O Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul teve um gasto extra de R$ 29,2 milhões após o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) autorizar o pagamento de licença-compensatória, que transforma folga em dinheiro, a magistrados. Em todo País, 35 tribunais repassaram valores que aumentaram os contracheques de 8.736 juízes, desembargadores e ministros.
Segundo relatório da Transparência Brasil, o novo penduricalho garantiu, em média, R$ 12,4 mil por mês aos integrantes do Judiciário. O custo total foi de R$ 819 milhões entre julho de 2023 e outubro de 2024. Em MS, o benefício ganhou forma em abril do ano passado, quando o TJ enviou à Assembleia Legislativa o Projeto de Lei nº 97/2023.
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Assinada pelo atual presidente, desembargador Sérgio Fernandes Martins, a proposta criava a licença-compensatória como alternativa à gratificação por exercício cumulativo, sob a justificativa de que a instituição em dias de folga iria “economizar recursos ao erário”, por instituir uma “forma não pecuniária” do benefício, relata a Transparência Brasil.
Um mês e cinco dias após apresentado, o projeto foi aprovado em dois turnos pelos deputados e sancionado pelo o governador Eduardo Riedel (PSDB) sob a lei estadual nº 6.053/23.
No mês seguinte, o TJMS baixou a resolução nº 291/23, permitindo a conversão da folga em “pecúnia”, o bom e velho dinheiro. A manobra, que segundo o Judiciário estadual era benéfica ao erário, já custou ao menos R$ 29,2 milhões até outubro de 2024, conforme levantamento do projeto DadosJusBr, da Transparência Brasil.
No Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região, com sede em Campo Grande e que possui jurisdição em todo o Estado, foram R$ 6,9 milhões pagos com o benefício aos seus magistrados.
O relatório sistematiza e disponibiliza R$ 144 bilhões em contracheques do Judiciário e Ministério Público. Os pagamentos foram realizados tanto na esfera federal, totalizando R$ 415 milhões, quanto na estadual, com R$ 404 milhões desembolsados, em 10 tribunais.
Durante o período analisado, 870 magistrados ganharam acima de R$ 100 mil. Ao todo, pelo menos 4.200 magistrados já receberam mais de R$ 100 mil com a licença-compensatória. O servidor que recebeu o valor mais alto foi um desembargador de Pernambuco, que teve um adicional de R$ 313,2 mil no seu contracheque, em 16 meses.
A origem da licença-compensatória vem do penduricalho à “gratificação por exercício cumulativo”, que oferece um adicional de 1/3 do salário para integrantes do judiciário que acumulem funções por mais de 30 dias. Anteriormente, o pagamento tinha uma natureza remuneratória e por isso estava sujeito ao teto do funcionalismo público, de R$ 44.000.
Ao jornal O Estado de S. Paulo, o CNJ afirmou que “apenas reconheceu o que a Constituição Federal já prevê” e que “os direitos e deveres validamente atribuídos aos membros da magistratura ou do Ministério Público aplicam-se aos integrantes de ambas as carreiras, no que couber”.
Escândalo de venda de sentenças
Responsável pelo projeto que garantiu o novo penduricalho em Mato Grosso do Sul, o presidente do Tribunal de Justiça, desembargador Sérgio Fernandes Martins, foi alvo da Operação Ultima Ratio, deflagrada pela Polícia Federal para investigar venda e direcionamento de sentenças no TJMS.
Além de Martins, foram afastados e monitorados por tornozeleira eletrônica mais quatro desembargadores: Alexandre Bastos, Marcos José de Brito Rodrigues, Sideni Soncini Pimentel e Vladimir Abreu da Silva.
O ministro Cristiano Zanin, do Supremo Tribunal Federal, acatou pedido da defesa e determinou o retorno do desembargador Sérgio Fernandes Martins ao cargo de presidente do TJMS no início da semana passada.
Dias depois, Zanin suspendeu o monitoramento eletrônico, mas manteve o afastamento do cargo e determinou a entrega do passaporte dos outros quatro desembargadores investigados por venda de sentença, corrupção e organização criminosa.
Sideni Soncini Pimentel (eleito presidente para o próximo biênio), Vladimir Abreu da Silva (eleito vice-presidente), Marcos José de Brito Rodrigues (então ouvidor judiciário) e Alexandre Bastos continuam proibidos de manter contato com servidores e investigados e ainda serão obrigados a entregar o passaporte para evitar fuga do País.
O afastamento dos cinco desembargadores e o monitoramento eletrônico foi determinado pelo ministro Francisco Falcão, do Superior Tribunal de Justiça. No entanto, como houve a citação de assessores de ministros do STJ, o processo foi para o STF.