O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, levou dois meses para conceder liminar e suspender o reajuste na verba indenizatória dos vereadores de Campo Grande. O desembargador Paulo Alberto de Oliveira, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, gastou apenas três horas para derrubar a decisão do magistrado e manter o pagamento de R$ 30 mil para cada parlamentar.
O advogado mineiro Sérgio Sales Machado Júnior ingressou com ação popular contra o aumento de 20%, de R$ 25 mil para R$ 30 mil, no dia 20 de outubro deste ano. Ele apontou que o presidente da Câmara, Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), autorizou o reajuste sem estimar a receita e apontar a fonte, como determina a Lei de Responsabilidade Fiscal.
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Ariovaldo acatou pedido de liminar e suspendeu o reajuste de 20%. A tutela de urgência tem dada de 12 de dezembro deste ano, mas só foi publicada no site do TJMS à 0h55 desta terça-feira (19). Oficialmente, o magistrado levou dois meses para analisar o pedido do advogado e considerou o parecer do Ministério Público Estadual, favorável ao cancelamento do reajuste.
“Defiro a tutela de urgência para determinar a imediata suspensão dos efeitos financeiros dos Atos da Mesa Diretora nº 281/2023 e 282/2023da Câmara Municipal de Campo Grande, devendo o pagamento das verbas indenizatórias aos Vereadores de Campo Grande se dar pelo valor anterior à majoração/aumento decorrente de tais atos administrativos até ulterior decisão em sentido contrário, sob pena de aplicação de multa diária no valor de R$ 500,00,limitada a R$ 15.000,00 para cada requerido no caso de descumprimento da ordem”, determinou Ariovaldo Nantes Corrêa.
O principal ponto foi que a Câmara Municipal não se preocupou em cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal para estimar o impacto financeiro do aumento e a fonte dos recursos. Carlão se limitou a informar ao juiz que a Câmara Municipal tinha autonomia financeira e dinheiro para torrar o dinheiro público. A conta final vai ficar com o contribuinte.
“A Lei de Responsabilidade Fiscal estabelece vários instrumentos obrigatórios para o aumento das despesas, que não foram observados”, alertou Sérgio Sales Machado Júnior. “A expansão permanente das despesas deve ser realizada de forma responsável, transparente e planejada, sob pena de se transformar as leis fiscais e orçamentárias, o que pode comprometer a realização de políticas públicas pela insuficiência de recursos”, frisou o magistrado.
O procurador jurídico da Câmara, Luiz Gustavo Lazzari, recorreu ao Tribunal de Justiça às 15h01 desta terça-feira. Pouco mais de três horas depois, às 18h05, o desembargador Paulo Alberto de Oliveira, acatou o pedido da Câmara Municipal e suspendeu a liminar concedida na madrugada, que limitava a farra com o dinheiro público.
“Primeiramente, importante delimitar que o objeto da Ação Popular de origem é o ato que majorou a verba indenizatória (Atos da Mesa Diretora nº 281 e282, de 19/09/2023), e não o ato que instituiu a verba (Ato da Mesa Diretora nº027/2017)”, pontuou Oliveira.
Ele destacou que o Tribunal de Justiça já considerou o pagamento de verba indenizatória legal. “O ato que instituiu a verba (Ato da Mesa Diretora nº 027/2017), já foi, defato, objeto de análise neste TJ/MS, tendo a 5ª Câmara Cível, em Acórdão já transitado em julgado”, frisou o desembargador.
“Consoante se extrai do Ato nº 027/2017 da Mesa Diretora – cuja legalidade já foi assentada neste TJ/MS –, a verba indenizatória em questão é devida a título de reembolso, mediante requerimento padrão formulado pelo parlamentar, no qual exige-se o cumprimento de alguns requisitos, dentro dos quais se inclui a comprovação da despesa”, pontuou.
“Decorre disso a premissa de que a Câmara Municipal de Campo Grande possui autonomia financeira e administrativa para, dentro do seu limite percentual da receita corrente do Município (duodécimo) deliberar sobre a forma de dispêndio para manutenção da sua estrutura administrativa, não se exigindo, para isso, prévios estudos de impacto frente a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) ou frente o PPA (Plano Plurianual), mesmo porque é o Poder Executivo quem estipula a programação financeira e o cronograma de execução dos desembolsos (art. 8º da LRF), cabendo à Casa Legislativa deliberar sobre a destinação desses valores, em conformidade com suas necessidades operacionais”, destacou.
Para Paulo Alberto Oliveira, os vereadores podem ser prejudicados sem o aumento de R$ 5 mil por mês. “Também está presente o periculum in mora, vez que o óbice ao reajuste da verba indenizatória poderá impactar no desenvolvimento da operação da Casa Legislativa, que possui tamanha relevância para a sociedade”, pontuou.
“Além disso, não há irreversibilidade da manutenção dos efeitos financeiros desse reajuste, já que eventual ilegalidade do ato poderá ensejar posterior restituição dos valores desembolsados em excesso, tanto que formulado pedido nesse sentido, na Ação Popular”, concluiu.
Alheios à opinião pública e à grave crise financeira enfrentada pelo município, os vereadores da Capital foram contemplados com aumento de 257% em seis anos, entre 2017 e 2023, o valor da verba indenizatória passou de R$ 8,4 mil para R$ 30 mil. O gasto anual poderá chegar a R$ 10,440 milhões. A farra com o dinheiro público está liberada.
Mais sorte tiveram os moradores de Cuiabá, onde a Justiça do Mato Grosso limitou o gasto com a verba indenizatória. Atualmente, cada vereador cuiabano recebe R$ 14 mil por mês, menos da metade do valor pago aos parlamentares de Campo Grande.