patrimonial (em que pese o valor módico de seu salário que girava em torno de R$ 3.700,00 bruto), uma vez que adquiriu uma série de bens no período. O relato foi confirmado pelas provas apresentadas pelo Ministério Público Estadual.
“…, após analise contábil-financeira dos referidos documentos, que houve uma quantidade expressiva de crédito na conta do mencionado requerido (R$ 269.634,82) sem qualquer referência acerca da origem, o que indica sem sombra de dúvidas que o recebimento dos valores tem como causa a atuação dele no cargo de gerência que ocupava junto à CEASA, conforme visto nos parágrafos anteriores”, informou o magistrado.
O ex-diretor Éder Ney Rodrigues Caxias não conseguiu comprovar a origem da sua evolução patrimonial.
Sentença
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa sentenciou Éder Ney Rodrigues Caxias e Ricardo Fagundes Malta a perda dos valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio deles (R$ 269.782,48 do primeiro e R$ 25.955,99 do segundo); o ex-diretor deve perder qualquer função pública que esteja exercendo na ocasião do trânsito em julgado; suspensão dos direitos políticos de ambos pelo prazo máximo de 10 anos; e pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial indevido de cada um.
Os condenados também devem ressarcir os cofres públicos no montante de R$ 451.823,89, com juros e correção monetária e estão proibidos de de receberem benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo máximo de 10 anos.
A sentença foi assinada em 19 de dezembro e publicada no Diário Oficial do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul desta quinta-feira, 9 de janeiro. Os réus ainda podem recorrer.