A falência da Usina São Fernando, em Dourados, de Guilherme e Maurício Bumlai, filhos do empresário José Carlos Bumlai, completou sete anos marcada por ingredientes de um grande escândalo: um acordo secreto, calote nos credores, ex-funcionários sem receber e pagamento antecipado de R$ 15 milhões ao administrador judicial da massa falida. E o pior, o dinheiro arrecadado não será suficiente para quitar as dívidas de aproximadamente R$ 2 bilhões.
Os detalhes do negócio escuso e envolto em suspeitas foi revelado por reportagem de Juliana Sayuri, do portal Uol, nesta quarta-feira (12). O caso já era investigado por suspeito dos sócios, liderado por Bumlai, terem blindado o patrimônio da família e retirado uma fortuna antes do negócio ir à falência.
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A Usina São Fernando entrou em recuperação judicial em 2013. No entanto, não houve êxito na recuperação e a Justiça decretou a falência em 2017. O administrador judicial é Vinicius Coutinho, nomeado pelo então juiz e hoje desembargador do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, Jonas Hass Silva Júnior.
De acordo com o Uol, ao contrário de outras falências famosas, como a Bigolin, o negócio tramita em sigilo judicial. O juiz autorizou o pagamento de R$ 15 milhões ao administrador judicial, enquanto os ex-funcionários, que têm direito a R$ 53 milhões, ainda não receberam e só vão começar a receber a partir de 2029.
A Pedra Agroindustrial aceitou pagar R$ 400 milhões pela massa falida da usina até 2041. A Justiça, mais uma vez, autorizou antecipar o pagamento de 5% do valor – R$ 20 milhões – para o administrador judicial.
“Sob a justificativa de evitar ‘um mal maior’, o desembargador Paulo Alberto de Oliveira decidiu, em abril, suspender os pagamentos a Coutinho. O magistrado considerou que, como o AJ já recebeu mais de R$ 15 milhões, deixar de receber as parcelas restantes até dezembro (R$ 427 mil, no total) não lhe prejudicaria financeiramente”, informa a reportagem.
Coutinho reagiu e defendeu o pagamento porque conta com mais de 20 funcionários. Ele explicou que reestruturou a empresa, regularizou licenças, quitou dívidas e obteve um resultado positivo de R$ 80 milhões. Ele ainda garantiu que vendeu a usina por R$ 661 milhões em 2022.
“Administrei não só a massa falida, mas uma usina de açúcar, álcool e energia em atividade, com mais de 1.500 funcionários, cumprindo com todas suas obrigações, seja com fornecedores, trabalhadores, impostos”, informou a reportagem do Uol.
Só que o negócio está sob sigilo. “Um escritório de São Paulo participou da proposta de acordo, mas exigiu R$ 60 milhões de honorários, pagos antecipadamente, antes de qualquer credor, e eu não concordei. Rescindi o contrato com eles em maio de 2023. De lá para cá, o escritório está me atacando, nos autos e na imprensa”, afirmou Vinicius Coutinho.
A polêmica também envolve o juiz César de Souza Lima. Os credores pediram o afastamento do magistrado, mas o pedido foi negado pelo Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul.
A Usina São Fernando foi construída em 2008 por Bumlai com empréstimo de R$ 300 milhões do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). A empresa acabou entrando em recuperação judicial em 2013 e indo à falência em 2017.
Guilherme Bumlai, que foi um dos sócios, pede para deixar claro que a família não administra mais o empreendimento desde a decretação da falência, há sete anos. “Desde 2017 está sob a administração do AJ… não temos qualquer interferência nisso”, ressalta.
Bumlai foi preso na Operação Lava Jato e condenado a nove anos por corrupção. A sentença acabou anulada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ele ficou famoso nacionalmente também por ser amigo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A usina deve R$ 600 milhões para os bancos públicos, R$ 229 milhões em impostos e R$ 53 milhões para ex-funcionários.