Mário Pinheiro, de Paris
A especificidade e a similitude do ex-presidente e ex-chefe do Partido Comunista, Joseph Stalin (1878-1953), e o atual líder russo, Vladimir Putin, também “comunista” não são distantes, são quase iguais. O primeiro se dizia nacionalista e instaurou o totalitarismo logo depois da morte de seu predecessor em 1924.
A situação econômica era uma calamidade, mas Stalin encontrou um jeito de alimentar o povo russo ao matar de fome outro país: a Ucrânia. De 1932 a 1933, foram recolhidos e confiscados todos os utensílios agrícolas do país vizinho, os celeiros ficaram vazios. As famílias ucranianas não tinham nada pra lamber no prato vazio.
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Sem material pra trabalhar a terra, sem grãos para semear e com galpões esvaziados, o povo minguava, morria de inanição. O totalitarismo staliniano eliminou 6 milhões de ucranianos antes da chegada de outro chefe, Hitler. Mas Stalin, assim como Putin, negava a realidade, escondia os fatos, algemava a imprensa, perseguia os opositores.
A imprensa de Putin tem coleira de cachorro. Stalin dizia que era preciso alimentar o Exército Vermelho e que as acusações sobre a fome na Ucrânia era somente um ponto de vista, sem importância, mesmo sendo advertido pela segunda esposa humanista, Nadejda Alliloueva, nada mudou.
Ela tinha contatos no meio rural, conhecia o problema. Não bastou. Tempos depois Nadejda apareceu morta, a imprensa muselada afirmava que a mulher se suicidou. Hoje ainda, quem não trilha na cartilha da política de Putin acaba “suicidado”.
Impor silêncio para a imprensa em regimes totalitários e calar a boca da oposição é a maneira desumana de prosseguir com a máquina de Estado como um rolo compressor. Quando a realidade macabra ganhou a imprensa internacional e devido ao número catastrófico de morte de inocentes na Ucrânia, muitos rasgaram a carteira de adesão ao comunismo, foi o caso de Albert Camus, muito criticado e contestado por Jean Paul Sartre. É também a razão do livro “O homem revoltado”, de Camus.
A imprensa russa continua controlada pelo líder russo. No início da invasão russa chamada de “operação militar”, Putin afirmava que era preciso desmilitarizar o país vizinho e também desnazifica-lo. Tudo gira em torno da mentira de Estado para reafirmar a violência.
A televisão de Estado Pervy Kanal, no principal noticiário noturno, ao vivo, foi interrompida pela jornalista Marina Ovsyanikova com uma pancarte atrás da âncora escrito: “Pare a guerra. Não acreditem na propaganda. Eles mentem!”
Logicamente, Marina foi presa, depois colocada em prisão domiciliar. Devemos também levar em conta que a pressão exercida pela OTAN no desejo de cercar a Rússia, favoreceu a reação do dragão russo.
O Ocidente está fragilizado e tenta recolher os cacos, mas a guerra fria jamais acabou. A queda do muro de Berlim deu vida e voz a outros muros que alimentam a indiferença. Se Stalin inaugurou um tempo de exterminação, Putin renova a saudade da antiga União Soviética.
A ideologia bélica quando apresenta o resultado da influência chinesa, iraniana, americana ou europeia, estampa a frieza dos líderes que alimentam o ódio em nome de uma paz inexistente. Stalin, fingindo-se de amigo, invadiu a Ucrânia e roubou tudo sem dar um tiro. Putin, com toda tecnologia e as ogivas nucleares, “decidiu” destruir e tomar regiões estratégicas e industriais. O saldo é triste aos dois lados, mas a imprensa hoje mostra um pouco mais.