O ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça, considerou crime “atípico” o estelionato judiciário e absolveu a advogada Emmanuelle Alves Ferreira da Silva por ter dado golpe de R$ 5,3 milhões em um engenheiro aposentado. Em despacho publicado na última quarta-feira (24), ele absolveu a mulher do juiz Aldo Ferreira da Silva Júnior, que tinha sido condenado a três anos e seis meses pelo estelionato praticado meados de 2018.
A reviravolta é mais uma polêmica a marcar a história do Poder Judiciário brasileiro. Emmanuelle Alves chegou a ser presa pelo Gaeco (Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado) junto com outros três homens pelo golpe. Para sacar o dinheiro do banco, o grupo simulou a compra e venda de uma fazenda fictícia em Tangará da Serra (MT) e obteve alvará judicial para sacar o dinheiro da conta bancária.
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Pelo golpe, Emmanuelle foi condenada por estelionato judicial a três anos e seis meses. José Geraldo Tadeu de Oliveira, que sacou o dinheiro e o distribuiu aos integrantes do esquema, foi condenado a sete anos e dez meses. A juíza Eucélia Moreira Cassal, da 3ª Vara Criminal, ainda condenou Ronei de Oliveira Pécora a três anos e três meses, enquanto Delcinei de Souza Custório pegou um ano e oito meses.
Em sentença publicada em 29 de julho de 2020, a juíza absolveu a advogada dos crimes de falsificação de documento público e organização criminosa. O juiz Paulo Afonso de Oliveira, da 2ª Vara Cível, que autorizou os saques apesar dos alertas de que as assinaturas eram falsas, livrou-se de qualquer condenação no Tribunal de Justiça.
A defesa de Emmanuelle ingressou com habeas corpus para anular a condenação pelo “estelionato judicial”. “O caso, a paciente ajuizou ação de execução de título executivo extrajudicial em nome de ‘João Nascimento dos Santos’, com base em título executivo inautêntico, gerando a penhora de R$ 5.317.003,95 (cinco milhões, trezentos e dezessete mil, três reais e noventa e cinco centavos) da conta bancária da vítima S.J.M. de B., obtendo o levantamento desse valor, mediante transferência para conta de sua titularidade, encaminhando parte do valor, para conta de titularidade de ‘João Nascimento dos Santos’, pessoa fictícia, pela qual se passava o acusado José Geraldo de Oliveira”, pontuou o ministro do STJ.
“Esta Corte Superior entende que a figura do estelionato judiciário é atípica pela absoluta impropriedade do meio, uma vez que o processo tem natureza dialética, possibilitando o exercício do contraditório e a interposição dos recursos cabíveis, não se podendo falar, no caso, em ‘indução em erro’ do magistrado. Eventual ilicitude de documentos que embasaram o pedido judicial poderia, em tese, constituir crime autônomo, que não se confunde com a imputação de ‘estelionato judicial’ e não foi descrito na denúncia”, analisou.
“É dizer, em outras palavras, que inexistente como figura penal típica a conduta de induzir em erro o Poder Judiciário a fim de obter vantagem ilícita, não [havendo] falar em absorção de uma conduta típica (falso) por outra que sequer é prevista legalmente (estelionato judiciário)”, ressaltou.
Sebastião Reis Júnior, do STJ
“No entanto, em nada se obsta a persecução penal pela prática de outros delitos. Por fim, estando imputada conduta atípica, necessário rever a condenação imposta”, concluiu, decidindo anular a sentença.
“Em face do exposto, concedo a ordem para absolver a paciente na Ação Penal n. 0022311-45.2018.8.12.0001, perante o Juízo de Direito da 3ª Vara Criminal da comarca de Campo Grande/MS”, determinou Reis Júnior.
O caso foi um dos maiores escândalos desvendados pelo Gaeco, principalmente, por envolver uma advogada e esposa de um juiz. O esposo de Emmanuelle também foi alvo do Gaeco na Operação Espada da Justiça acusado pelos crimes de corrupção, organização criminosa, peculato e venda de sentença.
Ele virou réu em três ações penais junto com a esposa. O casal também responde por enriquecimento ilícito por não provar a origem do patrimônio milionário. As ações tramitam na primeira instância.
As ações criminais tramitam na 4ª Vara Criminal, comandada pela juíza May Melke Penteado Amaral Siravegna.