Ao longo dos últimos oito anos, o oficial de Justiça Vinicius Siqueira, 46 anos, viveu uma montanha russa de emoções na política sul-mato-grossense. Tudo começou com o fracasso de um protesto, passando pelas multidões nas ruas contra a corrupção até ser eleito vereador de Campo Grande em 2016.
Agora, após duas derrotas, inclusive uma amarga ao obter apenas 3,2 mil votos e ficar em 62ª colocação na disputa de uma das oito vagas na Câmara dos Deputados, o ex-vereador cogita ceder à pressão da família e abandonar a política. “O desgaste pessoal é muito grande”, afirma.
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No entanto, Siqueira fica balançado ao ser abordado nas ruas pelos eleitores. “Muita gente está me pedindo para voltar”, conta, admitindo que pode ceder às pressões e voltar a disputar um cargo eletivo nas eleições de 2024. No entanto, ele deverá trocar de partido mais uma vez, após passar pelo DEM, PSL, União Brasil e Podemos.
Formado em Direito pela UCDB (Universidade Católica Dom Bosco) e em transações imobiliárias, Siqueira é oficial de Justiça desde 2004. Sem ser sindicalista nem líder de movimento, ele começou na política com a primeira manifestação pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff (PT) no dia 3 de fevereiro de 2015, na inauguração da Casa da Mulher Brasileira em Campo Grande.
Na ocasião, no alto de um carro de som, Vinicius comandou um ato pífio, que teve a participação de apenas 50 pessoas, segundo estimativa da PM na ocasião. O ato foi o percursor de outras manifestações contra a petista, que acabaram levando 100 mil pessoas no maior protesto da história da Capital.
Integrante do movimento Chega de Impostos, Vinicius se tornou uma das lideranças das manifestações de rua, que deram notoriedade a outros políticos, como a senadora Soraya Thronicke (União Brasil).
Ele criou um movimento nacional de juristas de direita para lutar contra a corrupção. Um dos ápices do movimento foi o pedido de liminar para impedir a posse do então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como ministro-chefe da Casa Civil de Dilma.
Escolhido pelo grupo para ser o candidato a vereador da Capital em 2016, Vinicius acabou sendo eleito com 3.386 votos. Na Câmara Municipal, ele propôs a CPI do Táxi, criada para combater a famosa máfia dos alvarás. No entanto, Vinicius acabou ajudando mais a população e acabando com a suposta máfia ao defender a implantação dos transportes de aplicativos na Capital. A chegada do Uber, 99, Indriver, entre outros, acabou democratizando e barateando o serviço.
No legislativo, as ofensivas contra a Flex Park e a Águas Guariroba levaram o vereador se destacar como principal oposicionista ao então prefeito Marquinhos Trad (PSD). Um dos pontos destacados foi a ação judicial para impedir a retomada da indústria da multa, com a ampliação dos radares e lombadas eletrônicas na cidade.
Siqueira também descobriu a delação premiada que revelou a fraude na licitação do transporte coletivo, vencida pelo Consórcio Guaicurus, formado pelas empresas da família Constantino e as mesmas que controlam o sistema há décadas em Campo Grande. Ele contou 20 irregularidades. Além das ações na Justiça, nada foi feito para acabar com o problema, um transtorno eterno para a população mais pobre, que precisa pagar caro para usar o transporte coletivo velho, precário e deficiente.
A atuação no legislativo custou caro para a tranquilidade do então vereador. Em entrevista ao O Jacaré, ele relembra de ameaças de morte veladas. As mensagens eram sutis ou direta. “Ouvi dizer que vão te matar”, “sabem onde o seu filho estuda”, entre outras frases cifradas, chegavam sempre ao parlamentar.
O estresse e a pressão tiveram efeito na balança. Em apenas um ano, Vinicius Siqueira engordou 55 quilos. A pressão arterial batia com frequência em 22, mesmo tomando remédio. Para solucionar o problema, ele se submeteu a uma cirurgia bariátrica e perdeu os 55 quilos em quatro meses.
A labuta diária ajudou o político a ficar com a casca grossa para aguentar as pressões. “Fui forjado na porrada para ter autocontrole”, afirma.
O trabalho como vereador e os holofotes das denúncias o credenciaram a disputar a prefeitura da Capital em 2020. Ele conseguiu unir os grupos divergentes no PSL – Soraya, o deputado estadual Capitão Contar e Loester Trutis. No último minuto, o ex-deputado federal lhe puxou o tapete e rompeu o acordo, lançando-se como candidato a prefeito.
“O Trutis fraudou a convenção”, acusou Vinicius. A Justiça Eleitoral acabou lhe dando razão e cassou a candidatura do deputado boquirroto. “Perdi duas semanas de campanha e o Trutis foi preso na última”, lamentou o ex-vereador, sobre o resultado da eleição. Ele obteve 34 mil votos e ficou em 4º lugar na disputa, atrás de Marquinhos, do procurador Sérgio Harfouche (Avante) e do deputado estadual Pedro Kemp (PT).
Vincius perdeu todo o capital político entre 2020 e 2022 após passar a bombardear Jair Bolsonaro (PL), o principal nome da direita sul-mato-grossense, nas redes sociais. “Não quis abraçar o Lula nem o Bolsonaro”, conta.
Com um cenário polarizado, ao não optar por gregos nem troianos, Vinicius acabou obtendo apenas 3.218 votos na disputa pela vaga de deputado federal, apesar de ter gasto R$ 503.450,78 na campanha. Cada voto custou R$ 156.
“O Bolsonaro nunca foi de direita, sempre foi um sindicalista militar. O Bolsonaro é um oportunista”, critica o ex-vereador, mantendo a linha combativa. Ele admite que votou no ex-presidente no segundo turno em 2018. Na última eleição, ao se ver diante de duas opções, anulou o voto no segundo turno.
“O Bolsonaro arrebentou com a ciência, vê a cultura como despesa, apesar de gerar empregos e corresponder a 1% do PIB”, avalia. Ele cita como exemplo a Disney nos Estados Unidos, que movimenta uma fortuna e atrai milhares de turistas todos os anos.
Apesar da frustração com a política, Vinicius Siqueira mantém a Associação Pátria Brasil, que é autora de várias ações contra corrupção no País. Ele estima que o montante cobrado supera R$ 2 bilhões.
Com pós-graduação no combate à corrupção, ele também integra a Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e Lavagem de Dinheiro. “O Bolsonaro não implementou nenhuma medida de combate à corrupção”, lamenta.
Enquanto pensa sobre se continua ou desiste da política, Vinicius se define como um liberal e um político de centro-direita.