Os ex-presidentes do Tribunal de Contas do Estado, conselheiro Cícero de Souza (aposentado) e Waldir Neves Barbosa, vão a julgamento no dia 12 de fevereiro de 2025, a partir das 14h, pelo suposto desvio de R$ 19,378 milhões por meio do contrato de limpeza com uma empresa sem sede. A audiência de instrução foi marcada pelo juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, conforme despacho publicado nesta segunda-feira (2).
O processo é mais um para contribuir com o inferno astral de Waldir Neves, afastado do cargo e monitorado por tornozeleira eletrônica há quase dois anos – desde 8 de dezembro de 2022. Ele foi denunciado no Superior Tribunal de Justiça e segue sob investigação da Polícia Federal após ser alvo das Operações Mineração de Ouro, de junho de 2021, e Terceirização de Ouro, de dezembro de 2022.
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O julgamento por improbidade pode levar à condenação dos réus, que inclui o espólio do conselheiro José Ancelmo dos Santos (morto em decorrência da covid-19), ao pagamento de R$ 58 milhões, o que inclui o ressarcimento dos R$ 19,378 milhões corrigidos e multa civil de R$ 38,7 milhões, sem considerar o valor da indenização por danos morais a ser fixado pelo juízo. Ainda podem perder a função pública e ter os direitos políticos suspensos por até oito anos.
O promotor Adriano Lobo Viana de Resende denunciou o trio pelo superfaturamento de R$ 3,443 milhões entre 2003 e 2010, o pagamento de R$ 14,812 milhões para apoio administrativo, atividade que não estava prevista no contrato. Também houve o pagamento de R$ 1,035 milhão por notas fiscais vencidas e R$ 82,2 mil de notas de terceiros.
De acordo com a ação de improbidade, a Limpamesmo Conservação e Limpeza, em nome da viúva Eliete Silva, assinou o contrato em janeiro de 2003. Apesar do valor do contrato ser superior a R$ 1 milhão, o TCE, na gestão de José Ancelmo, adotou a modalidade carta convite, para valores de até R$ 80 mil. O contrato foi sendo prorrogado e sofrendo reajustes até passar de R$ 32,3 mil para R$ 136,4 mil por mês.
“Em verdade, em que pese aquela simplória carta convite, os requeridos mantiveram a contratação da Limpamesmo por mais de 13 anos, com valores milionários, que aumentaram exponencialmente durante a vigência, sem amparo legal ou qualquer justificativa plausível, gerando lesão ao erário”, apontou o promotor Adriano Lobo. A empresa recebeu R$ 47,951 milhões.
Sem foro especial
A defesa dos conselheiros pediu para o magistrado rejeitar a denúncia porque eles teriam direito a foro privilegiado e só poderiam ser denunciados pelo procurador-geral de Justiça. No entanto, eles foram denunciados quando já estavam fora do cargo.
“A preliminar de ilegitimidade ativa suscitada pelos requeridos Cícero Antônio de Souza, José Ancelmo dos Santos e Waldir Neves Barbosa em manifestação por escrito (fls. 3. 615-7), não merece acolhimento, pois a atribuição do Procurador-Geral de Justiça deste Estado para ajuizamento de ação civil pública se limita aos casos em que a autoridade reclamada for o Presidente do Tribunal de Contas, conforme se extrai da literalidade do artigo 30, XII, da Lei Complementar Estadual nº 72/1994, o que não é o caso dos autos, haja vista que quando do ajuizamento desta ação os requeridos não se encontravam mais ocupando referido cargo na administração superior do respectivo órgão”, rebateu o magistrado.
Eles também argumentaram que houve um acordo com o MPE sobre o contrato. “A preliminar de falta de interesse processual arguida em contestação pelos requeridos Cícero Antônio de Souza e Waldir Neves Barbosa (fls. 3.890-3) e que tem amparo na alegação de que as matérias discutidas nos autos foram objetos de TAC, obviamente não merece guarida, uma vez que o TAC formalizado entre o Tribunal de Contas Estadual e o Ministério Público Estadual para que o primeiro órgão não efetuasse mais contratação terceirizada de mão de obra para prestação de serviços em sua atividade-fim (fls. 3.651-7) em nada se confunde com o objeto da presente ação, que se volta contra suposto ato de improbidade por fraude na licitação que deu azo ao contrato nº 001/2003, processo TCAF/MS-00020/2003, cujo objeto era a execução de serviços de conservação e limpeza e por meio do qual foram realizados pagamentos supostamente indevidos em detrimento do erário”, explicou Corrêa.
Pontos a esclarecer
O juiz elencou os pontos que deverão ser esclarecidos na audiência de instrução e julgamento:
- se houve alteração do preço originalmente estabelecido no instrumento licitatório, resultando em um sobrepreço de 21,62%, superfaturamento do contrato com aplicação de reajustes sem justificativa dos percentuais utilizados, pagamento de valores estranhos ao objeto do contrato, violação à preservação da modalidade licitatória pertinente à integralidade do objeto, pagamento de notas fiscais vencidas e notas fiscais de terceiros estranhos ao contrato;
- se os requeridos agiram com dolo;
- se houve o dano ao erário indicado na inicial;
- se restaram configurados os atos de improbidade administrativa que foram imputados aos requeridos, admitindo-se como meios de prova os documentos que instruem os autos e a oitiva de testemunhas.
Os réus e o MPE deverão indicar as testemunhas que vão depor na audiência marcada para fevereiro. O julgamento será presencial na 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos.
O advogado de defesa, André Borges, destacou que vai insistir na tese de que não houve irregularidade e que houve o Termo de Ajustamento de Conduta com o MPE. “Caso desse processo foi objeto de acordo entre TCE e MP. Defesa irá insistir na extinção”, avisou o defensor.