O Superior Tribunal de Justiça anulou acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que manteve nas mãos do proprietário da Fazenda Shekinah terras no território indígena Arroio-Korá, em Paranhos, homologada em dezembro de 2009. A medida acolheu parecer do Ministério Público Federal, que defendeu a nulidade do processo em razão da ausência de citação da comunidade indígena como parte na ação.
Autor da manifestação, o subprocurador-geral da República Antônio Carlos Bigonha afirma que a omissão do Judiciário em ouvir os povos originários no processo viola não apenas a Constituição Federal, mas também a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho e o Código de Processo Civil.
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Bigonha esclarece que a citação da Funai (União e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas), conforme estabelece o Estatuto Indígena (Lei Federal 6.001/1973), não exclui a obrigatoriedade de escuta da comunidade. “A capacidade processual dos indígenas vem garantida diretamente pelo art. 232 da CF/88”, destaca.
O subprocurador-geral sustenta ainda que, no curso do processo, iniciado em 2001, a área em litígio foi oficialmente reconhecida como território indígena, o que encerra qualquer discussão sobre a posse do local.
O parecer cita que, ainda em 2006, o Ministério da Justiça expediu portaria que declarou a posse permanente dos indígenas Kaiowá e Ñandeva sobre a Terra Indígena Arroio-Korá, localizada no município de Paranhos . Em 21 de dezembro de 2009, foi publicado decreto presidencial que homologou a área de forma definitiva.
O MPF lembra que o processo de demarcação administrativa do território indígena foi questionado no Supremo Tribunal Federal (STF), por meio de mandado de segurança apresentado pelo mesmo autor da ação possessória.
Bigonha ressalta que, em novembro de 2021, após anos de tramitação, a Suprema Corte “reafirmou a plena eficácia do Decreto Presidencial de 21 de dezembro de 2009, declarando hígida a demarcação administrativa da Terra Indígena Arroio-Korá, no município de Paranhos (MS)”.
Nesse cenário, o subprocurador-geral avalia que “não há fundamento fático ou jurídico para conceder ao autor qualquer proteção possessória, tanto pela ilegitimidade do título de propriedade, nulo nos termos da Carta Constitucional, quanto pela ilegitimidade do domínio invocado na inicial, sendo-lhe assegurado, na via própria, apenas a indenização das benfeitorias”.
O STJ acolheu os argumentos do MPF pela nulidade do processo e determinou o retorno dos autos ao TRF3 para que a Corte de segundo grau reanalise o caso.
De acordo com a decisão, o Tribunal Regional deve considerar todos os questionamentos apresentados nos embargos de declaração – recurso que foi rejeitado pelo TRF3 – e reiterados pelo MPF no parecer ao STJ.
“Acaso as questões tivessem sido devidamente analisadas, o TRF3 poderia proferir entendimento diverso, já que, uma vez reconhecida a demarcação da terra indígena, os pleitos autorais não merecem prosperar”, afirmou o ministro Francisco Falcão, relator do processo.