As investigações do Ministério Público Estadual que culminaram na Operação Laços Ocultos apontam que o grupo liderado pelo vereador Valter Brito da Silva (PSDB) utilizou 13 empresas ligadas a familiares e empresários para forjar concorrência e garantir R$ 78 milhões em contratos em municípios no interior de Mato Grosso do Sul, principalmente em Amambai.
A partir de 2017, após assumir o cargo vice-prefeito de Amambai, e “valendo-se de sua função pública e influência”, Valter Brito passou a indicar servidores a cargos públicos, especialmente na área de obras, ao mesmo tempo em que cooptava empresas de construção, algumas recém constituídas, e passou a coordenar esquema de fraude e direcionamento de obras, com recebimento de propina, segundo o MPE.
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Neste contexto, foram constituídas e preparadas empresas por ação de familiares de Brito e de outras pessoas físicas, com o objetivo de participarem conjuntamente de licitações públicas para fraudar o caráter competitivo desses certames.
O MPE identificou, através de quebra de sigilo telefônico e telemático dos investigados, 13 empresas que participaram do esquema. A organização era dividida em dois grupos: de um lado os agentes públicos e políticos comandados por Valter Brito e, de outro, os empresários beneficiados que, em troca, pagavam propina.
“A atuação do grupo criminoso é permanente, duradoura, atual e, o mais grave, intensifica-se no presente momento, atingindo, só neste Município, de 2018 até agora, cifra que ultrapassa 78 milhões de reais em procedimentos fraudados”, diz relatório do Grupo Especial de Combate à Corrupção (GECOC).
Na denúncia do Ministério Público Estadual à Justiça, são apontadas fraudes em pelo menos 33 licitações.
As empresas envolvidas são a C&C Construtora, que teria Valter Brito como sócio oculto; JFL Construtora, de Jonathan Fraga de Lima; MMA Engenharia, de Maikol do Nascimento Brito; Transmaq Serviços, de Valdir de Brito; Bonomo’s Construções, de Ângela Bonomo; J&A Construtora, de Joice Mara Estigarribia da Silva; Luiz H. B. Rodrigues – ME, nome de seu proprietário.
As demais são Mariju Engenharia, de Júlio Arantes Varoni; Cassiane Thafilly de Freitas Rodrigues ME, nome de sua proprietária; Águia Construtora, de Luciana Pereira Vieira Adorno Vicentin; TS Construtora, de Ariel Betezkoswski Maciel; Construtora Roncone, de José Carlos Roncone; e José Carlos Roncone Eireli.
Todos foram denunciados pelos crimes de organização criminosa, corrupção passiva e ativa e fraude em licitações.
E chama atenção a relação de parentesco dos envolvidos, tendo como núcleo o vereador Valter Brito. Letícia Teoli (sobrinha) é casada com Jonathan Lima, Maikol Brito (sobrinho), Aldevina Nascimento (cunhada), Fernanda Brito (filha) e Valdir de Brito (irmão). Ângela Bonomo e Carlos Eduardo da Silva são mãe e filho.
Conversas telefônicas por aplicativo de mensagens interceptadas pela investigação mostram a relação entre os envolvidos e negociações a respeito de obras e licitações.
Em uma delas, Ariel Betezkoswski afirma que Letícia Carvalho Teoli participa da organização a envolver diversas empresas sob comando “do Brito”.
“A Letícia, ela é engenheira, mas ela é de outra empresa lá, é da… do companheiro, do amigo meu lá… é do Brito. Tem nada a ver comigo não. Meu que te ligou aí foi o Giovanni, tá, eu vou te mandar o que ele quer aí, aí você manda para mim lá no terreno amanhã. Essa da Letícia aí não tem nada a ver não, é da… acho que é Transmaq… ou JFL… C & C… eles têm um monte de empresa lá, não sei qual… qual que eles estão usando. Beleza?”, diz a mensagem.
Em outra, Jucélia Barros Rodrigues, diretora de Convênios e Projetos da Prefeitura de Amambai, afirma que Valter Brito seria o líder do grupo criminoso a envolver diversas empresas.
“Oi, Lázaro, então nós estamos agendando para ir terçafeira, aí vai o seu Manoel, o atual prefeito, o Brito, que é o que está executando, e eu, e aí, se você tiver na cidade, a gente senta junto com você também lá, eu te aviso, eu confirmo com você segunda-feira. Pra gente se encontrar lá na Agesul, porque você viu que o no relatório eles falam que tem sobreposição…”, relata a servidora.
As investigações apontam que algumas empresas, como a Transmaq Serviços, não funcionam na prática.
“Foi verificado que ela tem permanecido com as portas fechadas e sem nenhuma movimentação de pessoas no local, inferindo que na prática, não desenvolve atividade comercial alguma. Ainda, foi igualmente constatado pela equipe operacional do GAECO, no mês de junho de 2023, que Fernando Carvalho de Brito, na verdade, desenvolve suas atividades laborais na sede da empresa JFL Construtora, juntamente com sua prima, a denunciada LETÍCIA DE CARVALHO TEOLI”, relata o MPE.
As empresas também transferiram dinheiro entre si. O Gaeco e o GECOC apreenderam “inúmeros comprovantes de transferências da empresa JFL à Transmaq, que totalizaram R$ 444.000,00” e “comprovante de depósito no valor de R$ 34.000,00”.
“O que demonstra a organização criminosa forjada com a utilização de diversas empresas, dentre as quais as duas citadas”, diz a denúncia do MPE.
“Dos elementos acima indicados percebemos claramente que somente as empresas ora denunciadas eram convidadas e participavam dos certames, ou seja, não havia espaço para qualquer outra empresa do ramo participar das licitações em análise, mas tão somente as empresas do grupo comandado por VALTER BRITO, seus parentes e empresas a ele ligadas”, prossegue.
“Tal situação acarreta, sem margem para dúvidas, a frustação dos processos licitatórios, já que não havia concorrência para se buscar a contratação mais vantajosa para a Administração Pública, tipificando o delito previsto no artigo 337-F, do Código Penal”, afirma.
“Ou seja, em poucos processos licitatórios e contratos analisados, já foi possível encontrar as fraudes que indicam o modus operandi do grupo criminoso, adotado de forma sistêmica, reiterada e atual: fraudam licitações, mediante conluio entre empresas, contando com a participação de servidores públicos, corrupção ativa e passiva, tráfico de influência exercido pelo agente político VALTER BRITO”, conclui o órgão ministerial.
Laços Ocultos
O Ministério Público Estadual denunciou 17 pessoas na Operação Laços Ocultos, deflagrada para investigar fraudes em licitações e desvios de recursos na Prefeitura Municipal de Amambai.
A denúncia foi protocolada no início deste mês pelo coordenador do Grupo Especial de Combate à Corrupção, Adriano Lobo Viana de Resende, e pelos promotores Humberto Lapa Ferri e Nara Mendes dos Santos Fernandes.
Conforme a denúncia, os promotores reuniram provas de que o vereador Valter Brito da Silva (PSDB) comandava uma organização criminosa especializada em fraudar licitações no município para desviar recursos dos cofres públicos.
Valter Brito foi denunciado pelos crimes de fraude em licitações por 33 vezes, corrupção passiva por 17 vezes, uma vez por corrupção ativa.