Acusados de dar um golpe de R$ 40,7 milhões em 2,3 mil investidores foram condenados a penas que variam da prestação de serviços à comunidade até cinco anso e nove meses de prisão no regime semiaberto. Nenhum dos três empresários envolvidos vai cumprir pena no regime fechado, apesar de terem lucrado até R$ 2,7 milhões com o golpe a partir da empresa RSI Negócios Financeiros, em Dourados, a 223 quilômetros de Campo Grande.
A condenação consta da sentença de 72 páginas do juiz Luiz Augusto Iamassaki Florentini, da 5ª Vara Federal de Campo Grande, publicada nesta terça-feira (15) no Diário Oficial da Justiça Nacional. É o desfecho da Operação Romeu Sierra Índia, deflagrada pela Polícia Federal para prender os integrantes do grupo, que acabou não sendo condenado por organização criminosa.
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A maior punição foi aplicada ao empresário Clodoaldo Pereira dos Santos, dono de uma chiparia em Amambai, condenado por quatro delitos a cinco anos e nove meses no semiaberto. Ele teria aplicado R$ 322,1 mil na empresa e recebeu R$ 3,425 milhões, lucrando R$ 2,765 milhões, conforme destaque feito pelo magistrado.
O empresário Lucas Carvalho Lopes foi condenado a quatro anos, oito meses e 15 dias no regime semiaberto. Sortudo, ele recebeu R$ 439 mil da RSI, mesmo sem ter aplicado um tostão. O irmão aplicou R$ 34,5 mil e ganhou R$ 409 mil. O juiz citou ainda repasse para a mãe e irmãs do réu, que teriam recebido R$ 16,5 mil, que também não caíram no golpe.
O empresário José Paulo Alfonso Barros teve ainda mais sorte. Condenado por dois delitos, ele cumpriria três anos e dois meses no regime aberto. O juiz Luiz Augusto Iamassaki converteu a pena na prestação de serviços à comunidade, uma hora por dia pelo período da sentença, e ao pagamento de três salários mínimos por mês durante três anos.
Preso desde 8 de janeiro deste ano em Brasília pelos atos antidemocráticos, Barros não tem do que reclamar, já que teria lucrado, conforme o magistrado, R$ 1,4 milhão com o golpe. Ele aplicou R$ 240,9 mil na empresa, mas acabou recebendo R$ 1,7 milhão em depósitos.
O quarto integrante, Diego Rios dos Santos, que seria o mentor do esquema, teve o processo desmembrado e não foi condenado na sentença publicada nesta terça-feira.
Na sentença, o juiz descreve que o quarteto teria movimentado R$ 40,7 milhões, conforme relato do Ministério Público Federal. A PF, contudo, identificou movimentação de R$ 54 milhões de 2,3 mil vítimas.
“Após a captação dos recursos de terceiros por meio do funcionamento aparentemente regular da instituição financeira por dado período de tempo, com o ingresso constante de novos investidores em claro esquema de pirâmide financeira, os denunciados acima nominados, visando a obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo de centenas de vítimas induzidas a erro em virtude do meio fraudulento acima descrito, obtiveram para si proveito financeiro de milhões de reais, sacando parte dos respectivos valores imediatamente, sem sequer aplicá-los no mercado financeiro”, relatou.
“Os acusados não juntaram prova de que a RSI tivesse autorização para funcionar como instituição financeira; ao contrário, CLODOALDO e LUCAS admitiram, em seus interrogatórios, que desconheciam a necessidade dessa autorização. Comprovado, portanto, que a RSI operava como instituição financeira, realizando ao menos a atividade de ‘captação de recursos de terceiros’, sem autorização para tanto. Quanto à autoria, também penso que foi demonstrada a contento em relação aos 3 acusados”, concluiu.
“Presume-se, portanto, que não se tratou de uma captação, propriamente dita, mas da devolução de valores anteriormente remetidos para que fossem investidos. Ainda assim, tem-se um total captado de clientes de cerca de R$ 40,7 milhões (ou quase R$ 54 milhões, se utilizarmos todo o período da quebra de sigilo bancário)”, relatou Florentini.
Apesar de ter prometido a aplicação na Bolsa de Valores, a RSI não aplicava o dinheiro para garantir a rentabilidade prometida aos clientes. “Assim, com os elementos de que se dispõe, pode-se concluir que a RSI, apesar de ter captado cerca de R$ 40,7 milhões de seus clientes, somente aplicou no mercado de capitais em torno de R$ 2,73 milhões, não tendo feito qualquer outro tipo de investimento em qualquer outro mercado, o que significa que apenas 6,7% dos recursos arrecadados foram efetivamente empregados em algum tipo de produto financeiro que pudesse gerar renda”, frisou o magistrado.
“Essa constatação, por si só, já indicia que a promessa de rendimentos em torno de 10% a.m. para os investidores era um ardil, uma enganação, pois o percentual irrisório efetivamente investido jamais poderia gerar rendimentos que remunerassem os investidores, pagasse as despesas comerciais e administrativas, incluindo a comissão dos corretores, e ainda produzisse um excedente a ser distribuído para os administradores a título de lucros ou pro labore”, relatou.
“Dessa forma, como dito, considerando que apenas um percentual irrisório dos valores captados foi aplicado no mercado financeiro, o qual jamais seria capaz de gerar ganhos que cobrissem as despesas e os rendimentos prometidos, e que mesmo esse percentual não gerou qualquer lucro ou superávit, conclui-se que a promessa de rendimento feita aos investidores se constituiu num ardil, num engodo, urdido com a finalidade de que aportassem e continuassem aportando valores na RSI”, destacou.
Clodoaldo afirmou à Justiça que restituiu os investidores e se desfez de todo o patrimônio para reparar o golpe. “De outro lado, não há provas de que o grosso dos valores por ele recebidos tenha sido transferido para terceiros, o que poderia ter sido facilmente viabilizado pela juntado dos extratos bancários em que constassem tais transferências, ou eventualmente os recibos emitidos pelos investidores”, observou o juiz.
E pior ainda foi a conversa entre o empresário e Lucas, de que se desfaria do patrimônio para evitar bloqueio por causa do golpe. “Ademais, a análise do conteúdo dos terminais móveis de LUCAS e CLODOALDO revelou uma conversa entre ambos, travada em 02/07/2020, que mostra o contrário, ou seja, que CLODOALDO não teve e não tinha a intenção de ressarcir os clientes da RSI, após a ruína da empresa, e estava preocupado em esconder seu patrimônio”, pontuou o magistrado.
Esta é a primeira sentença contra acusados de dar golpe milionário desvendada pela Polícia Federal. A Operação Ouro de Ofir, que passou a tramitar na Justiça estadual, segue sem desfecho, apesar de ter feito 60 mil vítimas em todo o País.