Após tentativa de responsabilização criminal ser fulminada pela prescrição do caso, o MPE (Ministério Público Estadual) entrou com processo na área cível contra o curtume Qually Peles Ltda, localizado no Núcleo Industrial, para que a poluição no Córrego Imbirussu, em Campo Grande, não fique impune.
De propriedade do pecuarista Jaime Valler, que também é dono do jornal O Estado de Mato Grosso do Sul, a indústria é denunciada desde 2007 por irregularidades ambientais, incluindo até interdições e nomeação de um interventor. Agora, na ação datada de 17 de agosto, o promotor Luiz Antônio Freitas de Almeida pede liminar para que o curtume seja obrigado a cumprir as normas ambientais.
Veja mais:
Dono de curtume é condenado a dois anos por omitir contribuição previdenciária
Risco à saúde pública, TJ derruba liminar que impedia interdição de curtume de dono de jornal
Problema há 13 anos, juiz decide nomear interventor para acabar com poluição de curtume
Ao término do processo, uma ação civil pública condenatória de obrigação de fazer e de pagar quantia certa, a promotoria cobra pagamento de R$ 900 mil por danos morais e materiais. O valor deverá ser revertido ao Fundo Municipal de Meio Ambiente.
“A responsabilidade civil da requerida ampara-se na constatação de que há a existência danos ambientais, devidamente comprovados por sentença condenatória, praticados pela requerida durante o exercício de sua atividade industrial. A atividade ilícita provocou poluição, com afetação amplamente desfavorável da biota resultante das perdas de biodiversidade e habitats, além da contaminação do solo e do Córrego Imbirussu”.
O curso de água atravessa 11 bairros densamente povoados e o Núcleo Industrial. Ele deságua no Rio Anhanduí. Segundo o promotor, a prescrição da ação na esfera penal não impede a ação civil.
Conforme o MPE, a responsabilidade do curtume está amparada por premissas como cometimento de ato ilícito, obrigação de reparar o dano por ato ilícito e obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa.
“Ou seja, não é possível a execução direta da sentença penal condenatória, eis que embora a condenação fosse reconhecida como justa e devidamente embasada na prova dos autos, na prática houve a declaração da extinção da punibilidade pelo advento da prescrição, o que não impede a propositura desta ação civil”.
O Ministério Público traçou uma linha do tempo dos danos ambientais:
29 de junho de 2007 – Ficou constatado na sede da indústria que a ré depositou sobre o solo, sem impermeabilização, resíduos de curtimento de cromo e resíduos orgânicos diversos; depositou e aterrou resíduos de curtimento de peles ao cromo, resíduos orgânicos diversos e embalagens de produtos químicos sobre o solo, sem impermeabilização e cobertura; e queimou, a céu aberto, resíduos (lã de carneiro e outros).
19 de junho de 2008 – Houve o aterro de lagoas de estabilização, porém com aberturas no solo, onde a empresa fazia a deposição diretamente, sem impermeabilização, a céu aberto e sem prévio tratamento, de resíduos diversos (embalagens de produtos químicos, lamas dos sistemas de tratamentos de efluentes de curtimento, raspas de couro, lã de carneiro e outros); também no fundo da indústria, havia uma área onde eram depositados resíduos orgânicos e cinzas em local descoberto e sem piso impermeável.
Anos de 2010 e 2012 – Em três datas – 16 de agosto de 2010, 18 de outubro de 2010 e 3 de dezembro de 2012 – ficou evidenciado que a ré lançou resíduos líquidos, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos, o que provocou a poluição do Córrego Imbirussu.
“As amostras das coletas demonstram a concentração de cromo total, pH, DBO, nitrogênio amoniacal, em percentual bem acima do permitido, causando descarada poluição no curso hídrico. Esse percentual caracteriza ofensa à Resolução CONAMA [Conselho Nacional do Meio Ambiente]”.
Fevereiro de 2012 – Os danos ambientais consistiam no lançamento de efluente bruto (sem qualquer tratamento), em desacordo com as exigências estabelecidas em leis e regulamentos, proveniente do processo produtos da indústria de curtume e graxaria, diretamente no Córrego Imbirussu.
Agosto de 2012 – Segundo a promotoria, ficou provado que a ré, em 20.08.2012, permaneceu lançando efluentes in natura (sem qualquer tratamento), na galeria de águas pluviais que desemboca no Córrego Imbirussu, causando poluição em níveis que podem resultar em danos à saúde humana.
“O lançamento direto dos efluentes contaminados no Córrego Imbirussu persistia. Nem a atuação do órgão ambiental, dotado de poder de polícia, intimidava tamanha barbárie ambiental. A requerida insistia na conduta ilícita, desprezando a legislação ambiental e os danos provocados por sua nefasta conduta, que trouxe consequências irreparáveis ao meio ambiente”.
Em 2013 – Os danos ambientais foram constatados em março, abril, junho e julho. Por meio do lançamento de resíduos líquidos em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos.