A 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região negou recurso do Ministério Público e liberou o envio da denúncia por organização criminosa contra oito réus na Operação Lama Asfáltica na justiça estadual de Mato Grosso do Sul.
Este cenário se arrasta desde setembro de 2021, quando o juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira, titular da 3ª Vara Federal, declinou competência para a denúncia envolvendo os acusados de desviar dinheiro público na gestão de André Puccinelli (MDB). O magistrado acatou recurso da defesa do ex-secretário-adjunto estadual de Fazenda, André Luiz Cance.
Veja mais:
Inquérito contra Giroto por compra de fazenda de R$ 6 mi em Corumbá chega à Justiça estadual
MPE deve provar em detalhes que Cance cometeu crime na evolução patrimonial de 2.350%
Perícia deve fazer tour por três Estados para avaliar fazendas, sítios e imóveis do casal Giroto
Foram beneficiados com a decisão o filho do ex-governador, o advogado André Puccinelli Júnior, o delator da Operação Lama Asfáltica, Ivanildo da Cunha Miranda, os donos das milionárias empresas de informática, Antônio Celso Cortez, e João Roberto Baird, o Bill Gates Pantaneiro, João Paulo Calves, Jodascil da Silva Lopes e Jodascil Gonçalves Lopes. A decisão abrange Micherd Jafar Júnior, dono da Gráfica Alvorada, que morreu de covid-19 há dois anos.
Bruno Cezar Teixeira aceitou a exceção de incompetência porque não há bens, serviços e interesses da União na ação penal nem ligação com a Secretaria Estadual de Obras, um dos vínculos que têm mantido das denúncias na Justiça Federal.
O juiz e o TRF3 já encaminharam à justiça estadual diversas denúncias da Lama Asfáltica, como a envolvendo o pagamento de propina de R$ 25 milhões pela JBS a André Puccinelli; sobre o direcionamento e superfaturamento nos contratos com a Gráfica Alvorada; os desvios e pagamento de propinas no Detran, que envolvem até o advogado Rodrigo Souza e Silva, filho do ex-governador Reinaldo Azambuja (PSDB).
Diante disso, o Ministério Público Federal recorreu ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região com o argumento de que, apesar de os fatos narrados na ação penal terem conexão com processo no qual foi declinada a competência para a Justiça estadual, a acusação sobre organização criminosa é autônoma.
O relator na 5ª Turma, desembargador Paulo Fontes, porém, concordou com a decisão da primeira instância.
“Do que se verifica dos autos, a denúncia oferecida traz informações acerca de organização criminosa estruturada para prática de diversos crimes, inclusive narrando os membros dos ‘Núcleo JBS’ e ‘Núcleo GRÁFICA ALVORADA’”, informa.
A 5ª Turma reconheceu a incompetência da Justiça federal para processamento e julgamento da ação que tratava do recebimento de vantagens indevidas como contraprestação a benefícios fiscais concedidos ao frigorífico JBS.
O mesmo ocorreu em relação a suposta prática de contratação direta ilegal da Gráfica e Editora Alvorada, com fraude nos procedimentos, visando possibilitar desvios de dinheiro e recursos públicos, bem como o pagamento dissimulado de vantagens indevidas.
“Observa-se que, nas ações penais envolvendo os núcleos “JBS” e “GRÁFICA ALVORADA”, ficou entendido que não havia uma conexão probatória entre aqueles fatos e e outros apurados no bojo da Operação Lama Asfáltica, que envolveriam fraudes licitatórias, peculato e outros delitos envolvendo recursos federais de convênios, e eventual lavagem de dinheiro daí derivada”, prosseguiu Fontes.
“Desse modo, houve o declínio da competência por não ter sido demonstrada ofensa a bens, serviços ou interesses da União, de suas autarquias ou empresas públicas”, explicou.
“Sendo assim, entende-se que, em razão de parte dos denunciados terem tido imputada a prática de crime de organização criminosa com base em fatos que estão sendo apurados e processados na Justiça Estadual, para uma melhor compreensão dos fatos como um todo, mostra-se devido o desmembramento com a remessa para a Justiça Estadual”, justificou.
“Vale ressaltar que, embora o crime de organização seja autônomo, a remessa dos autos quanto aos réus dos mencionados núcleos, mostra-se necessária em decorrência da conexão probatória, na qual a prova de um feito pode influenciar na prova de outro”, pontuou.
“É evidente que, no caso, a prova de um crime ou de quaisquer de suas circunstâncias elementares pode influenciar na comprovação dos outros delitos, de modo que se mostra mais razoável que os feitos que versem sobre crimes entrelaçados entre si sejam processados e julgados por uma mesma autoridade judiciária”, concluiu o desembargador Paulo Fontes, em voto que foi seguido por unanimidade pela 5ª Turma, cujo acórdão foi publicado nesta terça-feira (17).
Os autos desmembrados devem ser encaminhados à 1ª Vara Criminal de Campo Grande, competente para processar e julgar criminalmente os processos da Operação Lama Asfáltica no âmbito estadual.