A ação popular que aponta suposta negociata para indicação da ex-deputada estadual Celina Martins Jallad (já falecida) ao cargo de conselheira do Tribunal de Contas do Estado ganhou novo capítulo com contornos de briga familiar. A defesa da família Jallad acusa o autor do processo, o advogado Enio Martins Murad, de ingratidão, revanchismo, extorsão com suposto pedido de R$ 300 mil, e tentativa de macular o nome de uma das mulheres ícones da história de Mato Grosso do Sul.
Após o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos de Campo Grande, aceitar a petição, a defesa de Abdalla Jallad, atualmente desembargador aposentado do TRT-MS (Tribunal Regional do Trabalho), viúvo de Celina, e os filhos dela, Wilson Martins Jallad e Fabiana Martins Jallad, apresentou a contestação à acusação.
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Na ação, o advogado Enio Murad sustenta que Abdalla Jallad, quando presidiu o TRT-MS, proferiu decisão ilícita para favorecimento da empresa JBS, gigante do setor de alimentos. Em troca desse “ato ilegal”, recebeu a nomeação de sua falecida esposa Celina Martins Jallad no cargo de conselheira do Tribunal de Contas do Estado.
A denúncia se ancora em depoimento do procurador federal do Trabalho Paulo Douglas de Almeida, confira mais detalhes clicando aqui.
A contestação da família Jallad, apresentada em 4 de setembro, começa informando que Celina Martins Jallad e Enio Martins Murad são primos. E que a disputa judicial é resultado de ingratidão, revanchismo, e até extorsão, supostamente evidenciada em mensagens de áudio “nas quais “ENIO” confessa que pretende receber valores pecuniários, sabidamente indevidos, de ‘ABDALLA’”.
“É importante dizer desde logo que ‘ENIO’, valendo-se do bom nome de sua prima, passou boa parte de sua vida se beneficiando desse parentesco, trabalhando na Assembleia Legislativa e no Tribunal de Contas do Estado de Mato Grosso do Sul, valendo-se do prestígio de sua prima ‘CELINA’, a quem agora, mentindo, se esforça para macular o nome e a memória”, diz a contestação formulada pelo advogado André de Carvalho Pagnoncelli.
“Embora tenha sido sempre acolhido como um estimado membro da família, inclusive participando da banca de advocacia da família, após o falecimento de ‘CELINA’, e sobretudo de uns anos para cá, ‘ENIO’ alterou o seu comportamento, para a surpresa de ‘ABDALLA’ e de seus filhos, revelando-se pessoa ingrata, gananciosa e desleal. Sabe-se que a ingratidão é o pior dos vícios que pode acometer a natureza humana”, prossegue o defensor.
André Pagnoncelli afirma que a denúncia “mais parece uma conversa de botequim, é a judicialização da fofoca. O relato não é sério. Os elementos não guardam conexão. Da narrativa, ou melhor, da tentativa de narrativa dos fatos não se chega a uma conclusão, tamanha a confusão e as fantasias que rondam a mente doentia do autor”.
A defesa atesta que o desembargador Abdalla Jallad “jamais proferiu qualquer decisão ilegal, muito menos em benefício da terceira pessoa citada na petição inicial. É tudo mentira, fantasia, enfim, pura maledicência”. O advogado aponta que o acusador alega que foi proferida uma decisão judicial ilícita para favorecer terceira pessoa, mas que esta sequer foi arrolada nos autos.
Outro ponto é que não foi anexado ao processo uma cópia da decisão supostamente ilegal que teria sido proferida por Abdalla, o que seria “indispensável” para o recebimento da denúncia.
“Na hipótese dos autos, porém, a exordial se limita a narrar genericamente que a nomeação da Sra. Celina Martins Jallad (‘CELINA’) para o cargo de Conselheira do Tribunal de Contas de MS decorreu de ato ilícito”, diz a defesa da família.
“A falta da decisão supostamente vendida inviabiliza a análise do mérito da ação, uma vez que a alegação de ‘tráfico de influência bem como de decisão judicial ilícita’ constitui fato central para a pretensão do autor. Sem a prova documental, a afirmação do autor permanece no campo da especulação, da fofoca e da maledicência, comprometendo a regularidade e a fundamentação da inicial”, completa.
A defesa diz que Wilson Martins Jallad e Fabiana Martins Jallad, filhos de Celina, não deveriam figurar como réus, uma vez que “não participaram, nem em tese, dos fatos ali narrados, tampouco são beneficiários da suposta ilegalidade aduzida na peça vestibular”.
A prescrição do caso também é apontada, porque Enio Murad busca a anulação de nomeação de conselheira do TCE-MS ocorrida em novembro de 2010, ou seja, há quase 14 anos. A jurisprudência é de que a prescrição para ajuizamento da ação popular se consuma em cinco anos. E, mesmo em caso de dano ao erário e pedido de ressarcimento aos cofres públicos, o que não prescreve, deveria ser comprovado o ato de improbidade, e não existe nenhuma condenação nesse sentido.
Ícone de Mato Grosso do Sul
O advogado André de Carvalho Pagnoncelli reforça que a nomeação de Celina Jallad no cargo de conselheira do TCE-MS é resultado de seu “público e notório trabalho” como deputada estadual ao longo de 16 anos na Assembleia Legislativa, além de sua “extensa” carreira na administração pública, que antecedeu sua época no Legislativo.
“Em que pese a petição inicial omitir dolosamente tão importantes informações, a ex-Deputada Estadual e Conselheira do TCE cumpria todos os requisitos para a vaga para qual foi indicada”, afirma a defesa.
Nascida em 1947, Celina Jallad tinha 63 anos e acumulava quase 30 anos de vida pública quando foi indicada para o Tribunal de Contas. Após sua morte, em fevereiro de 2011, a conselheira deu nome ao plenário do TCE-MS, à medalha de honra concedida pela Câmara Municipal de Campo Grande e à prêmio na Assembleia Legislativa.
“Ora, tais homenagens públicas não são dispensadas a qualquer cidadão comum, mas são feitas exclusivamente àqueles que honraram com o seu trabalho incansável a história do Estado de Mato Grosso do Sul”, argumenta a defesa.
“Em suma, as homenagens à “CELINA” são incontáveis, sendo o seu nome sinônimo de integridade e moralidade, consequência dos mais de 30 (trinta) anos ininterruptos em que se dedicou à gestão pública, o que comprova o notório conhecimento da Administração Pública”, complementa.
Para arrematar, o advogado André Pagnoncelli classifica como “grande equívoco” a alegação de que Celina Jallad teria sido indicada ao cargo de conselheira pelo então governador André Puccinelli (MDB). Isso porque, na realidade, a indicação do nome da ex-deputada estadual partiu da Assembleia Legislativa para ocupar vaga que incumbia o preenchimento ao Legislativo estadual.
“Dessa forma, rechaçam-se desde já as alegações fantasiosas de ‘barganha ilícita’ entre o governador à época e ‘ABDALLA’ para nomeação da Sra. ‘CELINA’, pois a realidade mostra que a indicação para a vaga disponível no Tribunal de Contas, a qual veio a ser ocupada pela falecida, incumbia à Assembleia Legislativa estadual e não ao Governador, conforme determina a Constituição Estadual”, explica o advogado.
“Desta maneira, a nomeação pelo então governador André Puccinelli consistiu apenas em uma formalidade atribuída ao Poder Executivo para o empossamento de Celina, pois a sua indicação já havia sido definida dias antes, em nomeação à vaga que incumbia à Assembleia Legislativa”, argumenta.
Má-fé e extorsão
O advogado da família Jallad defende ainda que a ação pública de Enio Martins Murad é resultado de má-fé, movida por “revanchismo pessoal” e “interesse ilícito”.
A defesa revela que registrou Boletim de Ocorrência contra Enio devido a mensagens de áudio gravadas e enviadas a Wilson Farias do Rego, advogado e amigo em comum das partes, em que o autor da ação popular “confessou que moveria o Judiciário contra ‘ABDALLA’ unicamente para tentar “expô-lo ao ridículo”, pois ‘ENIO’ pretendia receber algum dinheiro do Réu, que se recusou a realizar qualquer pagamento porque nada lhe é devido”.
“Em síntese, a pretensão do autor não se fundamenta na defesa do patrimônio público ou na lisura dos atos administrativos, mas se resume unicamente em buscar levar vantagem patrimonial indevida de “ABDALLA””, afirma.
Segundo André de Carvalho Pagnoncelli, Wilson Farias, após receber as “ameaças”, informou Abdalla, que, por sua vez, formalizou as mensagens de áudio recebidas via WhatsApp através de ata notarial e registrou um Boletim de Ocorrência.
Entre as mensagens, segundo a defesa da família Jallad, Enio Murad condiciona o pagamento de valor que poderia impedir que a ação fosse ajuizada. “Tem mais uma no caminho. E lamento muito esse desfecho”, relata o texto. “☹ Poderia ser evitado. Enfim. Segue a luta.”
“Ora, a afirmação de que o ‘desfecho poderia ser evitado’ é a revelação cabal da consciência do autor de que está utilizando o Judiciário como ferramenta de coação, afinal, na mente do autor, bastaria que ‘ABDALLA’ cedesse à sua extorsão e a Ação Popular jamais teria acontecido”, argumenta Pagnoncelli.
Outro lado e dívida de R$ 3 milhões*
O advogado Enio Martins Murad ajuizou um “incidente de falsidade documental” contra os réus em que afirma que buscam “denegrir” sua imagem e impugna a ata notarial registrada por Abdalla no 3º Serviço Notarial sob responsabilidade do tabelião Ely Ayache.
Murad afirma que os réus “tentam induzir a autoridade policial e esse r. Juízo a erro alegando falsamente que o Autor teria solicitado R$ 300.00,00 (trezentos mil reis) aos Réus para evitar a distribuição da presente demanda, fatos esses que não espelham a realidade, tratando-se de montagem por meio sobreposição e recortes de mensagens cuja realização de prova pericial irá comprovar a falsidade e fraudes objeto do presente incidente”.
“A Ata Notarial descrevendo mensagens do aplicativo Whatsapp não possui validade jurídica sem a realização de perícia técnica, e esse é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça”, defende.
Enio Martins pede que o celular do advogado Wilson Farias do Rego seja apreendido para realização de perícia judicial e seja decretado o segredo de Justiça do processo.
Nesta segunda-feira (16), Enio Martins Murad enviou a O Jacaré uma nota em que afirma haver uma dívida de R$ 3 milhões que a família Jallad lhe deve pelos seus serviços advocatícios em dois processos de divórcio e do inventário de Celina Martins, que não foram pagos.
O advogado nega ter extorquido a família e diz que o que existe é apenas “um engodo um simulacro que será desmentido após realização de perícia em processos próprios, pois esses tentam confundir o juízo para escaparem da conta gerada pela contumaz ganancia familiar”.
“Não tenho dúvidas que ao final serão comprovados todos os fatos no sentido de que até a presente data existe o locupletamento dessa família de recursos públicos originados na corrupção, que só está vindo a público porque não tenho de enfrentar o sistema. Creio na Justiça!”, finaliza Enio Murad.
Leia a nota completa de Enio Martins Murad
Sobre a matéria postada na data de hoje que trata da venda de sentença para o grupo JBS em
troca de nomeação de conselheira do TCE/MS, é fato que Família Jallad é devedora sim de
honorários advocatícios quanto aos serviços realizados e não pagos de 2 (dois) processos de
divórcio (filhos) e do inventário de Celina Martins Jallad, perfazendo um saldo devedor no
montante superior a R$ 3.000.000,00 (três milhões de reais), nunca pagaram pelo serviço, até
hoje.
Quanto as acusações de Abdalla Jallad, Wilson Martins Jallad e Fabiana Martins Jallad de que
supostamente estariam sofrendo “extorsão” por parte do advogado não é verdadeira, trata-se
apenas de um engodo um simulacro que será desmentido após realização de perícia em
processos próprios, pois esses tentam confundir o juízo para escaparem da conta gerada pela
contumaz ganancia familiar.
Não tenho dúvidas que ao final serão comprovados todos os fatos no sentido de que até a
presente data existe o locupletamento dessa família de recursos públicos originados na
corrupção, que só está vindo a público porque não tenho de enfrentar o sistema. Creio na
Justiça!
Enio Martins Murad
OAB MS 9.642
*Reportagem atualizada às 13h42 de 16 de setembro para acréscimo da nota do advogado Enio Martins Murad.