O Tribunal Superior Eleitoral concluiu que houve fraude na cota de mulheres e anulou todos os votos recebidos pelos candidatos do Republicanos nas eleições de 2020 em Ladário. Com a decisão, dois vereadores da sigla – Denilson Márcio da Silva e Rosirlei Araújo de Oliveira, a Rosy Araújo – perdem os mandatos na Câmara Municipal e a Justiça Eleitoral vai refazer o cálculo do quociente eleitoral.
O Ministério Público Eleitoral ingressou com Ação de Impugnação de Mandato Eletivo por fraude na destinação de 30% das vagas para as mulheres. Alertado pela Justiça Eleitoral de que não tinha preenchido a cota, Denilson Márcio colocou a mulher, Rita Cibele de Souza Silva (Republicanos) para se adequar à legislação.
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No entanto, Rita não foi candidata a vereadora, conforme a investigação do MPE. Ela teve apenas um voto, não fez campanha nem teria gasto um tostão. Além disso, conforme a investigação, ela pedia votos para o marido.
O juízo de primeira instância acatou o pedido do MPE, anulou os votos de todos os candidatos do Republicanos em Ladário e cassou o mandato dos dois vereadores eleitos. Rosy Araújo teve 264 votos e ficou em 5º na disputa ocorrida em novembro de 2020. Denilson ficou em 7º com 175 votos.
O Tribunal Regional Eleitoral acatou o pedido da defesa dos réus e da sigla. “No caso, o recebimento de apenas um voto pela recorrente RITA CIBELE, ou a ausência de campanha eleitoral em perfil da rede social Facebook, não enseja a presunção de que a sua candidatura foi fictícia, mesmo considerando o parentesco com outro candidato”, concluiu a corte no acórdão.
“Não se pode negar que estão presentes alguns dos indícios relevantes apontados na jurisprudência, mas no presente contexto as provas produzidas se mostraram insuficientes à procedência da AIME, especialmente diante das graves consequências que decorrem dessa decisão, não só para os envolvidos mas também para todos os candidatos do Partido Republicanos, não podendo a Justiça Eleitoral anular os votos válidos de todo um partido político com base em meras presunções”, concluíram os magistrados da segunda instância.
Somente o juiz Wagner Mansur Saad votou para manter a decisão da Justiça Eleitoral em Ladário. “Se alguém, como neste caso específico, que teve um voto, que teve sua candidatura incluída pelo presidente do partido, que é seu esposo, que foi candidato ao mesmo cargo, que admitiu que fez campanha ao esposo, se isto não é usar a figura da mulher como burla a atender o disposto na lei, não consigo outro adjetivo”, justificou-se Saad.
O Ministério Público recorreu e o pedido foi considerado procedente pelo ministro Raul Araújo, do TSE, em despacho publicado na última quarta-feira (23). “Esta Corte Superior, nas reiteradas ocasiões em que examinou as causas nas quais se debate a prática de fraude na cota de gênero, tem concluído pela sua caracterização diante da presença dos seguintes elementos fáticos na moldura fática do acórdão recorrido: (a) votação zerada ou pífia da candidata; (b) ausência de movimentação financeira; (c) ausência de atos efetivos de campanha, desde que não se trate de desistência de concorrer ao pleito”, pontuou Araújo.
“Ainda, cabe destacar que, ao contrário do entendimento do Tribunal a quo, segundo o qual o elemento subjetivo seria necessário à demonstração da fraude, esta Corte Superior tem encampado a compreensão de que o conluio entre as candidatas laranja e o partido político não está entre os requisitos necessários à configuração do referido ilícito”, afirmou.
“Dito isso, é possível extrair das premissas fáticas do acórdão regional as seguintes informações: a candidata supostamente fictícia teve votação insignificante (um voto); não realizou movimentação financeira de campanha e deixou de praticar atos de campanha a seu favor, tendo, ainda, promovido campanha em benefício de outro candidato ao mesmo cargo, sendo este seu esposo. Tais elementos, por si sós, seriam suficientes para confirmar a fraude na cota de gênero. Contudo, não bastasse isso, ainda se evidenciou que a referida candidata, esposa do presidente do REPUBLICANOS, foi tardiamente registrada”, destacou o ministro do TSE.
“Diante desse cenário, destaca-se que este Tribunal Superior tem assentado que, caracterizada a fraude na cota de gênero em AIME, a consequência jurídica é: (a) a nulidade dos votos recebidos pelo partido político; (b) cassação do Demonstrativo de Regularidade de Atos Partidários (DRAP), com a recontagem do cálculo dos quocientes eleitoral e partidários (art. 222 do CE); e (c) a cassação do diploma dos candidatos vinculados à legenda e do mandato dos que foram eleitos”, ponderou.
“Ante o exposto, dá-se provimento ao recurso especial, com base no art. 36, § 7º, do Regimento Interno do Tribunal Superior Eleitoral, para: (a) declarar a nulidade dos votos recebidos por todos os candidatos ao cargo de vereador pelo REPUBLICANOS de Ladário/MS nas Eleições 2020; (b) desconstituir o diploma dos candidatos que concorreram por esta grei e cassar o mandato de Denilson Márcio da Silva e de Rosirlei Araújo de Oliveira, eleitos para o referido cargo naquele pleito; (c) cassar o DRAP da legenda, determinando-se o recálculo dos quocientes eleitoral e partidário”, determinou Raul Raújo.
Com a decisão, Ladário vai ter dois novos vereadores.
A questão da cota é polêmica, principalmente, pela audácia dos partidos em enganar a Justiça Eleitoral e deixar no papel a lei criada com a finalidade de aumentar a participação feminina na política brasileira.
Em Campo Grande, o vereador Dr. Sandro Trindade Benites (Patri) teve o mandato cassado por ter usado dinheiro destinado para a candidatura feminina. O vereador bolsonarista usou R$ 5 mil do Fundo Especial de Campanha da candidata Sônia Maria Correia dos Santos, a Soninha da Saúde. Ele foi cassado em primeira instância, mas ganhou, pelo placar de 4 a 3, no TRE.