A felicidade por ter ganho o prêmio de R$ 27,4 milhões na Mega-Sena durou até a partilha entre os participantes de um bolão em Dourados, a 223 quilômetros da Capital. A disputa virou caso de polícia e a briga pelo dinheiro se arrasta há 10 meses na Justiça. O organizador dos jogos é acusado de ter apropriado da maior parte da fortuna e só ter repassado 30% do dinheiro aos ganhadores.
Bilheteiro da Lotérica Zebrinha, Mizael Ribeiro Quintas, 49 anos, era o organizador do bolão e foi responsável por sacar o dinheiro. Em áudio anexado ao processo, ele conta que o grupo ganhou R$ 27,9 milhões. Além do prêmio principal, eles teriam faturado também a quina e quadra.
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O primeiro a desconfiar foi um comerciante de 53 anos. Até receber o dinheiro do prêmio, ele acreditava que o bolão, feito há vários anos, era composto por 12 apostadores e teria direito a receber R$ 2,325 milhões. No entanto, para sua surpresa, Mizael repassou apenas R$ 690 mil (29% do total).
O organizador do leilão, após ser cobrado pelo WhatsApp e por conversas pessoais, alegou que eram 20 apostas e não 12. Também disse que o comerciante participava apenas com meia cota. Inconformado com o “golpe”, o comerciante ingressou com ações na Justiça na área criminal e cível.
Na criminal, ele acusou Mizael de ter dado golpe no grupo e pediu o sequestro de R$ 25,582 milhões – o valor do prêmio menos a cota do bilheteiro. Ou, apenas o bloqueio de R$ 1,635 milhão – valor da diferença da divisão do prêmio em 12 ganhadores.
O caso também foi registrado na Polícia Civil. O prêmio da Mega saiu no dia 13 de julho de 2022. O boletim de ocorrência foi feito no dia 1º de agosto.
O Ministério Público Estadual foi contra o sequestro. “Verdadeiramente, o que se percebe da narrativa da representação (pp. 01/11) é a existência de divergência, entre o representante e o representado, sobre a quantidade de pessoas que teriam participado do bolão informal, e sobre o valor correspondente à quota-parte de cada um daqueles participantes”, afirmou o promotor Fernando Jamusse.
No dia 5 de agosto do ano passado, o juiz Deyvis Ecco, da 2ª Vara Criminal de Dourados, negou o sequestro dos bens do acusado de dar o golpe nos ganhadores da Mega. “Perceba-se que não há indicativo do número de participantes, o que embora não gere presunção de veracidade da versão do requerido (de que são 20 cotas), também não confirma a versão do requerente (que são 12)”, ponderou o magistrado.
Ao tomar conhecimento da suspeita, outros três ganhadores procuraram a polícia para acusar o golpe. Um comerciante afirmou que esperava receber R$ 1,4 milhão. No entanto, Mizael lhe repassou R$ 680 mil. O bilheteiro contou que era responsável por 50% das cotas e acabou ficando com metade do prêmio.
Outro comerciante contou que também recebeu R$ 692 mil. A explicação dada pelo acusado de dar o golpe foi a mesma, de que não era 12 apostadores, como acreditou por vários anos, mas 20, como parece acreditar a Justiça.
O 4º dos 12 integrantes do bolão a acusar o golpe foi um aposentado. Ele contou que pediu reunião com todos os ganhadores, mas o pedido foi negado pelo organizador do bolão. Mizael também teria contado a mesma versão, de que eram 20 participantes e ele teria direito a metade.
O desembargador Ruy Celso Barbosa Florence, do Tribunal de Justiça, também negou o sequestro da fortuna da Mega-Sena em Dourados. Ele negou o pedido em 19 de agosto do ano passado. “Posto isto, é evidente que os fatos carecem de maior investigação e provas, pois nem mesmo há indícios mínimos para se concedera medida cautelar de sequestro”, alertou o desembargador.
O caso veio a tona a um mês do julgamento pela 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul. A turma vai analisar o pedido de sequestro da fortuna da Mega-Sena no dia 9 de maio deste ano.
O procurador de Justiça, Humberto Matos Brittes, manifestou-se pela improcedência do pedido. Ou seja, o MPE é contra o bloqueio da fortuna em poder de Mizael.
“Assim, o que se extrai da narrativa trazida pelo apelante é a existência de divergência acerca da quantidade de pessoas que teriam participado da aposta vencedora, cabendo ressaltar que foi feita de forma informal, e consequente valor da quota-parte de cada dos apostadores”, ressalvou.
“Necessário se faz, portanto, produção mais apurada de provas, a fim de dirimir o litígio quanto ao número de apostadores e aos valores devidos a cada um, para, só então, ser possível averiguar eventual ocorrência de crime por parte do bilheteiro referido; razão pela qual não cabe ao caso em testilha o deferimento de medida assecuratória do sequestro de valores”, concluiu o procurador.
O julgamento contará com a presença de Ruy Celso (relator) e dos desembargadores Carlos Eduardo Contar e José Ale Ahmad Netto.