Investidores ingressaram com ações na Justiça na esperança de recuperar a fortuna investida na construção do Shopping Cidade Morena, idealizado para ser construído no “coração” do comércio e um dos endereços mais caros de Campo Grande. Sem perspectiva de ter o dinheiro de volta, eles acusam a família Saad de ter aplicado um golpe em 2010, quando construiriam o centro comercial com 160 lojas, cinema e 1,3 mil vagas de estacionamento.
Idealizado para ser o 3º shopping da Capital, após o Campo Grande e o Norte Sul, o Cidade Morena começou a sair do papel com a aquisição e demolição dos imóveis pelos empresários Rubens e Fernando Saad na quadra formada pelas ruas 14 de Julho, Dom Aquino, Marechal Cândido Mariano Rondon e Calógeras em 2009 e 2010.
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Enquanto alardeava o projeto nos meios de comunicação, os empresários captavam investidores. Conforme uma das ações judiciais, Saad informava que iria captar 20% dos R$ 100 milhões previstos junto a investidores. Um dos investidores foi a Platina Agropecuária, de Sérgio Carlos de Godoy Hidalgo, que se dispôs a repassar R$ 2,8 milhões no negócio.
Com uma loja ao lado da Americanas, que integraria o novo empreendimento, a Passaletti Modas também investiu R$ 3 milhões no novo negócio. Um advogado, amigo da família Saad, raspou R$ 100 mil da poupança e vendeu um terreno em um residencial de luxo por R$ 278 mil, para entrar com R$ 395 mil no novo negócio. Ele contou que por uma “benção divina” não vendeu o apartamento para aplicar no negócio dos Saad.
Com a perspectiva de iniciar as obras em junho ou julho de 2011, a família Saad prometia inaugurar o Shopping Cidade Morena em dois anos – ou seja, até julho de 2013, antes do Bosque dos Ipês. O Norte Sul foi inaugurado em maio de 2011.
O patriarca e o herdeiro dos Saad prometiam taxa de retorno de 9% no primeiro ano de funcionamento do shopping. O rendimento chegaria a 15% no 5º ano, conforme a tabela apresentada aos investidores.
A obra acabou não saindo do papel. Passaram-se os anos, sempre uma nova justificativa. Inicialmente, um empresário de São Paulo desistiu da construção após ter problemas de saúde. Uma construtora de Curitiba acabou desistindo antes de fechar acordo. Outra desculpa foi que o dono de parte dos imóveis não pagou IPTU e obrigou a empresa dos Saad a contratar uma banca de advogados paulistas para se livrar da pendenga na Justiça.
A última desculpa para o fracasso do projeto foi a Revitalização da Rua 14 de Julho, inaugurada na gestão de Marquinhos Trad (PSD). A modernização da via do comércio acabou sepultando de vez o mega shopping na área central.
“Ocorre que, após o investimento despendido por esta REQUERENTE no suposto Shopping Center Cidade Morena, esta passou a peregrinar por um verdadeiro calvário desde então , pois foram se passando o tempo e nos anos seguintes nenhum a obra foi iniciada (lembre-se que a obra estava programada para começar em 2011), o que começou a levantar suspeitas do embuste perpetrado pela família SAAD aos cotistas”, afirmou a advogada Renata Gonçalves Pimentel, na ação da Platina Agropecuária.
“No caso dos autos é mais do que evidente a confusão patrimonial e o desvio de finalidade, diante da utilização de pessoas (físicas e jurídicas), como único e exclusivo propósito de lesar credores!”, sustentou, sobre as várias empresas criadas por Fernando Saad, sua irmã, Gioconda Saad Khouri, e Rubem Salim Saad.
“A procuração outorgada pelo s sócios ao se u pai, Sr. Rubens Salim Saad (doc. 14), não deixa dúvidas da atuação em conjunto das empresas, sobretudo porque é possível confirmar o mesmo endereço, mesmo sócios administradores e mesmo exercício de atividade das empresas Shopping Center Cidade Morena e SVV Empreendimentos e Participações, comprovando assim que fazem parte do mesmo grupo econômico”, argumentou.
O fracasso de outro empreendimento da família foi uma das desculpas para o desfalque milionário nos investidores. “Aliás, usaram também de desculpa para não iniciar a construção do ‘Shopping Center Cidade Morena’ o fato de serem intentas demanda judiciais contra o grupo SAAD em virtude do insucesso do Shopping 26 de agosto (doc. 18),ora pertencente somente a eles (família SAAD) , ou seja, a cada cobrança sobre o início do empreendimento, novos obstáculos foram criados”, ressaltou a advogada.
“A situação causa um sentimento de verdadeira repulsa aos acionistas, principalmente a REQUERENT E, na figura do seu representante legal, que viu o desejo e expectativa de ser ‘dono’ de um empreendi mento do patamar de um shopping center, ser pulverizado de forma tão vil, tão ardilosa, como foi perpetrada pelos representantes da família SAAD”, acusou.
Nas ações judiciais, os investidores já assumem o papel de vítimas de um golpe milionário. “Várias pessoas foram enganadas pela promessa de um bom investimento” e “tiveram seus investimentos embolsados pelos Saad”, argumentam.
“Após intensa reorganização societária no ano de 2012, mais de dez anos se passaram e, o que era para ser a construção de um negócio rentável, se tornou um verdadeiro pesadelo para os demais acionistas minoritários – dentre eles, o Autor Roberto. Apesar das muitas promessas e desculpas apresentadas pela Famı́lia Saad, fatoé que o novo negócio propagandeado para angariar investidores nunca viu a luz do dia”, argumentou uma outra vítima.
A Platina Agropecuária pediu a devolução de R$ 20,1 milhões negados pela 15ª Vara Cível de Campo Grande no ano passado. Em agosto de 2022, a 4ª Câmara Cível do TJMS manteve a sentença. O desembargador Vladimir Abreu da Silva acatou o pedido da defesa do Shopping Cidade Morena, feita pelo advogado Divoncir Schreiner Maran Júnior, de que o caso deve ser julgado por um juiz arbitral e não pelo Poder Judiciário.
A Passeletti pede o valor de R$ 3 milhões corrigido pelo IGP-M, do IBGE, o que representará algo em torno de R$ 8,3 milhões. Outras ações, como do Roberto Samed, tramitam em sigilo.
Uma parente dos Saad, Miriam Vânia Elias Saad, emprestou R$ 890 mil para a família e ingressou com ação na Justiça para cobrar o dinheiro. Não houve decisão nos três casos até o momento.
Em uma das ações, os investidores apresentam gravações para mostrar que os Saad transferiram todo o patrimônio para terceiros para evitar eventual bloqueio judicial dos bens. Eles teriam dito que os investidores vão ficar brigando, brigando e não acharão nada para recuperar a fortuna investida no Shopping Center Cidade Morena.
Este não é o primeiro empreendimento comercial dos Saad a causar prejuízo nos investidores. O Shopping 26 de Agosto foi o primeiro fracasso e causou a frustração em dezenas de lojistas. A família só não perdeu porque o prédio foi vendido por R$ 38,8 milhões para o Tribunal de Justiça, que o transformou na central do juizado de pequenas causas. Os lojistas ainda lutam na Justiça por indenização.
Em uma das poucas manifestações na Justiça, o advogado da empresa, Divoncir Schreiner Maran Júnior anexou a decisão da 4ª Câmara Cível do TJMS, que delegou a questão para uma câmara de arbitragem.
Apesar de não ter saído do papel ainda, o Shopping Cidade Morena, idealizado para a região das Moreninhas, é obra prometida pela Engenharia Costa Hirota, de São Paulo, e não tem relação com a família Saad.