Após ficar “esquecido” por três anos, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) iniciou, na terça-feira (22), o julgamento sobre a reclamação disciplinar contra o desembargador Divoncir Schreiner Maran, ex-presidente do TJMS (Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul). O corregedor Luis Felipe Salomão votou a favor da abertura de investigação, mas a decisão foi adiada com pedido de vista.
A presidente do CNJ e do STF (Supremo Tribunal de Justiça), ministra Rosa Weber, diante da interrupção, cobrou dos colegas uma decisão sobre o caso. Como justificativa para pedir rapidez, a magistrada citou matéria publicada por O Jacaré, em maio deste ano, sobre a demora para o desfecho do caso, que teve início em abril de 2020.
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“Minha preocupação é que aqui consta”, destacou a ministra, antes de ler o título da matéria: Chefe do tráfico que rompeu tornozeleira há 3 anos virou fumaça e CNJ “esqueceu” de desembargador. “Aí está a minha preocupação”, observou Rosa Weber, antes de citar a sigla do Conselho Nacional de Justiça. “Este processo exige que nós o enfrentemos e seja, de fato, apreciado”. (Veja abaixo)
O desembargador Divoncir Maran foi responsável por conceder prisão domiciliar ao narcotraficante Gerson Palermo, condenado a 126 anos de prisão, que logo depois fugiu e até hoje não se sabe de seu paradeiro.
O caso ocorreu no plantão judicial durante feriado de Tiradentes, em abril de 2020, quando Divoncir concedeu prisão domiciliar a Palermo, sem ouvir o Ministério Público e em circunstâncias “incomuns”, como classificou o corregedor do CNJ e relator do caso, Luis Felipe Salomão.
O traficante foi enquadrado no grupo de risco da covid-19 e, com monitoramento eletrônico, conseguiu sair da cela do presídio Jair Ferreira de Carvalho, a Máxima, em Campo Grande. No dia seguinte, 22 de abril, Palermo colocou a tornozeleira, mas oito horas depois, rompeu o dispositivo eletrônico e sumiu, se livrando de 126 anos de pena.
No pedido apresentado à Justiça, a defesa do preso alegou que ele era idoso, diabético, hipertenso e com problemas renais. Nenhum laudo foi anexado para atestar as comorbidades.
Na sequência, o desembargador Jonas Hass Silva Júnior, também do TJMS, chegou a revogar a liminar concedida por Divoncir no plantão, mas Palermo nunca mais apareceu. A prisão domiciliar foi derrubada por uma sequência de falhas: falta de laudo pericial atestando as enfermidades e o estabelecimento penal não tinha excedente de lotação.
No julgamento iniciado anteontem, o corregedor Luis Felipe Salomão votou a favor da abertura de processo disciplinar contra Divoncir Schreiner Maran, mas contra o afastamento do desembargador. No entanto, o conselheiro Bandeira de Mello Filho pediu vistas e postergou a decisão.
O advogado André Borges participou da sessão do CNJ e fez a sustentação oral em defesa do ex-presidente do TJMS. Ele afirmou que não existe justa causa para abertura de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra o desembargador, e que este seguiu decidiu com base na recomendação do Conselho Nacional de Justiça.
“A defesa insiste que não existe justa causa para abertura do PAD. Houve até, doutor Salomão, antes da inspeção que o senhor encerrou há poucos dias, há dois anos houve outra inspeção no TJMS, o gabinete do desembargador Divoncir Maran foi inspecionado em razão deste episódio. E nada de irregular se encontrou para apontar que houve dolo, que houve má-fé, ou que houve erro grave a justificar a abertura de um PAD por conta estritamente de uma decisão judicial”, declarou André Borges.
Após a sustentação da defesa, o relator Luis Felipe Salomão leu seu voto em que ressaltou que o traficante tinha condenação de 126 anos de prisão para cumprir; “não era senil, era um piloto de aeronave” que usava para o tráfico de drogas; é considerado um dos maiores traficantes de drogas ilícitas do País, vinculado “fortemente” ao crime organizado, com “múltiplas reincidências”.
Após o pedido de vista de Bandeira de Mello Filho, Salomão fez questão de dar mais explicações sobre seu posicionamento.
“Não é um fato só, é o conjunto das circunstâncias que foram apontando para essa falta de cuidado para uma determinação de que, naquele momento, não era prudente o deferimento [da prisão domiciliar]”, afirmou.
“É no mínimo necessário, no meu modo de perceber, uma apuração mais aprofundada. O fato é grave, realmente é grave”, concluiu o corregedor, e informou que o traficante Gerson Palermo segue foragido. Na sequência, Rosa Weber pediu celeridade ao conselheiro que pediu vista. A previsão é de que a votação seja retomada na próxima audiência, daqui duas semanas.
Gerson Palermo acumula passagens pela polícia desde 1991. No ano 2000, sequestrou o avião que levava malotes com R$ 5,5 milhões do Banco do Brasil. Em 2017, foi preso na operação All In, da Polícia Federal.