A Justiça prescreveu a sentença contra Eolo Genovês Ferrari, engenheiro civil, dono de fato, da Engecap Construções Ltda., empresa que, no início dos anos 2000, ficou conhecida em Campo Grande e, no país, por ser, no papel, propriedade de dois garis. Na realidade, depois de conduzidas as investigações, descobriu-se que os “empresários” eram laranjas de Eolo, apenas.
Em 2015, 12 anos depois da descoberta da farsa, a Justiça Federal sentenciou Eolo a oito anos e quatro meses por crimes de falsidade ideológica, documentos falsos e sonegação fiscal.
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Para se ter ideia do tempo que passou a sentença aplicada: quem condenou o empreiteiro à época foi o então juiz federal da 3ª Vara Federal, Odilon de Oliveira, magistrado que já se aposentou, disputou eleições e hoje atua na advocacia.
O empresário recorreu e, agora a justiça prescreveu a sentença, ou seja, extinguiu a punição pelo tempo que já se passou o crime praticado, um pouco mais de duas décadas. A prescrição põe fim, além da sentença, no processo também.
“… isto posto e pelo mais que dos autos consta, reconheço a ocorrência da prescrição da pretensão punitiva pela pena em abstrato e declaro extinta a punibilidade de ROBINSON ROBERTO ORTEGA, GERALDO MATIAS ALVES, ANTÔNIO JOSÉ DE CASTRO e EOLO GENOVÊS FERRARI”, diz trecho da sentença que livrou Eolo e outros envolvidos no caso.
Pelo que consta nos autos, os réus foram defendidos pelos advogados Ascario Nantes e Carmelino Rezende.
Também no processo, é sustentado que a Engecap teria arrecadado ao menos R$ 12 milhões de reais em contratos firmados com o município de Campo Grande, à época, administrado pelo prefeito André Puccinelli, do MDB.
Depois, o mandatário municipal virou governador de Mato Grosso do Sul. Hoje, sem mandato, ele pensa concorrer, de novo, por um eventual terceiro mandato, já que foi prefeitos por duas vezes.
O secretário de Obras do município, à época dos empreiteiros garis, era Edson Giroto, que décadas depois, foi preso e lá ficou por quase dois anos, não por este caso, mas outros crimes, como desvio de dinheiro público e por ocultar recursos de compra de fazenda.
Giroto, que ainda responde por outros crimes, diz ter abandonado a política.
Puccinelli também ficou encarcerado por cinco meses por crime financeiro, não pelo episódio dos garis.
A reportagem tentou conversar com os advogados de Eolo, mas até o fechamento deste material, os dois não tinham sido localizados.
A denúncia
Denúncia preparada pelo então promotor de Justiça da 30ª Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social de Campo Grande, Alexandre Pinto Capiberibe Saldanha, em março de 2010, comprovou que a Engecap era do engenheiro Eolo Genovês Ferrari, não dos dois garis.
O engenheiro Eolo era dono da Drenasa Engenharia, tinha dívidas fiscais e isso impedia que a empresa pudesse participar de licitações ofertadas pela prefeitura de Campo Grande.
Daí, surgiu a ideia de criar-se uma nova empreiteira. Inicialmente, a Engecap foi aberta em nome de duas pessoas, uma delas “praticamente analfabeta”, conforme a denúncia. Dois homens viraram donos da empresa com a promessa de conseguirem empregos.
Em junho de 2002, houve uma alteração no contrato social da Engecap. Viraram donos da empreiteira Paulo Isidoro Sobral e Marcus Vinicius Brito. Aos dois, também foi prometido emprego justo na empresa que, depois de entregarem seus documentos, como CPF, por exemplo, viraram propriedade deles, a Engecap.
Pouco tempo depois, Paulo e Marcus começaram a receber comunicados da Receita Federal e quiseram saber o motivo com a pessoa que havia prometido a eles o emprego.
Uma terceira pessoa, identificada como Geraldo, disse aos dois laranjas que era para eles irem até o cartório assinarem uns documentos. E eles foram e assinaram papeis que depois descobriram que eram uma procuração que dava poderes ao engenheiro Eolo de mexer com as documentações acerca da Engecap, inclusive com as contas bancárias.
A partir daí a Engecap participou e venceu concorrências públicas por obras na prefeitura de Campo Grande e arrecadou em torno de R$ 12 milhões.
E os donos, no papel, Paulo Isidoro e Marcus Vinícius trabalhavam, neste período, para a Secretaria de Serviços e Obras Públicas de Campo Grande por meio de uma empresa terceirizada. Eles cumpriam expediente em serviço de limpeza de ruas.
Tal episódio foi noticiada, à época, à exaustão, pela imprensa estadual e nacional.