Com quase uma hora e meia de duração, o documentário “Odilon – Réu de si mesmo” (HBO Max) traz um protagonista sem pecados. Lançada em ano eleitoral, a produção serve mais ao candidato, que deve disputar o cargo de senador pelo PSD, do que ao juiz aposentado.
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Depois de servir de inspiração para o filme “Em Nome da Lei”, onde o papel de um magistrado fictício coube ao galã global Mateus Solano, agora vemos Odilon de Oliveira em sua própria pele. Ele se enxerga como um homem marcado para morrer, temeroso de ser alvo de vingança pela condenação de narcotraficantes e profundamente magoado por ter perdido a escolta da PF (Polícia Federal). Foram quase 20 anos com direitos a policiais no seu entorno, 24 horas por dia.
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O take inicial é com a equipe de filmagem chegando à casa do magistrado em Campo Grande e sendo submetida à fiscalização pela escolta. Armados até os dentes, com armas de grosso calibre na mão, distintivo da PF no peito, os policiais tiveram os rostos borrados, mas marcam presença em grande parte do filme.
Um dos agentes conta conhecer Odilon há muito tempo, que se surpreendeu com a coragem do magistrado e que teme pela vida do juiz aposentado. No mais, são figurantes de luxo, como na passagem em que Odilon, trajando chapéu de cangaceiro, camiseta e bermuda, se esparrama num sofá, com dois agentes perfilados ao fundo.
Sabidamente, um dos policiais atuantes na escolta do juiz durante a campanha eleitoral foi Everaldo Monteiro de Assis, preso desde 2019 na operação Omertà, que mirou Jamil Name e Fahd Jamil, esse último conhecido como o “Rei da Fronteira”. A questão da escolta ganha força na reta final do documentário, com um Odilon literalmente em prisão domiciliar.
Ele já não pode ir à academia, correr na avenida ou comprar pão no mercado. O timing é propício: a Justiça Federal de Campo Grande deve julgar em breve se o juiz aposentado poderá reaver a proteção por 24 horas.
O documentário traz depoimentos como de Sergio Moro, então ministro da Justiça e, agora, mais um juiz candidato; de Marcelo Freixo, deputado federal pelo Rio de Janeiro e que também vive sob escolta; e do jornalista Edivaldo Bitencourt, editor de O Jacaré e que explica a dinâmica do tráfico nesta empobrecida fronteira.
A filmagem adentra pela rotina do protagonista, incluindo bastidores da campanha eleitoral para governador em 2018, os diligentes cuidados capilares (usa escova para manter as sobrancelhas alinhadas), a história de amor com Maria Divina, o respeito dos filhos e o derretimento pelo neto.
Pinceladas de sua biografia revelam um homem que se fez pela educação. Nascido em 26 de fevereiro de 1949, na cidade de Exu, Pernambuco, ele teve uma infância pobre e viu o destino mudar com a educação. Os estudos, concluídos tardiamente, o levaram ao cargo de magistrado. A remuneração profissional permitiu que desse uma vida melhor aos pais, pessoas simples,que na palavra do próprio Odilon, não entendiam direito o que fazia um juiz.
Sobre a vida profissional, o juiz conta da atuação na fronteira de Ponta Porã com o Paraguai, dominada pelo narcotráfico; dos muitos planos de execução e das diversas reportagens nacionais que protagonizou. Foram 114 traficantes condenados, lista que tem Fernandinho Beira-Mar e Jorge Rafaat; 400 propriedades confiscadas, 150 aviões e helicópteros apreendidos , além de 890 carros e motos. Somadas, as condenações totalizam mais de 920 anos.
A equipe foi à 3ª Vara Federal de Campo Grande, de onde Odilon se despediu em 2017, quando se aposentou. A rotina de usar colete a prova de bala, comer marmitex na mesa do gabinete e o prazer de sentenciar foram exibidas. Mas não há menção ao episódio Jedeao Oliveira. Funcionário de confiança do juiz por 21 anos, ele abriu a artilharia contra Odilon em 2018, com denúncias de gravações clandestinas a sumiço de dólares. Jedeão foi condenado a 41 anos de prisão por desvio de dinheiro e, desde então, sumiu de cena.