O Ministério Público Federal cobra que as prefeituras de Dourados e Itaporã paguem R$ 5,7 milhões em multas por descumprimento de sentença que determinou, em 2014, a revitalização das vias internas nas comunidades indígenas Jaguapiru e Bororó. A Justiça Federal negou os pedidos, mas o MPF recorreu em ação para cumprimento provisório de sentença apresentada em março deste ano.
A ação inicial pela obrigatoriedade de os municípios realizarem as obras teve como resultado sentença condenatória de dezembro de 2014. A decisão fixou multa diária no valor de R$ 50 mil por dia de descumprimento, sem prejuízo do envio de ofício ao Tribunal de Contas da União (TCU) para a apuração da responsabilidade.
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A partir de então, o MPF realizou uma série de reuniões com autoridades de Dourados e Itaporã para o início do cumprimento da determinação judicial. Porém, mesmo diante dos esforços para garantir o cumprimento da sentença amigavelmente, foi verificado que os envolvidos deixaram de realizar a obrigação de fazer quanto ao cascalhamento das vias perpetuando o “pesadelo enfrentado pelos indígenas residentes naquela localidade até os dias de hoje”.
Em março de 2023, o MPF entrou com pedido de cumprimento provisório de sentença para que os municípios fossem intimados a iniciarem as obras em até 15 dias, além de realizarem o pagamento das multas. A revitalização prevê obras de cascalhamento, limpeza e construção de caixas de retenção e valetas para o escoamento da água das chuvas. A 1ª Vara Federal de Dourados, no entanto, negou a intimação e o pagamento das multas.
A multa pelo descumprimento corresponde a cerca de R$ 2,9 milhões contra a Prefeitura de Dourados e a R$ 2,8 milhões contra a de Itaporã pelo descumprimento da decisão liminar proferida em 2014, após ação civil pública proposta pelo MPF.
Para o MPF, a omissão dos municípios em cumprir a sentença determinada pela Justiça Federal há quase dez anos aponta tratamento discriminatório com os indígenas, em condições de igualdade com os serviços prestados para as demais comunidades rurais da região.
O Ministério Público Federal demonstrou que houve repasses da União para as obras destinadas a beneficiar toda a comunidade rural, inclusive a indígena, que também se dedica à produção agrícola. O município efetivamente realizou as obras em toda região rural, deixando a comunidade indígena de lado, o que torna patente “a discriminação indevida na destinação dos recursos”.
Na ação em que pede o cumprimento da sentença, o procurador da República Marco Antônio Delfino de Almeida aponta que há, ao menos, duas fontes de custeio que podem ser usadas pelos municípios recolhidas em razão da presença indígena nos municípios. São elas as verbas do Fundo de Desenvolvimento do Sistema Rodoviário de Mato Grosso do Sul (Fundersul) e o ICMS Ecológico, que incentiva a adoção de práticas ambientalmente adequadas pelos municípios.
Segundo o MPF, basta providências dos gestores para o uso das verbas. Por isso, a não realização de melhorias torna evidente que “não é a falta de recursos o empecilho, mas sim a falta de gestão eficiente, deixando à própria sorte uma gama de direitos fundamentais assegurados constitucionalmente aos indígenas”.
Situação Urgente
O MPF destaca que a situação é considerada urgente, uma vez que o trânsito na região tornou-se impossível, comprometendo o tráfego de ambulâncias e de veículos da Polícia Militar e da Força Nacional. A condição fere diversos direitos fundamentais como o acesso integral à saúde, educação, segurança, liberdade de tráfego e acesso à Justiça.
Além disso, os alunos da aldeia não vão à escola em períodos de chuva, pois o transporte escolar fica impossibilitado de transitar pelas vias, já que não há cascalho nas estradas. Nesses mesmos períodos, os indígenas ficam sem assistência à saúde, pois os servidores do Ministério da Saúde também não conseguem acesso ao local.
Em junho de 2023, a Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise (Sppea/PGR) elaborou parecer técnico de toda a malha viária existente na comunidade com vistorias para avaliação das condições de conservação das vias públicas das comunidades indígenas Jaguapiru e Bororó, e de estradas públicas existentes em zona rural compreendidas dentro da área dos municípios de Dourados e Itaporã, constando em detalhes as obras necessárias nas vias.
De acordo com o relatório, a Prefeitura de Dourados realizou serviços de manutenção em 6,17 km de vias nas comunidades indígenas situadas dentro de seu território. Isso corresponde a 8,28% do total de 74,55 km de estradas sob sua jurisdição.
Já com relação ao Município de Itaporã, foram executados serviços de manutenção em vias que totalizam aproximadamente 1,48 km de extensão. Isso corresponde a apenas 1,87% do total de 79,07 km de estradas sob sua jurisdição.
Seguindo os critérios do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), verificou-se que o Índice de Condição de Manutenção de Rodovias Não Pavimentadas (ICMNP) para as estradas vistoriadas variou entre as classificações ruim e péssimo nas vias das comunidades indígenas, e entre regular e bom nas vias rurais não pavimentadas dos municípios de Dourados e Itaporã.
Nas vias que apresentaram piores classificações foram identificados problemas decorrentes de drenagem deficiente, que ocasionam degradação do pavimento.