A Justiça determinou que os médicos que atendem em postos e unidades de saúde da Prefeitura de Campo Grande devem emitir receitas e pedidos de exames digitados e impressos pelo próprio profissional. A decisão atende o que prevê uma lei de Mato Grosso do Sul, sancionada em 2008.
Apesar da exigido por lei estadual, a Defensoria Pública de MS verificou que, na maioria das vezes, receitas, exames, relatórios e outros documentos são redigidos à mão pelos médicos, sendo muitos deles ilegíveis. O órgão defende que esta situação impede o fornecimento do tratamento médico adequado.
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Para exigir o cumprimento da lei, a Defensoria ajuizou uma ação civil pública contra a prefeitura e a Santa Casa de Campo Grande, em 2014. Esta última, no decorrer do processo, passou a permitir que os médicos passassem a digitalizar os documentos desde 2015 e, com isso, foi excluída do feito.
Conforme a Defensoria, o município não disponibiliza equipamentos de informática suficientes ao cumprimento da lei, especialmente nos postos de saúde, tampouco há tinta e papel sulfite. E cabe à prefeitura o cumprimento adequado da lei estadual com sua regulamentação e fornecimento suficiente de equipamentos de informática e outros materiais a fim de possibilitar a emissão de receitas médicas e odontológicas de maneira adequada.
A Prefeitura de Campo Grande, por sua vez, alegou que a lei estadual é inconstitucional e não existe previsão orçamentária para as despesas referentes à estruturação dos hospitais públicos, unidades de saúde e centros de saúde com computadores e materiais como tinta e papel.
O juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, afastou a tese de a lei ser inconstitucional. O magistrado argumenta que a lei estadual assegura o direito à saúde dos cidadãos é competência legislativa concorrente da União, Estados e Distrito Federal.
“Quanto à alegação de inconstitucionalidade decorrente da previsão de regulamentação da Lei Estadual nº 3.629/2008 a ser feita pelo Poder Executivo, igualmente deve ser refutada, uma vez que tal previsão não se confunde com qualquer das hipóteses previstas no artigo 61, § 1º, da Constituição Federal, nem trata da organização administrativa indicada no referido dispositivo, que tem relação com a definição e hierarquização de órgãos e entes públicos inseridos no âmbito do Poder Executivo, ou seja, com sua estruturação administrativa ou funcionamento e não com equipamentos a serem implementados nos serviços públicos, razão pela qual não se verifica a ingerência do Poder Legislativo em matéria de competência exclusiva do Poder Executivo como imaginado pelo requerido remanescente”, argumenta Ariovaldo Corrêa.
O juiz afirma ser “evidente” a obrigação do município de exigir que as receitas médicas e pedidos de exames médicos sejam digitados em computador e impressos pelo médico. Ele destaca que a emissão dos documentos de forma ilegível “viola não apenas o texto da lei, mas compromete a atuação de outros profissionais da área da saúde no atendimento ao paciente e ofende, em última análise, o próprio direito à vida”.
O titular da 1ª Vara de Direitos Difusos refuta a alegação de não haver previsão orçamentária para implementar o que determina a lei, pois houve transferência de recursos federais para a compra de computadores e manutenção do contrato firmado com a empresa de locação de impressoras a fim de implementar o sistema e-SUS.
“O que afasta a alegação do requerido no sentido de que não há previsão orçamentária para o cumprimento de sua obrigação, pois, como afirmado em audiência de instrução e julgamento, houve a transferência de recursos de R$ 15.000.000,00 ao Fundo Municipal destinados à tal implementação”, informa.
Diante disso, o juiz Ariovaldo Nantes Corrêa condenou a Prefeitura de Campo Grande a determinar que os médicos que lhe prestam serviços forneçam receitas e pedidos de exames digitados e impressos pelo próprio profissional ou, em caso de atendimento emergencial, que a prescrição se dê em letra de forma. Além de fornecer os equipamentos necessários para cumprir estas obrigações.
A decisão, proferida no dia 27 de outubro, não se estende a hospitais ou outras unidades de saúde particulares que prestem serviço ao requerido remanescente por contrato no âmbito do SUS (Sistema Único de Saúde).
A prefeitura pode recorrer da sentença.