O ex-presidente do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, desembargador Joenildo de Sousa Chaves, testemunhou uma ameaça feita pelo empresário Jamil Name Filho ao advogado Antônio Augusto de Souza Coelho durante um jantar na casa da família em Campo Grande. O caso foi revelado pela delegada Daniela Kades de Oliveira Garcia, primeira testemunha de acusação a depor no júri popular dos três acusados pela execução do estudante Matheus Coutinho Xavier.
O caso é um dos destaques do depoimento no período da manhã. A delegada depôs por quase quatro horas ao ser questionada pelos quatro promotores de Justiça e pelos advogados de acusação de Jamilzinho, do guarda municipal Marcelo Rios e do policial civil Vladenilson Daniel Olmedo.
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De acordo com Daniela, durante o jantar, houve discordância entre Jamil Name e Antônio Augusto sobre as negociações envolvendo a Fazenda Figueira, de 19,1 mil hectares em Jardim, e Invernadinha, em Campo Grande.
Estão no banco dos réus pela morte do rapaz: Jamil Name Filho, Marcelo Rios, ambos com 46 anos, e Vladenilson Daniel Olmedo, 63. Sobre o crime, a delegada foi a primeira a ser ouvida pelo júri e citou o caso do jantar na casa dos Name como indício da intimidação sofrida por Antônio Augusto, que havia comprado da família as duas fazendas.
A delegada lembrou que a família Name queria as fazendas novamente e chegou a fazer uma proposta de recompra, de valor elevado, mas o advogado negou, chegando a negociar as propriedades com uma terceira pessoa. As atitudes de Antônio Augusto, de se negar a revender para a família as propriedades e negociar com outra pessoa, teriam desagradado os Name.
Ainda segundo o depoimento da delegada, o desembargador Joenildo tentou ajudar Antônio Augusto, e o buscou no hotel Deville para jantar com os Name, de quem o advogado tinha medo. À mesa do jantar, Antônio Augusto não concordou com os termos da família, levando Jamil Name Filho ao descontrole e a lhe fazer ameaças de morte.
Por recear o agravamento da situação, o desembargador escondeu o advogado atrás de uma pilastra e o levou de volta ao hotel. Ao retornar para São Paulo, onde mora, Antônio Augusto foi internado em decorrência de pico de pressão.
Para a defesa de Jamil Name Filho, a situação não prova que Antônio Augusto tivesse medo da família. Já a delegada reiterou que, de fato, o advogado não citou ter sido ameaçado, mas este seria o modus operandi da família também com outras pessoas, muitas delas, vítimas de extorsão. Ou seja, apesar da intimidação, não falam por medo de retaliação.
A delegada Daniela Kades foi a única a depor no júri, que interrompeu os trabalhos para o almoço. Ao ser questionada por promotores e advogados de defesa dos acusados, ela explicou a dinâmica do crime e como ocorreram as investigações que levaram à prisão dos três.
Os advogados de defesa tentaram desconstruir a tese da Força-Tarefa da Polícia Civil, de que Jamil Name contratou os pistoleiros por meio de Marcelo Rios e Vladenilson Olmedo para matar o capitão da Polícia Militar, Paulo Roberto Teixeira Xavier. Os pistoleiros, identificados como Juanil Miranda Lima e José Moreira Freires, o Zezinho, erraram o alvo e mataram o jovem de 20 anos, filho mais velho do policial, que manobrava a caminhonete S-10 no momento do crime.
A defesa de Rios focou no fato da polícia não ter encontrado nenhuma ligação do guarda municipal com o crime. Já os advogados de Vladenilson, no fato de também não haver prova cabal de que o policial participou da execução.
O advogado Nefi Cordeiro, ex-ministro do Superior Tribunal de Justiça, começou falando que estava surpreso com a participação de policiais e delegados como testemunhas de defesa.
Relembre o caso:
O crime brutal – sete tiros de fuzil calibre 762 no início da noite de 9 de abril de 2019 – chocou e causou comoção. O alvo da suposta milícia era o capitão da Polícia Militar, Paulo Roberto Teixeira Xavier, pai do jovem, que teria “traído” Jamil Name e o filho na negociação envolvendo a Fazenda Figueira, de 19,1 mil hectares em Jardim.
Cinco meses após o assassinato de Matheus, o Garras e o Gaeco deflagraram a Operação Omertà, que levou para a prisão Jamil Name e Jamil Name Filho, acusados de comandar um grupo de extermínio na Capital.
A quebra de sigilo dos dados telemáticos dos celulares levou a polícia a interceptar a enigmática e ameaçadora frase de Jamilzinho, em uma conversa com a ex-esposa, de que “promoveria a maior matança da história de Mato Grosso do Sul, de picolezeiro a governador”. Esta frase passou a estampar faixas de protesto, que pedem a condenação dos acusados, e está em praticamente todos os bairros de Campo Grande.