O Brasil não passará ileso à efetivação de uma guerra na Ucrânia, o mais recente alvo da estratégia geopolítica norte-americana para demonstrar poder junto aos mercados mundiais e a Rússia. Diretamente, o país será atingido pela avalanche do desequilíbrio econômico provocado pelo conflito na Europa e vai assistir ao aumento das taxas de desemprego, da inflação e dos juros. Em contrapartida, haverá redução do acesso ao crédito e das exportações.
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Seria esse o pior cenário, concretizado pelo choque dos mercados mundiais, que há uma semana mantinham a possibilidade do conflito em 50%, mas o aumentaram para 75% na quinta-feira, dia 10, quando a Rússia iniciou exercícios militares na Bielorrussía, fronteira com a Ucrânia. A valorização da aposta foi divulgada no dia seguinte pela empresa de análise norte-americana BCA Research, quando o presidente dos EUA, Joe Biden afirmou que a invasão russa ao território ucraniano poderia acontecer “a qualquer momento”.
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A afirmação foi negada pelo governo russo em diversas ocasiões, sendo a última ainda na sexta-feira (11), pelo ministro da Defesa Sergey Shoigu, em reunião com o colega britânico Ben Wallace. Shoigu sublinhou a tensão desencadeada pela intervenção norte-americana e a Otan (organização integrada pelos EUA e outras 29 nações) na Ucrânia como ameaça à segurança russa. Já Wallace engrossou um extenso cordão diplomático integrado por representantes do governo inglês, de ministros alemães e franceses e, também, dos respectivos presidentes dessas duas nações.
Na última semana, Biden exigiu compromissos dos governos europeus à causa da Ucrânia e, apesar das promessas de lealdade, o que tem percebido é a movimentação para não haver conflito algum. Afinal, o produto imediato do primeiro mês de conflitos resultaria na queda de 10% das ações europeias já no primeiro mês e a elevação dos preços do petróleo e gás natural. Para o gestor de ativos da empresa germânica Meag, Jürgen Callies, a escala geopolítica da crise Rússia/Ucrânia seria um veneno para o mercado de capitais.
Callies publicou um artigo na revista alemã Wirtschaftswoche onde assenta o elevado risco da baixa prolongada dos ativos europeus, considerando o reposicionamento do bloco de altamente para pouco atrativo economicamente. Os países que integram o bloco europeu também serão diretamente afetados pela resposta das sanções prometidas à Rússia para minar os setores financeiros e energéticos, como enfatizou na sexta-feira a chefe da União Europeia Ursula von der Leyen.
Mesmo sem a declaração de uma guerra, a UE acumula a pressão sobre os preços do gás. Em entrevista coletiva, o chefe da AIE (Agência Internacional de Energia) Fatih Birol acusou a estatal russa Gazprom de reduzir em 25% o fornecimento de gás para a Europa, forçada a operar criticamente com 50% de armazenamento em janeiro, quando o normal seria 70%.
Menos presente na mídia europeia estão os efeitos sobre as commodities, com ameaça de aumento dos preços de pães e massas. Nas prateleiras dos supermercados portugueses, por exemplo, o pacote de espaguete básico valorizou 25%, passando de 0,60 cêntimos de euro para 0,75.
Hoje, conforme o IGC (Conselho Internacional de Grãos), Rússia e Ucrânia exportam cerca de 60 milhões de toneladas de trigo, montante equivalente a 30% do comércio global do grão. Para a safra 2021-2022, a estimativa é de que os dois países ocupem o segundo e o terceiro lugar na produção do trigo, ficando à frente de Estados Unidos e Austrália. Em entrevista à mídia alemã, o especialista em commodities do banco Commerzbank, Carsten Fritsch, alerta não haver possibilidade de responder à demanda mundial pelo grão sem a participação de Rússia e Ucrânia.
Esses e outros sintomas da guerra serão bem distribuídos. Quando aperta o cerco sobre a Rússia, a Otan, sob o comando de Washington, enfatiza a necessidade de sanções semelhantes às impostas ao Irã e à Coreia do Norte. Ou seja, os EUA prometem punir quem fizer negócios com Moscou e, em caso concreto para o Brasil, minar a ampliação do comércio bilateral do país com a Rússia, cujo acordo começou a ser costurado em julho do ano passado.
O Brasil fica, ainda, refém do mercado porque, apesar de cultivar uma boa relação com os países integrantes da Otan, quando a guerra chegar (se chegar) a reação será uma cadeia. Também não é conhecida ainda a posição da China, parceira comercial do Brasil e que, sobre o conflito na Ucrânia, limitou-se a publicar nos órgãos oficiais de imprensa fotos do exercício militar russo com o destaque de que foram acordados em novembro com a Bielorússia.
Brasil e mundo assistem os movimentos dos governos da Europa e EUA, de mãos dadas e atadas. Será uma espera tensa, afinal, a próxima reunião do FED (Federal Reserve) está marcada para março e a promessa é de aumento das taxas de juros para os norte-americanos.
Até lá, os EUA precisam de um conflito para explicar ao próprio povo que o colapso financeiro é culpa da Rússia.