A Justiça Federal manteve o recebimento da denúncia contra o empresário Ivanildo da Cunha Miranda por ter ocultado da declaração de seu imposto de renda o valor recebido do frigorífico JBS entre 2013 e 2017. A dívida somava R$ 13 milhões em atualização até novembro de 2018, incluindo juros e multa. O pecuarista é apontado como operador da suposta propina paga pelos irmãos Wesley e Joesley Batista ao ex-governador André Puccinelli (MDB).
Conforme a denúncia do Ministério Público Federal, baseada em informações da Receita Federal, Ivanildo teria suprimido imposto de renda de pessoa física (IRPF) mediante apresentação de informações falsas ao Fisco e omissão de informações sobre rendimentos tributáveis. Segundo a representação fiscal para fins penais, o crédito fiscal somava R$ 13.157.730,80
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Em delação premiada homologada pelo Judiciário, Ivanildo Miranda incluiu Puccinelli e contribuiu para desencadear uma das fases da operação Lama Asfáltica que levou o emedebista a ser preso. Os nomes de André e do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB) são citados na decisão da 3ª Vara Federal de Campo Grande que mantém o recebimento da denúncia pela sonegação, originalmente aceita em 30 de agosto de 2023.
“A auditoria, após inúmeras evidências que serão a seguir detalhadas, caracterizou I. D. C. M., como operador financeiro de repasses pelo Grupo JBS. Esses repasses sustentaram esquema fraudulento de pagamentos de vantagens indevidas envolvendo o Grupo JBS e o grupos políticos do governo do Mato Grosso do Sul, em período que engloba o período auditado em face do contribuinte (2012 a 2016), representados pelos governadores André Puccinelli e Reinaldo Azambuja. Tal prática era rotineira no estado do Mato Grosso do Sul, conforme passamos a detalhar”, contextualiza a decisão.
A delação de Ivanildo foi homologada em julho de 2017. A sonegação fiscal descrita pela acusação diz respeito a condutas e eventos preexistentes à colaboração premiada, porém, não foram relatadas ou declaradas pelo empresário, supostamente incorrendo em proposital omissão, diz o juízo da 3ª Vara Federal.
O MPF informou que Ivanildo fez a retificação de suas declarações de IRPF no dia 24 de setembro de 2017, posteriormente à assinatura do acordo e entrega de cópia de suas declarações fiscais ao Ministério Público como parte do acordo. Foram incluídos o recebimento de R$ 12 milhões pagos pela JBS.
“Aqui cumpre destacar que mesmo ciente de que estava com toda sua movimentação financeira demandada para auditoria, para verificação de eventuais irregularidades fiscais, IVANILDO apresentou no mesmo dia 24/09/2017, Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física – Retificadoras para os anos calendários de 2012, 2013 e 2014, de forma assim não mais espontânea, sendo que basicamente as retificações envolveram a inclusão de R$ 12.000.000,00, acrescentados como recebidos de PJ, com indicação da fonte pagadora J & F PARTICIPACOES S/A, CNPJ 00.350.763/0001-62”, relata a decisão da Justiça Federal.
“Cabe também reforçar o comentário, já explanado no início, de que as DIRPFs Retificadoras, relativas aos anos calendário, foram entregues em 24/09/2017 de forma não espontânea, uma vez que o contribuinte já vinha sendo diligenciado nesses anos calendários, inclusive com demanda pretérita para apresentação de toda sua movimentação financeira de 2012 a 2014, deixando de forma inequívoca a ciência ao contribuinte que a finalidade era a verificação de sua participação no imbróglio envolvendo o Grupo JBS, já que o mesmo estava citado nas delações desse grupo econômico”, prossegue.
O juízo, porém, afirma que “ficou claro” no curso do procedimento fiscal que o valor total de R$ 12 milhões lançados nos anos calendários, como sendo recebido da J&F, “simplesmente foram alocados sem quaisquer comprovações quando demanda a documentação hábil e idônea comprobatória, em que o contribuinte após muitas intimações assumiu que de fato não possui o controle do recebimento dos valores que eram repassados pelo Grupo”.
“Assim além de não espontâneo, em nenhum momento tais valores se revestiram de veracidade, não havendo correspondência com os valores levantados pontualmente a partir da delação do grupo JBS, fonte pagadora dos valores”.
A decisão aponta que as retificações “não merecem sequer ser levadas em conta”, pois “fica claro” que Ivanildo às informou quando se viu já em meio de auditoria plena da verificação de omissões de rendimentos para os anos calendários entre 2012 e 2016.
Para justificar o recebimento de parte dos R$ 12 milhões, o pecuarista diz ser “comissões” de intermediação de negócios, mas não houve comprovação com documentos.
Operação Vostok
Para tentar escapar da ação penal por sonegação, a defesa de Ivanildo da Cunha Miranda pediu que fossem observados os benefícios do acordo de colaboração premiada e determinada a impossibilidade de sua utilização como meio de prova. Que fosse declarada a nulidade do auto de representação fiscal para fins penais.
Além disso, solicitou a suspensão da ação penal até o julgamento definitivo dos embargos à execução que serão apresentados em apenso à execução fiscal em trâmite na 6ª Vara Federal de Campo Grande e até o julgamento definitivo da ação penal em trâmite perante a 2ª Vara Criminal da Capital sobre a Operação Vostok.
No mérito, a defesa alega que inexistem elementos externos às próprias colaborações para subsidiar a ação penal.
O juízo rejeitou as alegações e os pedidos, mas aceitou suspender por seis meses a ação penal e do prazo prescricional para verificar a situação da execução fiscal em trâmite na 6ª Vara Federal. Com relação à Vostok, que envolve o pagamento de propina de R$ 67,7 milhões a Reinaldo Azambuja, o magistrado decidiu que a ação penal em trâmite na Justiça de Mato Grosso do Sul não interfere no processo de sonegação.
A decisão foi publicada no Diário Oficial Eletrônico da Justiça Federal desta segunda-feira, 30 de setembro.