As últimas semanas têm sido marcadas por tragédias no ambiente escolar em Mato Grosso do Sul e no País. Violência, insegurança e cobranças colocam professores, diretores e educadores sob constante pressão. Como resultado disso, o maior número de afastamentos de servidores da área são relativos a transtornos mentais e psicológicos, chegando a ser motivo para metade do total de licenças.
O caso mais recente a nível nacional foi o assassinato brutal de quatro crianças, três meninos e uma menina entre 4 e 7 anos, dentro de uma creche na cidade de Blumenal (SC), em 5 de abril. Em MS, o caso de maior gravidade foi o de um aluno de 15 anos que entrou em uma escola com uma arma de fogo falsa e, após brigar com um colega, ameaçou o diretor de morte, em 23 de março.
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O diretor Jerônimo Marques, da Escola Estadual Teotônio Vilela, em Campo Grande, conseguiu tirar a arma do adolescente, pegou-o pelos braços e o levou até a sala da direção, onde as ameaças continuaram.
Dois dias antes, uma tragédia aconteceu fora dos muros de um estabelecimento de ensino. O professor de Artes Visuais Tiago Bianchi Silva Araújo, 42 anos, foi encontrado morto em seu apartamento. Ele lecionava na Escola Municipal Professora Eulália Neto Lessa, na Capital, e teve pedido de afastamento negado pelo IMPCG (Instituto Municipal de Previdência de Campo Grande).
Tiago fazia tratamento contra depressão, doença que o afastou da sala de aula nos últimos anos, e é uma das responsáveis por cerca de metade do total de licenças de profissionais da educação.
De acordo com a Secretaria Estadual de Educação (SED), no final do mês de março havia 343 professores afastados por motivos de saúde. Desse total, cerca de 50% dos afastamentos são por questões ligadas a doenças mentais e o restante a problemas físicos.
Em Campo Grande, a Secretaria Municipal de Educação (Semed) informa que o maior número de afastamentos de servidores são relativos a transtornos mentais e psicológicos e doenças “musculoesqueléticas”, que são distúrbios ou lesões que ocorrem nos músculos, nervos, articulações, cartilagens, discos da coluna vertebral, e outras partes do corpo.
Em março, a Capital tinha um total de 922 atestados protocolados, que correspondem a licenças com períodos que variam de um a 30 dias. Entretanto, não é possível afirmar que esse número corresponde ao total de professores de atestado, porque o mesmo docente pode ter pego mais de uma licença no período.
O Sindicato Campo-grandense dos Profissionais da Educação Pública (ACP) afirma que este número poderia ser maior. “Pedidos de afastamento e readaptação têm sido constantemente negados e isso precisa ser revisto urgentemente. Estamos perdendo amigos, colegas e outros estão em situação desumana”, desabafou Gilvano Bronzoni, presidente da entidade, durante protesto após a morte de Tiago.
“Agradeço por vocês estarem aqui e dividirem um pouco da minha dor, pois nada vai trazer meu irmão de volta. Meu irmão foi muito humilhado, cortaram até o salário dele por 15 dias. Ele ficou desesperado. Meu irmão estava doente e precisava de ajuda. Meu desejo é que isso não aconteça mais”, disse Maria Bianchi, irmã de Tiago.
Em nota, a Prefeitura de Campo Grande afirma que a equipe médica que atende os servidores municipais tem total liberdade profissional para definir o destino de cada paciente.
“Conforme a Lei n. 212.030/09 e o Código de Ética Médica, o Médico deve exercer suas funções com liberdade profissional, não podendo sofrer quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência de seu trabalho, sendo a mesma assegurada ao exercício da atividade de perícia oficial de natureza criminal e autonomia técnica, científica e funcional”, relata o município.
O secretário de Estado de Educação (SED), Helio Queiroz Daher, diz que o número de professores afastados caiu em relação ao ano passado.
“Se comparado o mesmo período do ano passado (final do mês de março), o total de profissionais afastados por motivos de saúde era 487 professores, enquanto neste ano são 343 profissionais. Esse dado pode sofrer variações nos próximos meses, mas o contexto observado de momento é de queda nos afastamentos desta natureza”, informa Helio.
O chefe da SED declara entender a necessidade de pensar e propor ações ao enfrentamento das situações de adoecimento, readaptação, absenteísmo e licenças médicas recorrentes. E que o Governo do Estado estabelece a política de saúde do servidor, trabalha com um conjunto de ações direcionadas aos servidores públicos, segurança no trabalho e bem estar.
“Parte dessas iniciativas, já realizadas, envolveram formações, oferta de cursos em parceria com outros órgãos, apresentação de serviços disponíveis para os servidores e ações locais com orientações aos servidores”, concluiu Helio Queiroz Daher.
O deputado estadual Pedro Kemp (PT), que é mestre em educação e graduado em psicologia, alerta sobre os professores estarem sobrecarregados no trabalho, o que contribui para o adoecimento da categoria.
“Além das atividades docentes, os profissionais precisam preencher fichas, relatórios, cadastros, planejamentos detalhados de aulas e avaliações. Não bastasse essa burocracia incompreensível, eles estão sendo fiscalizados pela coordenação. Eles estão sendo vigiados se estão ministrando aquilo que está no planejamento e até mesmo se estão de pé. O nível de cobrança está um absurdo. Isso acarreta diretamente na saúde mental”, afirma Kemp.
Em audiência na Câmara Municipal de Campo Grande nesta semana, o vereador e professor aposentado Valdir Gomes (PSD) disse que a violência causa medo nos docentes. Durante o debate, o parlamentar relatou o caso de uma professora que chamou a atenção de uma aluna e foi ameaçada de agressão pela mãe da jovem e, desde então, tem medo de voltar à sala de aula.
“O professor está acuado nas escolas, sem autonomia. Os diretores nos passam coisas de calamidade que estão passando junto com o professor. Os diretores e professores estão inseguros. Tem professor com medo de ir para a sala de aula. Pai falando que vai bater na professora. Não temos segurança de impedir que esse pai não entre na escola”, declarou Valdir.
ONDE BUSCAR AJUDA?
Procure a UBS (Unidade Básica de Saúde) ou o Caps (Centro de Atenção Psicossocial) mais próximo da sua residência.
Em caso de emergência, entre em contato com o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência) ligando para 192.
Converse com um voluntário do CVV (Centro de Valorização da Vida) ligando para 188 (chamada gratuita a partir de qualquer linha telefônica fixa ou de celular de todo o território nacional) ou acesse www.cvv.org.br.