Cézar Lopes – Os devaneios de uma corte constitucional em declínio.
O ente SUPREMO (aquele que é a causa primeira de todas as coisas, do existir, do Ser, que antecede o próprio tempo e espaço) tem uma característica em comum com a corte máxima da justiça brasileira, a onipotência. Esse adjetivo masculino, que segundo o dicionário Michaelis está conectado com o divino e com Deus, torna uma corte constitucional brasileira em um mar de vaidades individuais.
Esqueceram-se os ministros de que a missão precípua da corte constitucional é a salvaguarda da nossa carta política de 1988.
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As recentes revelações feitas pelo jornalista Glenn Greenwald e pelo jornal Folha de São Paulo, revelaram não só o distanciamento da missão única da máxima corte brasileira, mas um precedente perigoso para as liberdades individuais, inclusive a de expressão, uma das mais sensíveis e caras à democracia.
Não se está aqui perquirindo ou se filiando a vieses ideológicos de esquerda ou de direita, – não, em absoluto -, mas a questão de fundo é o ativismo jurídico que adentrou a suprema corte como um espírito maligno que precisa ser exorcizado.
Juvenal em suas Sátiras, escreveu “Quis custodiet ipsos custodes?” (“Quem há de vigiar os próprios vigilantes?”), e a indagação continua atual quase dois mil anos depois.
Não restam dúvidas de que atos de vandalismo, ou mesmo tentativa de golpe de estado, devam ser rechaçados pelos poderes, o que não se pode permitir é que a pretexto de proteger as instituições e a democracia, excessos sejam cometidos, inclusive por aqueles que ocupam cargos de destaque na república.
A atual conjuntura da corte suprema é de convulsão. Isso porque alguns ministros mandaram as favas muitos dos conceitos, dogmas e leis que eles próprios juraram defender.
A questão se agrava quando vemos um ministro atuar como promotor e juiz ao mesmo tempo, situação que nos faz lembrar os tempos sombrios do sistema inquisitorial, em que o processo era desempenhado por um personagem único que enfeixava acusação e defesa em uma só pessoa.
Não é preciso ponderar que tal sistema fora abandonado por incidir em um sofisma psicológico latente, qual seja: de que alguém poderia desempenhar funções tão dispares quanto acusar e julgar com imparcialidade. A constituição, fruto de uma geração cansada dos anos de chumbo, baniu tal sistema, agora, o que vige, é sistema acusatório com funções processuais bem delineadas de acusar, defender e julgar com imparcialidade.
Não bastasse isso, ainda há a duvidosa sobreposição do regimento interno da corte, ao que parece, às leis e a vezes a própria Constituição.
A corte suprema necessita de uma autocritica e um retorno aos seus objetivos precípuos originais para não incorrer em soberba, pecado cometido pelo anjo caído que quis se igualar ao próprio Deus.