A Justiça anulou as “mutretas” que transformaram o cargo de técnico de nível médio em procurador jurídico da Câmara Municipal de Campo Grande de André Luiz Scaff. Funcionário influente e poderoso no legislativo municipal, o “vereador sem voto” foi promovido sem concurso público 10 dias após ser nomeado. Conforme o Portal da Transparência, graças as ilegalidades, ele tem salário de R$ 66 mil, três vezes maior que o pago a um vereador.
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A contratação de Scaff sem concurso público foi anulada em sentença do juiz Ariovaldo Nantes Corrêa, da 1ª Vara de Direitos Difusos, Coletivos e Individuais Homogêneos, publicada na última quinta-feira (2). A anulação foi pedida em ação civil pública protocolada em 2018 pelo promotor Adriano Lobo Viana de Resende.
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Conforme o Ministério Público Estadual, André Luiz Scaff foi aprovada em concurso público para o cargo de nível médio e a nomeação ocorreu em 4 de outubro de 1991. Dez depois, em decreto considerado ilegal, ele teve o cargo transformado em assessor legislativo de nível superior, que exigia a formação em Direito. Em novos decretos, publicados em 1995 e 2003, ele acabou sendo elevado a condição de procurador jurídico do legislativo municipal.
“Destarte, em razão dos argumentos expostos, julgo procedentes os pedidos formulados na inicial em relação aos requeridos Câmara Municipal de Campo Grande e André Luiz Scaff para declarar, por violação ao artigo 37, II, da Constituição Federal, a nulidade dos atos administrativos que transformaram o cargo de nível médio dele de ‘Agente Legislativo’ para ‘Técnico de Nível Superior’ e depois para ‘Assessor Técnico Jurídico’ até o de ‘Procurador Municipal’”, determinou Corrêa.
Conforme o magistrado, “restou incontroverso que ele foi aprovado originariamente em concurso público para o cargo de nível médio de ‘Agente Legislativo’ e ascendeu ao de ‘Técnico de Nível Superior’ por meio do Decreto nº 1.673/1991 e posteriormente foi transposto ao cargo de ‘Assessor Técnico Jurídico’ mediante o Decreto nº 2.615/1995, sendo que, por fim, alcançou o cargo de ‘Procurador Municipal’ pelo Decreto nº4.477/2003, o que também tem amparo nos documentos e trechos de fls.472-3 e 507-8”, destacou.
“Assim, não há outra conclusão senão a constatação de irregularidade na ascensão do cargo de nível médio do requerido André Luiz Scaff de ‘Agente Legislativo’ para o de nível superior de ‘Assessor Técnico Jurídico’ por evidente configuração de provimento derivado violador do princípio do concurso público previsto no artigo 37, II, da Constituição Federal”, concluiu.
“Desse modo, o requerido André Luiz Scaff deverá retornar ao cargo para o qual originariamente aprovado (‘Agente Legislativo’)”, determinou. Agora, o poderoso assessor do legislativo deverá recorrer contra a sentença no Tribunal de Justiça. A Câmara já sinalizou que lutará pela manutenção da ilegalidade.
O caso é um escândalo, porque os demais campo-grandenses são obrigados a seguir a Constituição e a lei, ou seja, só poderão ter um emprego dos sonhos, com estabilidade e ótimo salário, mediante concurso público. Sem falar que a maioria não nunca consegue chegar ao salário de R$ 66 mil por mês pago a Scaff.
Sobre a alegada segurança jurídico, o magistrado pontuou que a manutenção da promoção de Scaff sem concurso vai transformar a Constituição brasileira em merca carta de intenção, que ninguém respeita nem segue. “Quanto à invocação do princípio da segurança jurídica, em que pese também ser um direito constitucionalmente garantido, em uma ponderação de valores entre a flagrante inconstitucionalidade da ascensão do requerido André Luiz Scaff ao cargo de ‘Procurador Municipal’ e o decurso do tempo entre a instauração da situação ora combatida e o ajuizamento desta ação, evidente que a primeira deve prosperar, sob pena de relegar a Constituição Federal e todo o ingresso no serviço público a uma mera carta de intenção”, destacou Ariovaldo Nantes Corrêa.
Nem vereador, que é eleito, ganha um terço deste valor. O atual presidente da Câmara, Carlos Augusto Borges, o Carlão (PSB), ganha R$ 18.991,69 por mês, de acordo com o Portal da Transparência.
O juiz julgou improcedente o pedido do MPE em relação aos demais procuradores jurídicos da Câmara: Gina Ferreira Dias da Costa, Idimé Moura de Castro, Eliana Silvana Verlangieri Loschi, Elias Frainha e Aral de Jesus Cardoso.
“Em relação aos requeridos Aral de Jesus Cardoso, Gina Ferreira Dias da Costa, Idimé Moura de Castro, Eliana Silvana Verlangieri Loschi e Elias Fraiha, é incontroverso que foram aprovados em concurso público para o cargo de ‘Assessor Técnico das Comissões’, regulado pela Lei Municipal nº 2.053/1982, que exigia inscrição na Ordem dos Advogados do Brasil por mais de 5 anos, experiência em curso específico para os candidatos e experiência profissional mínima de 2 anos de serviço público”, destacou.
Scaff e a Câmara Municipal alegaram que as irregularidades prescreveram porque a ação foi protocolada mais de 10 anos após a contratação sem concurso do vereador sem voto.