A Justiça Federal condenou um dos réus da Operação Grãos de Ouro por usar uma empresa de fachada e sonegar impostos. Em menos de três anos, a firma teve faturamento de R$ 201 milhões, mas não dispunha de qualquer tipo de estrutura organizacional e operacional, tampouco patrimônio, que justificasse este faturamento milionário.
Conforme denúncia do Ministério Público Federal, a empresa Grão D’Ouro Comércio de Cereais Ltda foi constituída em nome de “laranjas” e utilizada para sonegação fiscal em esquema de movimentação financeira canalizada estrategicamente nas contas bancárias de pessoa jurídica em nome de “laranjas” sem bens para garantir as dívidas.
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A Grão D’Ouro movimentou em sua conta bancária R$ 19,208 milhões de agosto a dezembro de 2012, R$ 97,879 milhões em 2013 e R$ 83,954 milhões em 2014, segundo a Declaração de Informações sobre Movimentação Financeira. Segundo o MPF, o principal beneficiário das transações era o corretor de commodities Siloé Rodrigues de Oliveira.
O Ministério Público aponta que a empresa tinha o único propósito de ser utilizada em operações comerciais entre produtores rurais e cerealistas e não pagar os tributos e contribuições sociais como IRPJ, CSLL, COFINS e PIS/PASEP.
Em sua defesa, Siloé sustenta que não possuía poder de decisão na Grão D’Ouro, porque apenas prestava serviços na condição de corretor de cereais e comercialização de produtos como soja e milho. Ele nega ter conseguido vantagens da suposta sonegação fiscal, além de afirmar que não havia provas para sua condenação.
O juiz Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini, da 5ª Vara Federal de Campo Grande, afirma que houve crime, tendo em vista a inscrição da firma na Dívida Ativa da União e que os então sócios da Grão D’Ouro, apesar do faturamento milionário, moravam em casas simples na periferia da cidade.
Além disso, a empresa não possuía galpões, armazéns, veículos ou qualquer estrutura desse tipo, nem numeroso quadro de funcionários, como se espera de um empreendimento cujo principal negócio é a comercialização de grão, leguminosas e produtos agropecuários.
O dinheiro recolhido pela Grão D’Ouro era transferido para a Safra Administração de Negócios S/S, cujos donos eram Siloé Rodrigues e seus filhos. Em juízo, um dos donos da primeira, Paulo Henrique Lopes Calves Reis, afirmou que esta somente fazia a intermediação de clientes para a corretora Safra.
“No entanto, não há nos autos qualquer documento comprobatório de tais negócios (contratos ou notas fiscais, por exemplo, o que seria absolutamente esperável diante da vultosa quantia supostamente faturada pela GRÃO D’OURO dessa atividade)”, informa o juiz.
Conforme o juiz Luiz Augusto, as provas apresentadas pelo MPF demonstram que muitas atividades cotidianas passavam por Siloé, inclusive o trato com os clientes, embora formalmente ele não fizesse parte do quadro da empresa. O que torna plausível a tese de que cabia ao corretor comandar a movimentação bancária da Grão D’Ouro.
“O substancial faturamento da GRÃO D’OURO aliado à vasta experiência de SILOÉ como corretor de comodities – afinal, em juízo afirmou que exerce tal atividade há mais de vinte anos – leva à expectativa de que os negócios não seriam tocados na informalidade, de modo que é crível que houvesse contratos e notas fiscais representativos das operações intermediadas pela GRÃO D’OURO, bem como algum tipo de controle sobre os clientes que por ela eram encaminhados à Safra”, relata o magistrado.
“Em verdadeira quebra dessa expectativa, não foi noticiada pela defesa do réu a existência de nenhuma documentação nesse sentido, do que se depreende que os negócios seriam conduzidos de maneira informal, o que, como explanado acima, é pouco crível no caso dos autos”, prossegue.
“Aliás, como dito anteriormente, mesmo a efetiva prestação de serviços na qualidade de corretor é questionável, uma vez que foram juntadas apenas quatro notas fiscais emitidas por sua empresa, a Safra Administração de Negócios, referentes aos meses de julho, outubro, novembro e dezembro de 2013”, diz o juiz.
Por fim, Luiz Augusto Iamassaki Fiorentini definiu que Siloé foi “especialmente beneficiado pelo esquema” e decidiu condená-lo pela sonegação fiscal.
A pena foi de três anos, sete meses e seis dias de reclusão em regime aberto e 127 (cento e vinte e sete) dias-multa, que foram convertidos em prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, e pagamento de multa de R$ 50 mil. Siloé Rodrigues ainda terá de pagar os impostos devidos, cujos valores não constam na sentença. Ainda cabe recurso.
Este processo também tinha como réu Juscinez dos Santos Reis, contador da Grão D’Ouro. Ele, porém, foi absolvido por falta de provas de que era beneficiado pelo esquema.
Tanto Juscinez quanto Siloé Rodrigues de Oliveira e o informante Paulo Henrique Lopes Calves Reis são réus em ações decorrentes da Operação Grãos de Ouro, deflagrada em agosto de 2018, pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado).
A operação prendeu 33 pessoas e descobriu um esquema de sonegação de tributos estaduais. Somente com uma empresa, conforme a denúncia, houve prejuízo de R$ 44,8 milhões aos cofres do governo.